Centenas de pessoas desesperadas juntam-se no porto de Pemba
29 de março de 2021Centenas de famílias desesperadas juntam-se no porto de Pemba, capital de Cabo Delgado, para receber as pessoas que fogem dos ataques terroristas na vila de Palma, a 422 quilómetros ao norte na província. Aguardam pela chegada dos navios que transportam os seus familiares e amigos que também estão a fugir da violência.
O drama é contado por quem o viveu e sabe o que é fugir do terror, como relata à DW África um dos deslocados, identificado por Alberto.
"Fugi de carro até Quionga, onde consegui um barco que me levou até Afungi. E de lá apanhei a boleia para chegar a Pemba. Em Palma morreram muitas pessoas, nacionais e estrangeiros. O meu cunhado morreu num carro, emboscado pelos terroristas. Levou uma bala na cabeça", conta Alberto, que viu a vila severamente destruída. "Palma está 'maningue' [muito destruída] e até agora estão a disparar."
Enquanto o processo de desembarque dos resgatados decorria no interior do porto de Pemba - onde a presença da imprensa era vedada - do lado de fora, dezenas de populares aguardavam inquietos e desesperados a chegada dos seus parentes. Umas dessas pessoas era Merina Simão, que não tem notícias do seu esposo há quatro dias.
"Estou aqui à espera do meu marido. Ele foi a Palma no dia 03 de março em missão de serviço e, no dia 24 de março, coincidiu com esses ataques. Desde esse dia até hoje não estou a conseguir falar com ele. Estou muito triste", relata.
A espera pelos que fogem da morte em Palma
Eram dezenas de pessoas à espera no porto de Pemba às primeiras horas da manhã, mas rapidamente o número cresceu até centenas que aguardam por ver familiares e amigos. Navios com alguns milhares de pessoas têm também estado a chegar à capital provincial: depois de 1.300 - sobretudo trabalhadores ligados aos projetos de gás - terem chegado no domingo, um outro navio atracou esta segunda-feira (29.03) no porto, de onde têm estado a sair deslocados a conta gotas.
Não há números oficiais sobre a quantidade de pessoas nesses barcos, mas estima-se que possam superar as mil. Entre os familiares que aguardam a chegada dos parentes em Pemba, há quem peça mais inclusão e transparência sobre o processo de resgate.
"Eu me pergunto o seguinte: só estão a chegar funcionários, mas não estamos a ver as famílias a chegar, e nós estamos desesperados. Estamos aqui desde manhã e, no primeiro navio, vieram só funcionários", diz um dos familiares.
Todos os deslocados são escrutinados por forma a despistar possíveis insurgentes misturados com a população. Este é um dos receios relatados desde a primeira hora pelas autoridades que têm insistido nos apelos à vigilância por parte da população.
Situação tensa em Palma
A vila sede de distrito que acolhe os projetos de gás do norte de Moçambique foi atacada na quarta-feira (24.03) por grupos insurgentes que há três anos e meio aterrorizam a região, e o movimento terrorista "Estado Islâmico" reivindicouesta segunda-feira (29.03) o controlo de Palma.
Dezenas de civis, incluindo sete pessoas que tentavam fugir do principal hotel de Palma, foram mortos pelo grupo armado que atacou a vila na quarta-feira, disse hoje o Ministério da Defesa moçambicano.
Numa operação de resgate de expatriados de um hotel em Palma, na sexta-feira, um cidadão português ficou gravemente ferido e foi transferido para Joanesburgo, na vizinha África do Sul, disse à Lusa fonte do Governo no domingo.
A violência está a provocar uma crise humanitária com quase 700 mil deslocados e mais de duas mil mortes, segundo agência Lusa.