Cabo Delgado: Ataque em zona que tem escapado à violência
6 de junho de 2022Além de relatos de residentes locais, o Presidente moçambicano, Filipe Nyusi, também confirmou esta segunda-feira (06.06) o ataque à aldeia Nanduli, referindo que terá sido da autoria de rebeldes que atormentam a província.
"Ainda ontem atacaram a aldeia de Nanduli, no distrito de Ancuabe", disse Filipe Nyusi, assegurando, ainda assim, que a situação de segurança está controlada "não obstante os atos de terrorismo que ainda prevalecem".
O chefe de Estado moçambicano falava à margem de uma reunião virtual, a partir de Maputo, com o secretário do partido comunista do Vietname.
A população de Ancuabe "está em debandada" devido ao ataque, disse o Presidente, referindo que os insurgentes têm feito ataques "à procura de alimentos".
Três fontes locais distintas relataram à Lusa que o ataque a Nanduli aconteceu durante a tarde de domingo e que pelo menos um dos líderes comunitários foi abatido durante a investida. Várias casas (todas de construção tradicional) foram destruídas ou incendiadas.
Uma das residentes, em fuga, relatou que está desde domingo à tarde a tentar telefonar para a mãe, com quem residia, mas sem sucesso, acrescentando que há mais pessoas desaparecidas.
Polícia desconhecia o caso
Forças de Defesa e Segurança (FDS) foram avistadas na zona, mas a polícia dizia desconhecer até hoje de manhã a ocorrência de qualquer ataque.
A aldeia fica às portas do Parque Nacional das Quirimbas, junto à Estrada Nacional 380, a única via asfaltada que liga o norte e sul de Cabo Delgado. Nanduli fica cerca de 40 quilómetros a nordeste da vila sede de Ancuabe, já no limite com o distrito de Quissanga.
Outros distritos da zona centro e sul da província, como Macomia e Meluco, têm sofrido mais ataques à população desde o início do ano.
Estima-se que as ações sejam desencadeadas por rebeldes em fuga da ofensiva militar que está em curso desde julho de 2021, com apoio internacional, no extremo norte de Cabo Delgado (distritos de Palma, Mocímboa da Praia e Muidumbe), na zona dos projetos de gás.
Drama dos residentes
Abacar Ramadane é motorista do único autocarro de transporte de passageiros que chegou a Pemba na madrugada desta segunda-feira. Em entrevista exclusiva à DW, contou ter vivenciando no domingo um cenário nunca antes visto durante muitos anos que circula na rota Ancuabe – Pemba.
"Às 20h horas estava eu a chegar à vila sede de Ancuabe, quando encontrei uma multidão. Estavam lá viaturas a transportar a população e os seus bens. Naquele momento parei no mercado e as pessoas perguntaram se eu viria a Pemba, quando respondi que de facto viria naquela noite, subiram e encheram este carro", relatou Ramadane.
Sem muitos detalhes do que estava a acontecer naquela vila, o motorista preferiu agir com solidariedade, ajudando a transportar as pessoas que estavam desesperadas para deixar Ancuabe.
"Ao longo do percurso encontrei uma senhora carregada com uma criança no colo, outras duas que segurava nas mãos e trouxas. Eu parei e pedi ao meu cobrador para transportarmos aquela senhora. Mais em frente, [encontramos] outras senhoras [que fugiam de Ancuabe]", contou o motorista à DW.
Até ao momento, o clima continua tenso na capital provincial de Cabo Delgado, com vários residentes a tentarem contactar os seus familiares residentes no distrito de Ancuabe, mas sem sucesso.
Artigo atualizado às 20:07 (CET) de 6 de junho de 2022