Guiné-Bissau: 49 anos de independência em plena crise
24 de setembro de 2022Há quase uma convergência de opiniões em relação ao estado de retrocesso da Guiné-Bissau, 49 anos depois de ser declarada independente e soberana. O país ainda não se endireitou, por culpa de vários falhanços ao longo de quase cinco décadas da independência, como explica o professor universitário Paulo Vasco Salvador Correia.
"Nós falhámos com a saúde dos guineenses, falhámos com a educação, falhámos com a justiça, com a democracia e, sobretudo, pode-se dizer que nós falhámos com os ideais de Amílcar Cabral e dos Combatentes da Liberdade da Pátria", avalia o professor.
Na noite desta sexta-feira, o Presidente guineense Umaro Sissoco Embaló, que está fora do país, disse, em discurso à nação, que este é um momento de "reflexão" sobre os 49 anos do Estado da Guiné-Bissau, e afirmou que nos dois últimos anos o país recuperou a soberania e a credibilidade internacional.
"Na celebração de 24 de setembro tem de haver sempre um momento de reflexão. Convido a todos, o Governo, a sociedade civil, os partidos políticos e os quadros guineenses em geral, a fazerem este exercício de reflexão sobre os 49 anos do Estado guineense", disse.
"Enfrentar e começar a resolver os problemas e atrasos que o nosso país acumulou exigeu, primeiro, que fosse reabilitado o próprio Estado na sua soberania, a credibilidade internacional, na sua capacidade de falar e de ser ouvido. Enfim, na imagem que devia voltar a transmitir no seio da comunidade das nações e nesta perspetiva seguir a via de uma diplomacia realista e ambiciosa", acrescentou Sissoco Embaló.
Historial de instabilidade
A história recente da Guiné-Bissau foi marcada por crónicas instabilidades políticas e governativas, que nunca permitiram que um Governo completasse quatro anos de exercício. Só uma vez, em cerca de 30 anos da democracia multipartidária, um presidente da República completou cinco anos em funções.
À DW África, guineenses nas ruas de Bissau fazem um balanço negativo do percurso do país nos últimos anos: "O balanço que eu faço é negativo e isso tem mais haver com as condições em que a população guineense está a viver, principalmente pela falta da educação e saúde", disse uma funcionária pública.
A mesma opinião é partilhada por uma professora: "A Guiné-Bissau está sempre trás e esses governantes não estão a fazer nada e estão só a meter o país em lamaceira".
Uma comerciante afirmou que "não há nada especial em comparação com outros países". "Em relação à escola e à saúde, não vi nenhuma melhoria", criticou.
País tem potencial para prosperar
Apesar dos falhanços, o economista guineense Serifo Só defende que a Guiné-Bissau tem tudo para prosperar. "Temos de ter em conta de que a Guiné-Bissau é um dos países com melhor reserva da biosfera do mundo", recorda.
"A nossa biodiversidade é muito rica e a nossa produtividade tem condições para ser uma produção excessiva que pode sustentar não só a Guiné-Bissau, mas também a sub-região. E os nossos mares têm grandes capacidades de recursos haliêuticos, que são potenciais", pontua.
Nos últimos dois anos, a Guiné-Bissau registou ataques aos jornalistas e aos órgãos de comunicação social, bem como raptos e espancamentos de cidadãos comuns e de figuras públicas.
Para Paulo Vasco Salvador Correia, "é fundamental e necessário que a partir deste momento, tendo o dia da festa da independência como referência, que a governação se sente e se concentre na pacificação política e na procura de grandes consensos políticos e na estabilização social".
Crise social
Nos últimos anos, os setores considerados "chave" para o avanço da Guiné-Bissau, nomeadamente a justiça, educação e saúde são confrontados com graves crises que levaram a população a pôr em causa a sua credibilidade, numa altura em que os sindicatos e o Governo estão de costas voltadas.
Mas para Gueri Gomes, coordenador Nacional do Fórum das Organizações da Sociedade Civil da África Ocidental (FOSCAO), para o país avançar tem de haver um ponto de partida:
"Tem que haver uma vontade política forte, dos políticos e dos partidos políticos, em querer desenvolver o país e trabalhar para o bem-estar da população, traduzindo esta vontade na elaboração e implantação das políticas públicas a favor da população. Uma política pública que vai tomar em consideração o ensino de qualidade e que vai investir no setor educativo", conclui.