Homenagem à Casa dos Estudantes do Império
28 de outubro de 2014
Os antigos associados da Casa dos Estudantes do Imperio (CEI), criada pelo regime salazarista em 1944 e encerrada em 1965, foram recordados esta terça- feira (28.10) em Coimbra, numa homenagem promovida pela União das Cidades Capitais de Língua Portuguesa (UCCLA). Até maio de 2015 várias iniciativas estão previstas com esse objetivo em memória dos estudantes das antigas colónias portuguesas que lutaram nos anos 60 contra o regime colonial.
Artur Pestana, escritor angolano conhecido por Pepetela, foi um dos jovens africanos ativistas da Casa dos Estudantes do Império (CEI), criada em 1944 e extinta pela polícia política portuguesa (PIDE), durante o Estado Novo. São vários os momentos que marcaram esse periodo, lembra Pepetela. “A Casa participou muito ativamente nas greves, manifestações e lutas estudantis quer em Lisboa, quer em Coimbra, quer no Porto. E lembro-me que muita documentação “subversiva” clandestina era produzida na Casa.”
A CEI albergou muitas figuras da política e da cultura
A Casa dos Estudantes do Império terá contribuído para a clarificação e consolidação de ideias que já trazia de Angola. A também chamada Casa Comum albergou muitas das figuras e personalidades da política e da cultura, responsáveis pelas independências das então colónias portuguesas em África.
Uma destas figuras foi o então estudante de Medicina António Agostinho Neto, primeiro Presidente da República Popular de Angola, independente a partir de 11 de novembro de 1975. As casas de Lisboa e Coimbra fazem parte da vida associativa de Agostinho Neto, sob o olhar atento da PIDE. Testemunha a viúva e escritora angolana Maria Eugénia Neto. “Fui algumas vezes à Casa dos Estudantes do Império, em Lisbioa, quando o meu marido estava encarcerado na cadeia do Porto, para contatar alguns dos camaradas mais solidários com ele. Nessas alturas constatei que o ambiente era de amizade entre todos e que se sentia em sua casa. Mais tarde quando já em liberdade fui com ele assistir à palestra que deu sobre a negritude. Nessa época estava grávida do nosso primeiro filho Mário Jorge e bordava quietinha uma camisinha para o nosso futuro filho”.
Estudantes africanos e portugueses partilharam a CEI
Os estudantes portugueses e africanos partilharam o espaço da CEI. Entre estes, a DW abordou o político socialista português, Almeida Santos, que destaca o seu encontro com alguns dos jovens do Ultramar, como Agostinho Neto e Amílcar Cabral, que viriam a assumir a liderança das lutas de libertação do jugo colonial dos respetivos países, Angola e a Guiné-Bissau. “Conheci muitas e muitas futuras grandes figuras da política ultramarina que na altura eram perseguidos. E nós reunimos para discutir a temática da Casa dos Estudantes do Império. Ali conheci o Amílcar Cabral, o Jorge Santos, mas sobretudo fui lá uma vez com o Agostinho Neto e foi ele quem me apresentou o Amílcar Cabral. Acabei por ir para Moçambique como advogado e escolhi Moçambique para combater o colonialismo”.
O papel da CEI na formação cultural e política dos associados
A lista dos estudantes africanos é vasta. Esta terça-feira, em Coimbra, foram recordados, assim como foi enaltecido o papel que a CEI desempenhou na formação cultural e política dos seus associados.
Até maio de 2015, mês de África, os ex-associados são homenageados, por intermédio de vários eventos promovidos por um grupo encabeçado por Vitor Ramalho, secretário-geral da União das Cidades Capitais de Lingua Portuguesa. “Seria indesculpável, verdadeiramente indesculpável se não erguessemos essa memória, uma memória solidária, afetiva que também irmanou o povo português. Isto é bom que se diga. Realmente é caso para dizer que grandeza. Temos medo de quê? Porquê esta pequenez de raciocínio quando olhamos para a nossa memória e vemos esses homens que hoje quando eram jovens desbravaram caminhos para chegarmos aqui onde estamos”. Esta homenagem assinala também a coragem dos 43 anos da saída clandestina de um grupo de 120 ex-alunos ligados à Casa e é uma forma de recuperar a memória desse tempo importante na história de Portugal e dos Países Africanos de Língua Portuguesa. Estes países, segundo a jornalista luso angolana Diana Andringa, ainda têm como desafio a responsabilidade de escrever a sua história de modo a preservar a memória e a verdade.