HRW pede esclarecimentos a Luanda sobre "massacre do Huambo"
5 de abril de 2016O líder da seita angolana "Igreja do Sétimo Dia a Luz do Mundo" foi condenado a 28 anos de prisão pelo homicídio de nove polícias, nos confrontos de abril de 2015. Nove fiéis foram condenados a penas entre os 16 e os 27 anos de prisão.
A Human Rights Watch, organização de defesa de direitos humanos, considera que este julgamento não esclareceu o que aconteceu no monte Sumi, na província do Huambo. Em abril do ano passado, confrontos entre membros da seita e a polícia angolana causaram a morte de vários civis, mas os números nunca foram confirmados. Dados não oficiais dão conta de cerca de 300 mortes.
A DW África falou com Zenaida Machado, da Human Rights Watch, para perceber a posição da organização dos direitos humanos em relação a este julgamento.
DW África: Qual é a opinião da Human Rights Watch em relação a este processo?
Zenaida Machado (ZM): [A opinião da Human Rights Watch é que]este é um lado da justiça. Kalupeteka e os seus seguidores foram julgados pelos crimes de posse ilegal de arma, resistência à prisão, homicídio frustrado e homicídio de nove polícias. Mas para além da morte destes polícias, houve um incidente que, até agora, não foi esclarecido. O que nós esperamos é que este julgamento tenha sido a porta de abertura para saber exatamente o que é que se passou em abril, no Monte Suni, para que o Governo angolano publique os relatórios internos que tem sobre o que se passou naquele dia. E para que nos explique exatamente em que circunstâncias esses polícias foram mortos e o que é que se passou depois e que resultou na morte de vários outros fiéis desta seita. Até hoje, não se sabe exatamente quantos, quem são, quais são os seus nomes e onde é que as famílias podem encontrar os corpos destas pessoas para os poderem enterrar.DW África: E em relação ao julgamento de José Julino Kalupeteka, como avalia todo esse processo?
ZM: Foi um processo bastante longo, que teve as suas deficiências. Eu penso que Angola tem de trabalhar muito no que diz respeito à capacidade de dar aos seus cidadãos o direito a um julgamento justo. Neste momento, a Human Rights Watch não se pode pronunciar sobre as deficiências no mesmo e se de alguma forma violaram os direitos do réu e dos outros réus. É um caso criminal. É verdade que o Kalupeteka e os seus seguidores têm o direito a professar uma religião e a seguirem as práticas dessa religião. No entanto, os eventos à volta daquilo que nós chamamos “O Massacre do Huambo” não estão esclarecidos até agora e o julgamento não os conseguiu esclarecer.
DW África: A justiça angolana e o regime angolano têm sido criticados pela comunidade internacional e Luanda já disse que não vai aceitar ingerência nos assuntos internos. Como vê a reação da comunidade internacional, por um lado, e a reação de Luanda a este tipo de casos?
ZM: A reação internacional é de louvar e espera-se que mais vozes se possam juntar à Human Rights Watch, à Amnistia Internacional e a outras organizações de defesa dos direitos humanos, que durante muitos anos têm estado a lamentar e a documentar a questão dos direitos humanos em Angola. Toda a reação do Governo de Angola é a posição deles, é a que respeitamos, mas não concordamos [com ela], porque Angola tem compromissos internacionais e, como tal, tem que se submeter à observação e escrutínio internacional daquilo que são as suas atividades, com vista a cumprir aquilo que assinou em matéria de direitos humanos e de direito internacional.