Moçambique: Deserções em massa em reduto da RENAMO
1 de maio de 2020Cada vez mais membros da RENAMO, incluindo um delegado e um mandatário distrital, voltam as costas ao partido em Gorongosa, Maringué, Chibabava e Búzi, na província de Sofala, alegando que há "falta de democracia interna". Acusam em particular o presidente da RENAMO, Ossufo Momade, de criar um ambiente de "ditadura".
Isac Zeca desempenhava o cargo de delegado político distrital da RENAMO em Gorongosa, mas alistou-se entretanto no partido no poder em Moçambique, a FRELIMO: "Neste momento, eu voltei à casa, que é aqui na FRELIMO. Eu fiz uma análise e vi que não há mais esperança".
Ao todo, em Gorongosa, 53 pessoas abandonaram o partido nas últimas semanas. No distrito de Maringué foram 49.
Ernesto Angelino era forte defensor da atual liderança da RENAMO, chegou a ocupar o cargo de mandatário do partido na província de Sofala. Hoje diz-se arrependido. "Já sou velho, já tenho crianças - não têm formação, não têm nada. Eu comecei a refletir onde é que tem uma machamba fértil para fazer a minha produção e ela ser valente, eu fazia muito trabalho mas não tinha rendimento, é ficar totalmente estagnado numa água que nem vem, nem vai", afirma.
Questão de vida ou morte
Um mês antes de abandonar a RENAMO, Ernesto Angelino disse à DW que, internamente, se vivia um clima de tensão - e havia raptos e assassinatos contra membros do partido. A situação teria sido denunciada ao presidente Ossufo Momade, mas nada teria sido feito.
Ernesto Angelino presume que seja por isso que tantas pessoas se estejam a juntar à FRELIMO: "Se eu não vou fazer aquilo que é a vontade deles, eu posso morrer e ninguém está a favor da morte. O que também nos preocupa é quando você vê que uma pessoa lhe vai tirar a vida, você prefere entregar-se, ser escravo dessa pessoa, para você se safar da morte".
Mariano Nhongo, líder da autoproclamada "Junta Militar" da RENAMO e opositor confesso de Ossufo Momade - refere que há uma "caça às bruxas" na região. E aponta o alegado culpado: "Ossufo já enviou os documentos a cada província, estão nas mãos dos comandantes e do SISE, os documentos têm cada nome dos membros da RENAMO para serem fuzilados", acusa.
Nhongo contesta o acordo de paz de agosto de 2019 e lidera um grupo de guerrilheiros que tem feito vários ataques no centro do país.
Contactado pela DW, o porta-voz da RENAMO, José Manteigas, rejeita categoricamente as acusações: "É mentira, nem sequer dê importância a isso. É mentira. Não tem nada a ver".
O porta-voz da RENAMO atribui o que está a acontecer a "esquadrões da morte", que têm ameaçado e raptado membros da oposição. "Eles foram perseguidos e, como condição para não serem presos, foram obrigados a aparecer como tendo abandonado a RENAMO e filiar-se ao partido FRELIMO", explica. "Mais uma vez, isso revela que os 'esquadrões da morte' de facto continuam a perseguir pessoas. E a única maneira que os membros do partido têm para manter a sua vida é ceder às chantagens, porque isto aqui é uma chantagem política".
Segundo José Manteigas, a situação já foi denunciada às autoridades. A RENAMO pede um inquérito detalhado ao que se está a passar no centro de Moçambique.