A quem "suja" e interessa o assassinato de Amurane?
5 de outubro de 2017O Município de Nampula foi palco de uma forte tensão política nos últimos três meses. Uma crise que opôs o edil da cidade, Mahamudo Amurane, e o partido a que pertencia, o Movimento Democrático de Moçambique (MDM), esteve na origem da situação.
E neste mês de setembro a tensão atingiu níveis preocupantes, segundo Silvestre Baessa, especialista em boa governação e responsável do Diálogo, um programa que visa contribuir para uma melhor governação municipal de cinco cidades em Moçambique.
Baessa, que trabalhou diretamente com Amurane, conta como tudo começou: "Primeiro dizer que já um conflito aberto entre a Assembleia Municipal e o Conselho Municipal, no qual a Assembleia reprovou a proposta do orçamento justifiicativo que o Município submeteu. E o presidente [do Município] em forma de retaliação congelou os salários da Assembleia Municipal por três meses e essa crise só foi ultrapassada no dia 28 de setembro."
Silvestre Baessa prossegue explicando que "ao longo desse período houve outros episódios de tensão política perigosos, como por exemplo nas cerimónias de 7 de setembro onde militantes, que poderia qualificar de fanáticos, do MDM já consideravam Amurane traidor e como já não era membro do MDM tinha de abandonar o poder."
E o especialista finaliza lembrando que "ao longo desse período e do que antecedeu o 7 de setembro foram surgindo na cidade de Nampula rumores de que havia interesses muito fortes para remover Amurane do poder mesmo que fosse à força, de tal modo que ele começou a andar com proteção policial. Na sessão da Assembleia de 26 de setembro Amurane teve de ir escoltado por viaturas da polícia da sua casa até a sede do Município. E houve bastante tensão na sala, com mais de cem munícipes divididos, entre apoiantes do MDM e de Amurane."
MDM quer a verdade e justiça
Embora essa situação leve a suspeitas de que o assassinato de Mahanudo Amurane tenha motivações políticas, ainda não há provas disso. A polícia diz que ainda está a trabalhar no caso. Entretanto, o partido que levou Amurane ao poder, o MDM, reagiu ao sucedido.
Daviz Simango é líder da segunda maior força da oposição: "Sinto-me muito triste e indignado, sobretudo, devido a um assassinato brutal, macabro e cobarde. Não se pode admitir que, numa sociedade como a nossa, as pessoas usem instrumentos bélicos para tirarem a vida a seja lá quem for. Portanto, nós condenamos esse ato macabro."
E o líder do MDM está a contar com resultados da polícia: "Por outro lado instamos as autoridades a tomarem as diligências necessárias no sentido de descobrirem o que aconteceu e naturalmente responsabilizar o criminoso perante a justiça. Por outro lado queremos condenar todos os atos de desinformação a volta do MDM, o partido tem muito interesse em saber o que aconteceu e vais estar do lado da verdade e da justiça para que se esclareça o que terá acontecido."
Eleições autárquicas de 2018 já agitam...
O assassinato de Amurane acontece quando falta cerca de um ano para a realização de eleições autárquicas. E o MDM, que estava de relações cortadas com Amurane, é o único partido da oposição que conseguiu algo inédito: conquistar das mãos da FRELIMO três dos quatros municípios mais importantes do país.
A quem "suja" o assassinato de Amurane? Daviz Simango responde: "É preciso ver qual é a razão do ato, aí é que vamos chegar a questão a quem "suja". Mas, no fim do dia, a intenção é sempre desacreditar o MDM. O MDM é extremamente forte e nós vamos ao pleito eleitoral. Então, tudo o que se faz é tentar desacreditar o MDM."
Em Moçambique, há quem considere que o assassinato foi uma forma de silenciar uma voz crítica, alguém que não se conformava com a corrupção na gestão do seu Município e outras irregularidades. Mas terão sido a sua coragem e postura um motivo para o seu assassinato?
E que tal olhar para o setor empresarial de Nampula?
Silvestre Baessa, que trabalhou próximo de Amurane, responde colocando outra questão: "A quem preocupava a postura de Amurane? Amurane enquanto presidente desde o primeiro momento assumiu uma postura muito contrária ao que tem sido a tendência nacional. A tendência é de um discurso que não se transforma em prática. No caso de Amurane foi um discurso que se transformou em prática e é uma prática de integridade e de intolerância a corrupção. E tinha grande sentido de responsabilidade na gestão dos recursos dos municípios."
E o especialista em boa governação sublinha que há um outro setor que se sentiria incomodado com a postura de Amurane: "Ainda que não se concorde com isto, a postura de Amurane não só incomodava interesses instalados no Município, sobretudo interesses ligados à corrupção, mas também dentro do partido que era membro. E também de outros interesses do setor empresarial local que está muito habituado a práticas de corrupção e não só. E esse sistema de uma maneira geral. Eu não consigo encontrar argumentos que possam justificar uma ação dessa natureza."