Paris promove debate sobre paz e segurança em África
6 de dezembro de 2013Na sua campanha eleitoral, o então candidato a Presidente da França, François Hollande, prometeu uma nova política africana. Mas até agora a sua política consistiu sobretudo em enviar soldados para ex-colónias francesas.
Após o Mali, segue-se agora a intervenção na República Centro-Africana (RCA). Nesta quinta-feira, o Conselho de Segurança das Nações Unidas aprovou uma resolução que autoriza Paris a utilizar a força na RCA e Hollande já anunciou o arranque imediato da ação militar no país.
Talvez se torne mais claro o que Paris entende por "nova política africana" na cimeira africana de dois dias que começa nesta sexta-feira (06.12), na capital francesa. Vão participar representantes de mais de 40 países, entre os quais muitos chefes de Estado e de Governo.
Conta-se ainda com ilustres convidados como o secretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki-Moon, o Presidente da Comissão Europeia, José Manuel Barroso, e sua colega na União Africana, Nkosazan Dlamini-Zuma.
O encontro tem o lema "Segurança e Paz em África". O objectivo é desenvolver estratégias de longo prazo para a responsabilização autónoma dos países africanos. Mas ninguém sabe ao certo como. O director do Instituto de Estudos Internacionais nos Camarões, Jean-Emanuel Pondi, diz que não se vislumbra uma linha clara na política africana da França.
"É uma política sem continuidade. Não é coordenada, nem coerente, nem virada para o futuro. Parece que a França só reage aos acontecimentos, em vez de os influenciar à partida," diz.
Cimeira do Eliseu também contempla negócios em África
A cimeira africana também contempla os negócios. 600 empresas africanas e francesas vão participar numa feira industrial. O ex-embaixador francês na República Democrática do Congo, Pierre Jacquemot, não considera que o facto seja extraordinário.
"Cresce a participação da China e da Índia no mercado africano, de modo que importa que as empresas francesas entendam que as relações económicas estão a transformar-se e que já não detêm o monopólio no continente," avalia.
Mas é precisamente isso que irrita muitos observadores, entre os quais o politólogo Jean-Emanuel Pondi.
"A África não é uma reserva de caça da qual se pode reivindicar bocados. Os americanos e os europeus são nossos amigos, tal como os chineses também," pondera. "Não temos que prestar contas a ninguém," defende.
O lema da cimeira parisiense não podia ser mais actual. A França está novamente em vésperas de intervir militarmente numa antiga colónia. Quatro mil soldados vão juntar-se a tropas africanas para tentar salvar do caos a República Centro-Africana.
Trata-se da segunda intervenção, após o Mali, desde que o Presidente Hollande assumiu o poder há um ano. Os críticos, em África, interrogam a seriedade de Paris ao anunciar uma nova política africana, para além da tradicional "Franceafrique" com o seu emaranhado de interesses entre a França e as antigas colónias.
No passado, as intervenções militares francesas serviram sempre para impor os seus interesses geopolíticos e económicos naquele continente.
Falta clareza na política africana da França?
O especialista em direito da universidade de Ouagadougou, no Burkina Faso, Luc-Marius Ibriga, saúda as duas missões militares francesas na perspectiva da preservação dos direitos humanos. Mas ao mesmo tempo receia uma nova forma de paternalismo francês.
"É a mesma Franceafrique com roupagem nova," garante. Para ele, talvez haja mais africanos dispostos a aceitar a roupagem nova do que o conceito de Franceafrique defendido por Mitterrand, de Gaulle ou Pompidou. "Assim a França pode voltar a assumir o papel de salvador da África," critica.
Ibriga desconfia que o Presidente francês também quer distrair dos problemas internos na França, nomeadamente a crise económica e o aumento da taxa de desemprego.
No entanto, também este académico reconhece que pelo menos as novas intervenções militares da França são todas autorizadas pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas e integradas nas missões de organizações regionais africanas.
Os PALOP marcam presença
A nível dos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP), os primeiros-ministros de Cabo Verde, José Maria Neves, da Guiné-Bissau, Rui de Barros, e de São Tomé e Príncipe, Gabriel Costa, estarão presentes na reunião, assim como o ministro das Relações Exteriores de Angola, Georges Chikoti, e o dos Negócios Estrangeiros e Cooperação de Moçambique, Oldemiro Balói - em substituição do Presidente moçambicano, Armando Guebuza, que cancelou a deslocação a Paris na sequência do acidente de sexta-feira (29.11) com um avião das Linhas Aéreas de Moçambique que provocou 33 mortes.
No primeiro dia da cimeira, uma sessão plenária à porta fechada será dedicada à discussão das ameaças que atravessam o continente, como os tráficos, o terrorismo, a pirataria, as dificuldades de controlo das fronteiras, bem como a criação de uma força africana de ação rápida.
No sábado, os participantes analisarão as questões das parcerias económicas e do desenvolvimento, bem como das alterações climáticas.
A cimeira foi anunciada pelo presidente francês, François Hollande em maio em Addis Abeba, durante o 50° aniversário da criação da Organização da União Africana, que deu origem à UA em 2002.