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Pobreza na Nigéria na origem do conflito das religiões

29 de dezembro de 2011

Atentados recentes do grupo islamista da Nigéria, Boko Haram, custaram a vida a mais de 40 pessoas. Agora, as vítimas dos ataques, cristãos nigerianos, ameaçam retaliar. A análise das causas e consequências.

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M. Ogbunwehzeh, Internationale Gesellschaft für Menschenrechte, Fotograf: Thorsten Holler, Copyright:IGFM sind zur uneingeschränkten honorarfreien Verwendung freigegeben
O analista Emmanul Ogbunwehzeh, do IGFM, alerta para o perigo de um colapso do Estado nigerianoFoto: IGFM

Para tentar perceber a situação na Nigéria, a Deutsche Welle falou com Emmanuel Franklyne Ogbunwezeh (EFO), diretor do Departamento de África da Sociedade Internacional dos Direitos Civis (IGFM).

DW: Os confrontos entre muçulmanos e cristãos na Nigéria têm origem na intolerância religiosa?

 EFO: A Nigéria é um país com muitos problemas de relacionamento das duas principais religiões. No Norte temos uma maioria muçulmana, o sul é predominantemente cristão. 45% da população é muçulmana, outros 45% são cristãos. 10% são animistas. Mas o problema é a enorme pobreza. A elite, um por cento da população, detém 80% da riqueza! Os pobres refugiam-se na religião e muitos estão a ser submetidos a uma lavagem cerebral no que toca a religião dos outros. Os muçulmanos são incitados a ver os cristãos como um problema, e vice-versa. Este é o contexto dos atentados, gerado pela pobreza e frustração. Acresce que nos últimos tempos surgiram várias organizações extremistas e fanáticas. E que apostam nestes atentados para se estabelecer.

epa03042960 Crowds gather at the site of the bomb blast at St Theresa's Catholic Church in Madalla, near Abuja, Nigeria, 25 December 2011. The church was full at the time an recent estimates leave the death told 19 people. EPA/- +++(c) dpa - Bildfunk+++
O mais recente atentado da Boko Haram custou a vida a 40 pessoasFoto: Picture-Alliance/dpa

DW: Qual é a diferença em relação à perseguição de cristãos no Egito e no Iraque?

EFO: Neste momento, a instabilidade na Nigéria é tão grande que a situação pode vir a ser pior do que no Iraque. A diferença é que o Iraque tem dois grupos islâmicos que rivalizam, os xiitas e os sunitas. Na Nigéria o atrito é entre muçulmanos e cristãos. Os muçulmanos afirmam que nunca aceitarão um cristão como Presidente, e, na verdade, nunca o aceitaram.

DW: Como no caso de Goodluck Jonathan?

EFO: É uma tendência com tradição. Sempre que um cristão assume a presidência os muçulmanos começam a agitar para derrubar o governo. Aconteceu em 1999, quando foi eleito o general Olusegun Obasanjo, que era do sul e cristão. Quando os muçulmanos assumem o poder, ninguém reivindica a lei islâmica "sharia". Isso só acontece quando há um Chefe de Estado cristão. Durante a presidência de Alhaji Umaru Yar’dua, quase não se verificaram ataques. Que recomeçaram com a eleição de Goodluck Jonathan.

DW: O conflito vai além da religião?

Bildausschnitt von Jonathan Goodluck. French Prime Minister Francois Fillon, left, stands with Nigerian d Vice President Goodluck Jonathan as he meets for talks with leaders of Africa's most populous nation, at the Presidential Villa in Abuja, Nigeria Friday, May 22, 2009. Fillon later told reporters that France was Nigeria's second-largest investor after the United States, and he praised Nigeria for contributing to peacekeeping missions across Africa. (AP Photo/Abayomi Adeshida)
O Presidente, Goodluck Jonathan, é um cristão oriundo do sul do paísFoto: AP

EFO: Tem a ver com poder. Quem tem o poder central controla o petróleo. É por isso que os acontecimentos estão ligados também à pobreza. O Norte sente-se posto de parte, e tenta regressar ao poder desestabilizando o governo liderado por um cristão do sul.

DW: Que perspetivas vê para a Nigéria?

EFO: Alguém está a tentar desencadear uma guerra civil na Nigéria. Os ataques de muçulmanos contra cristãos e vice-versa vão conduzir a uma guerra. Se a situação não mudar rapidamente, dentro de dez anos, ou menos, a Nigéria deixará de existir. Não sabemos o que vai acontecer em 2012. Os cristãos estão a perder a paciência. Lembro que o governo deu milhões de dólares aos terroristas no Delta do Níger para os apaziguar. Penso que o Norte quer uma solução igual. Gira tudo em torno do dinheiro, da pobreza e da tentativa de transformar toda a África ocidental num califado muçulmano. Penso que esta gente está a receber muito apoio do exterior.

DW: A situação já está descontrolada?

EFO: A Nigéria é uma nação muito complexa. Tem mais de 350 tribos que falam mais de 3000 idiomas. Pode ser que uma pessoa já não entenda outra que viva a 20 quilómetros de distância. O inglês é a nossa língua oficial, mas 60% da população é analfabeta. Por onde é que se começa a resolver os problemas num país tão complexo?

DW: Pensa que o governo conseguirá evitar o colapso político do país?

An undated file photograph shows A SHELL worker in an offshore oil platform in the Niger Delta, Nigeria. Leading non-Saudi oil exporters, Russia, Nigeria and Mexico have pledged to boost production to offset rising oil prices and Nigeria's Presidential Advisor on Petroleum and Energy, Edmund Dakouro, has said that his country could pump an additional 300,000 barrels a day of crude oil within 40 days, if the market needs it. (AP Photo/ SHELL)
Na Nigéria não há uma distribuição equitativa da riqueza gerada pelo petróleoFoto: AP

EFO: O governo deve mostrar que tem a vontade e capacidade para travar este desenvolvimento. Não basta enviar os soldados para matar aqueles que o governo pensa que são os autores dos atentados. É preciso dialogar com essas pessoas. É preciso descobrir quem são elas, porque estão a agir deste modo e como se pode solucionar o problema? Os nigerianos não têm o hábito de fazer uma análise lógica para dissecar um problema. Reagem sempre espontaneamente: enviando soldados que matam e depois regressam a casa. A situação não muda. Para que a Nigéria sobreviva, é necessário que o governo redistribua a riqueza. Devemos resolver com urgência a questão da educação, do desemprego entre os jovens e da relação entre as religiões cristã e muçulmana.

Autor: Johanna Schmeller
Edição: Cristina Krippahl/António Rocha