Presidente angolano procura em Paris renovar relação bilateral com França
29 de abril de 2014A deslocação do Presidente de Angola, José Eduardo dos Santos, a França decorreu em conjunto com uma vasta comitiva que integra membros do Governo de Luanda, entre os quais os ministros dos Negócios Estrangeiros, Georges Chikoti, das Finanças, Armando Manuel, e do Petróleo, Botelho de Vasconcellos.
A viagem acontece doze anos depois do caso "Angolagate", que arrefeceu as relações bilaterais, às quais Paris e Luanda procuram agora dar um novo rumo.
Emanuel Lopes, investigador no Centro de Estudos Africanos, do Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa (ISCTE), que acompanha a visita do Presidente angolano a Paris, a partir de Lisboa, confirma que a viagem pretende relançar a relação bilateral.
"Penso que estamos numa fase de aproximação. Por um lado o 'Angolagate' já lá vai, com as respetivas penas perdoadas pelas instâncias superiores", comenta o analista.
"A verdade é que França está, como toda a Europa, afetada por uma crise económica, à exceção da Alemanha, e precisa de uma política de negócios mais agressiva. Daí que tenha de se esquecer do 'Angolagate' e avançar", acrescenta.
"Angolagate" manchou nomes em França
"Angolagate" é o nome dado ao processo sobre o tráfico ilegal de armas da Europa de Leste para Angola, entre 1993 e 2000, durante a guerra civil angolana.
Entre os acusados de estarem envolvidos no esquema de tráfico figuravam altas personalidades francesas, como Jean-Christophe Mitterrand, filho do ex-Presidente francês François Mitterrand, os empresários Pierre Falcone e Arcadi Gaydamak, ambos detentores de passaporte angolano, e o ex-ministro francês Charles Pasqua.
"Angola prejudicou França com a história do 'Angolagate', porque o poder em Angola funciona discricionariamente, é um poder ditatorial, e impediu uma série de negócios da Elf e da Total, assim como os concursos aos novos blocos de petróleo", recorda o investigador.
"Agora que Angola se prepara para fazer a concessão dos novos blocos, França está a aproximar-se. Por outro lado, Angola precisa, digamos assim, de porta-vozes da sua política na Europa", sugere Emanuel Lopes.
"Portugal perdeu influência na Europa, portanto Angola precisa de alguém na União Europeia que os defenda urgentemente", conclui o analista.
França é o terceiro maior investidor em Angola
Durante a visita oficial a Paris, a convite do presidente francês, José Eduardo dos Santos e restante comitiva mantêm encontros com cerca de meia centena de empresários franceses de diferentes setores de atividade, num fórum de negócios no qual participará também o ministro dos Negócios Estrangeiros francês, Laurent Fabius.
França é atualmente o sexto fornecedor de Angola, atrás de Portugal, Estados Unidos, China, Brasil e África do Sul, e o terceiro maior investidor em Angola, com negócios nos últimos anos que superam os dez mil milhões de euros.
A petrolífera Total é um dos exemplos do investimento francês em Angola, sendo atualmente o maior produtor de petróleo, com 600 mil barris por dia, nos vários poços em que opera.
Numa fase de profunda crise económica na Europa, França precisa de aumentar as exportações. Segundo o investigador português Emanuel Lopes, Angola seria, na ótica de Paris, o destino ideal para armamento francês.
"Angola irá substituir brevemente muito material militar e França está a candidatar-se. Todo o armamento angolano tem origem na União Soviética, mas é um armamento que está a ficar obsoleto e a Rússia não consegue prestar a assistência necessária. É muito natural que Angola, não podendo ir aos norte-americanos, vá aos franceses ou aos brasileiros para comprar material", frisa o analista.
Os negócios entre os dois países marcam a agenda das relações entre França e Angola, mas a oposição angolana não concorda: um gabinete da União Nacional
para Independência Total de Angola (UNITA), na oposição dirigiu esta terça-feira uma carta aberta ao ministro dos Negócios Estrangeiros francês, à imprensa e aos defensores dos direitos humanos denunciando o Governo do Presidente angolano pelos abusos cometidos durante os 35 anos no poder.