Vítimas de desalojamentos forçados desesperam em Luanda
26 de julho de 2016Vicente Kingila convida-nos a entrar em sua casa. Na sala pequena, os raios solares iluminam os poucos móveis: um sofá e uma cama. O espaço é compartilhado por Vicente, pela mulher e pelos dois filhos. A família tem também um fogão a gás; a botija está escondida. Não há casa de banho.
"São as condições em que nós vivemos debaixo destas chapas", afirma Vicente, de 39 anos. "É um problema sério".
Em Angola, como Vicente, dezenas de vítimas de demolições e desalojamentos forçados e expropriação de terrenos continuam sem casa. A situação arrasta-se há vários anos. Muitas famílias estão concentradas em centros de acolhimento no bairro Sapú 2, no município de Belas, no Zango 1, em Viana, e na chamada zona da Areia Branca, na baixa de Luanda.
De provisório a definitivo
"Quando chegámos aqui disseram-nos que íamos ter casa. Mas agora estamos à espera e não há uma solução certa", diz Manelita Mariana. A angolana de 40 anos foi retirada do bairro Uíge, no Sambizanga, em 2007. Agora vive num casebre, no bairro Sapú 2.
"Não dá para ficar assim na rua", afirma em entrevista à DW África, com um dos quatro filhos nascidos na casa de lata ao colo. "As crianças vão à escola e começam a zombá-las que têm casa. Os outros têm as suas casas."
Joaquim Luís, outro morador do bairro de lata, explica que as dificuldades aumentam quando chove em Luanda. "Quando a chuva vem é uma calamidade enorme, eu tenho uma coleção de livros e não se aproveita nada. Até os documentos se vão perdendo", diz. Para piorar a situação, os insetos e os bichos também fazem morada nas casas improvisadas. "Ratos e baratas aqui é um sacrilégio."
SOS Habitat: Sem condições não!
É necessário criar condições de realojamento antes de desalojar famílias, defende Rafael Morais, da organização não-governamental SOS Habitat. Em processos de realojamento anteriores, foi atribuída uma só residência a mais de duas famílias no Zango e Panguila, denuncia o ativista - "é uma situação que tem sido recorrente, o que viola o artigo 32º da Constituição, que é o direito à intimidade, e [o Artigo 37º,] o direito à propriedade".
O Governo Provincial de Luanda não aceitou gravar entrevista, mas garantiu que estão a ser criados mecanismos para realojar as famílias.
Entretanto, a disputa de terrenos em Luanda continua. O Presidente da República, José Eduardo dos Santos, criou o Posto de Comando Unificado (PCU) para proteger as reservas fundiárias do Estado, invadidas às vezes por populares. Mas, segundo relatos, a instituição tem facilitado a expropriação de terrenos de particulares.
De acordo com Rafael Morais, nos problemas de terrenos em Luanda estão igualmente envolvidas altas patentes das Forças Armadas Angolanas (FAA) e da Polícia Nacional. "Muitas vezes são generais que vêm com a capa de Governo, utilizando as administrações municipais para poderem satisfazer as suas necessidades e violando gravemente os direitos das famílias - por exemplo, os camponeses."
Tentámos contactar os acusados, sem sucesso.