Acordo da Siemens gera debate acalorado
28 de junho de 2004A jornada de trabalho na Alemanha ocupa as folhas de todos os jornais do país, que estampam as opiniões mais controversas, desde que a Siemens e o sindicato dos metalúrgicos IG Metall anunciaram consenso que salvou 2000 postos de trabalho no Estado da Renânia do Norte-Vestfália. O pomo da discórdia é o aumento da jornada de trabalho — neste caso de 35 para 40 horas semanais — e a renúncia dos trabalhadores a abonos de Natal e férias para garantir que seus empregos não sejam cortados ou transferidos para o exterior.
Modelo para outras empresas
Segundo o diário Die Welt, citado por diversos outros órgãos da imprensa como Der Spiegel e Süddeutsche Zeitung, mais de 100 empresas na Alemanha estariam negociando o aumento da jornada semanal sem compensação salarial, bem como reduções nos abonos costumeiros. Grande parte delas seriam empresas de pequeno e médio porte nos estados da Renânia do Norte-Vestfália e Baviera. Mas a lista incluiria também grandes nomes, como a DaimlerChrysler, a MAN e — fora do setor industrial — a operadora de turismo Thomas Cook.
Os empregadores, por sua vez, não teriam nada a opor, se o modelo fizesse escola. "Vejo aí a chance de que, com base em exemplos com esse, se desenvolva uma nova cultura nas negociações de acordos coletivos", declarou Dieter Hundt, presidente da entidade patronal, à edição alemã do Financial Times. O que Hundt ressalta é a flexibilidade que o acordo contém, permitindo a cada setor, ou mesmo a cada empresa, negociar com autonomia, segundo as próprias necessidades.
Já outros representantes do setor empresarial defendem o aumento generalizado da jornada de trabalho. "Ela não pode ser possível só em casos excepcionais", declarou à revista Focus o presidente da Confederação da Indústria Alemã, Michael Rogowski.
Partidos conservadores: este é o caminho certo
Para a presidente da União Democrata Cristã (CDU), Angela Merkel, "este acerto é o sinal correto". Agora seria necessário estabelecer uma segurança jurídica para alianças empresariais em prol do trabalho.
O presidente da União Social Cristã (CSU), Edmund Stoiber, vai mais longe. Caso a oposição ganhe as próximas eleições parlamentares, em 2006, CDU e CSU vão mudar as leis trabalhistas, garantindo maior autonomia às empresas nas negociações. "Soluções flexíveis que permitam aumentar a jornada são um dos meios mais eficazes para pôr um ponto final na transferência de milhares de postos de trabalho da Alemanha para o exterior", declarou o governador da Baviera.
Sindicato põe a culpa no governo
Temerosos de que o consenso regional acabe ocasionando uma avalanche, os sindicatos anunciam resistência férrea a qualquer tentativa de reproduzi-lo de maneira generalizada. O acordo feito com a Siemens é um "caso avulso e não uma matriz a ser copiada" adverte Jürgen Peters, presidente do IG Metall.
Esta posição é defendida também pelo governo: o ministro da Economia e do Trabalho, Wolfgang Clement, insiste em que "regras generalizadas neste sentido são um erro". Ainda assim — talvez em reação própria de quem se sente acuado — Frank Bsirske, presidente do sindicato de serviços Ver.di, resolveu partir para a briga com o governo, declarando ao Welt am Sonntag a política de Gerhard Schröder literalmente "fracassada", em sua intenção de gerar postos de trabalho, reduzir o desemprego e reativar a conjuntura.
A declaração mordaz de Bsirske foi reação a uma advertência de Schröder de que os sindicatos precisam se dispor a encarar a nova realidade das empresas. O embate incomum entre um sindicato e a social-democracia já gerou reações, não só de parte do próprio governo e do partido. Guido Westerwelle, presidente do oposicionista Partido Liberal, assegurou ao governo apoio absoluto nesta questão.
No ponto em que anda o debate, tudo indica que ele preencherá gazetas e talk shows na Alemanha pelo menos por algumas semanas.