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Brasil no Haiti

29 de janeiro de 2010

Em entrevista exclusiva, ministro das Relações Exteriores diz ser boa a cooperação com os Estados Unidos e que o Brasil não tem metas geopolíticas no Haiti. Analista, no entanto, vê interesses do governo brasileiro.

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Soldados brasileiros distribuem água no HaitiFoto: AP

Já faz cinco anos que o Haiti convive com a presença brasileira em seu território. Armados, uniformizados e diferenciados pelo capacete azul, os homens da força de paz das Nações Unidas atuam sob o comando do Exército Brasileiro. Em vigor desde 2004, a missão da ONU cuida da segurança da população com a ajuda de 9 mil soldados, dos quais 1.300 são brasileiros.

O terremoto que destruiu o país também vitimou brasileiros: além de Luiz Carlos da Costa, segundo mais alto funcionário da ONU na missão de paz, 18 militares perderam suas vidas. "O Brasil já estava sendo solidário nesta fase anterior, de tentativa de construção de um Estado, de desenvolvimento, estabilidade e segurança no Haiti. E, que de repente, no meio desse esforço de construção, sempre junto com as autoridades haitianas, sob o mandato da ONU, se vê envolvido também nessa tremenda catástrofe", lamentou o ministro de Relações Exteriores do Brasil, Celso Amorim, em entrevista exclusiva à Deutsche Welle.

Em resposta à tragédia, o Brasil organizou sua maior força-tarefa de socorro a um país estrangeiro e mobilizou diversos ministérios – até o presidente Lula deve viajar em fevereiro ao país.

Para Rafael Duarte Villa, coordenador científico do Núcleo de Pesquisa em Relações Internacionais da Universidade de São Paulo, que presenciou há seis meses o trabalho das tropas brasileiras no país caribenho, há outras questões em jogo – além da solidariedade ao povo haitiano. "Apesar de o Haiti ser um país falido, sabemos que o Brasil tem suas finalidades políticas, que ele não foi lá a troco de nada."

Desde o início do primeiro mandato de Lula, o governo demonstrou que estava disposto a reforçar a presença brasileira na América do Sul. Capítulos recentes da história da região, como a intermediação da crise em Honduras, colocaram o Brasil em evidência nos círculos internacionais de discussão política. Segundo a análise do especialista, o governo brasileiro quer ser visto como autoridade regional – em contraponto aos Estados Unidos – quando o assunto é segurança na América Latina.

"O Brasil vem se candidatando a uma vaga permanente no Conselho de Segurança da ONU e esse tipo de ação pode ser uma oportunidade para conseguir esse objetivo", analisa Villa. Segundo o especialista, o governo brasileiro sabe que só ganhará o posto de destaque nas Nações Unidas quando provar para a comunidade internacional que tem condições políticas, econômicas e militares para assumir a função.

"Honestamente, não estamos preocupados com isso. A ONU precisa mudar e vai ter que mudar, como mudou a governança econômica com a criação do G20. Então isso vai acabar acontecendo, quando é que vai acontecer, eu não sei. Mas certamente nós não estamos no Haiti por causa disso. Se fosse atrás disso, nós teríamos participado da guerra do Iraque, teríamos participado de outras situações que nós não achamos que deveríamos participar", rebate o ministro Celso Amorim.

Apenas cinco membros do Conselho de Segurança são permanentes: China, França, Estados Unidos, Reino Unido e Rússia. Os outros dez são eleitos pela Assembleia Geral por um período de dois anos.

Celso Amorim
Celso Amorim: ONU vai ter que mudar como mudou a governança econômica com a criação do G20Foto: AP

Interesses geopolíticos?

Sobre a presença de soldados dos Estados Unidos no Haiti depois da tragédia, o ministro rejeita a possibilidade de haver um clima competitivo entre a potência norte-americana e o Brasil.

"O depoimento que eu recebi dos nossos militares, inclusive do general Floriano Peixoto, que é comandante de todas as forças nas Nações Unidas, tem sido de uma boa cooperação com os Estados Unidos, que tem uma força maior, e também com o Canadá. No caso da França, acho que o problema não se coloca, porque não existem propriamente forças."

Na opinião de Villa, a presença dos Estados Unidos pode ter um caráter preventivo, já que uma das preocupações fundamentais é evitar que haja uma invasão de imigrantes. E a pressão na fronteira americana deve aumentar depois do terremoto: antes da catástrofe, 40 mil haitianos estavam na lista para serem repatriados.

O temor de que haja fuga em massa do Haiti foi tema de um encontro com empresários no Fórum Econômico Mundial em Davos. Segundo Celso Amorim, as doações desse grupo são fundamentais nessa fase de ajuda, mas serão ainda mais importantes na fase posterior, de reconstrução e desenvolvimento do país caribenho. "Uma das razões que mais preocupa hoje o governo haitiano é o êxodo de jovens, então é preciso desde logo que criemos perspectivas de trabalho para os jovens haitiano, para que eles fiquem lá, porque são a maior riqueza que o país tem", declara o ministro.

Aceitação dos brasileiros

Para os soldados brasileiros que estão nas ruas do Haiti todos os dias e que convivem com a população local, o clima é amistoso. "Os haitianos respeitam o Brasil porque o soldado brasileiro tem uma forma diferente de atuar. A patrulha pela capital é feita a pé, por isso há mais contato com a população. E, depois de cinco anos, vemos crianças na rua falando o português", diz o coronel Alan Sampaio Santos, porta-voz do Exército Brasileiro no Haiti e integrante da missão há sete meses.

Autora: Nádia Pontes

Revisão: Roselaine Wandscheer

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