Fogo contra os 'invasores'
3 de agosto de 2009
De dia, as coisas parecem tranquilas nas esquinas do bairro Kreuzberg, em Berlim. Crianças brincando, cachorros à volta, passantes conversando. De noite, as coisas podem mudar de figura. Afinal, numa das esquinas se situa o condomínio de luxo Carloft. Volta e meia, um saco de tinta explode na fachada da construção de concreto e vidro, muitas vidraças já foram quebradas. Para muitos moradores de Kreuzberg, o Carloft é uma provocação.
Estacionamento exclusivo na sacada
Os apartamentos do Carloft custam entre 500 mil e 1,2 milhão de euros. O que incomoda os vizinhos, no entanto, não são necessariamente esses apartamentos exorbitantes, mas sim o elevador especial do condomínio. Como ele, os moradores do Carloft podem transportar seu carro até o andar de seus apartamentos e estacioná-lo na Carloggia, uma sacada para veículos.
Os apartamentos do Carloft com suas vagas exclusivas de estacionamento são um exemplo da discussão sobre quem pode e quem não pode morar em Kreuzberg. Mais de 90 carros foram alvos de atentados incendiários em Berlim, a maioria deles ocorridos nos tradicionais bairros alternativos de esquerda Kreuzberg e Friedrichshain.
Não é de se admirar, diz o porta-voz da polícia berlinense, Thomas Goldack. "Nesta área da cidade há diversos edifícios prestigiosos, novos ou reformados, que se tornaram objetos de ódio da cena de esquerda", explica Goldack. Com rosto sério, o policial acrescenta que os ataques de ativistas querem assustar possíveis compradores.
A novidade é o grande número de atentados, geralmente praticados com material inflamável usado para acender churrasqueiras. A reestruturação de certos bairros de Berlim e a disputa pela concepção adequada não são de hoje, no entanto.
Aluguéis crescentes rechaçam quem ganha menos
Com a queda do Muro, algumas partes de Berlim dominadas por edifícios antigos e anteriormente situadas perto da fronteira entre a partes oriental e ocidental da cidade se tornaram o verdadeiro centro. O charme mórbido desses bairros decadentes e os baixos aluguéis atraíram imediatamente estudantes e artistas.
Os "pioneiros do desenvolvimento urbano" tornaram atraentes regiões como Prenzlauer Berg ou Friedrichshain. Os prédios foram reformados e um público cada vez mais rico passou a querer morar lá também. Para os investidores, começou então a valer a pena construir apartamentos nobres e vendê-los a preços exorbitantes. Desde então, a demanda continua elevando os preços, também dos aluguéis. Aos moradores menos abastados só resta abandonar o bairro.
Protestos contra luxuosa urban village
No cobiçado bairro de Prenzlauer Berg, dominado por construções do século 19, também há conflitos por causa de prédios novos. O condomínio Marthahof, um complexo de casas e apartamentos luxuosos agrupados em torno de um amplo pátio interno, é motivo de polêmica.
O condomínio, que abrigará 500 pessoas, ainda está em construção. O projeto se autodenomina urban village, mas isso não acalma os ânimos dos vizinhos. Os moradores da vizinhança consideram os novos prédios altos e caros demais e temem que o pátio interno não tenha acesso público.
Atentados não assustam investidores
A "vila", que está sendo construída em meio a um bairro de construções antigas e com uma viva cena cultural, promete reunir as vantagens da cidade e do campo. Compradores em potencial não se deixam assustar pelos atentados a fogo e pelos protestos.
Goldack tentou descobrir qual o efeito dos ataques incendiários sobre eventuais compradores. Ele conversou com algumas pessoas e chegou à conclusão de que os interessados em morar em prédios luxuosos acreditam que isso também faz parte de Kreuzberg. Em alguns casos, é justamente essa resistência da cena esquerdista que parece tornar o negócio atraente.
Autor: Benjamin Braden
Revisão: Alexandre Schossler