Cerco tem alto preço para população de Aleppo
2 de agosto de 2016O número de bombardeios vem aumentando em Aleppo e nas cidades vizinhas. Há poucos dias, uma série de 26 ataques aéreos do regime sírio e da Rússia atingiram Al-Atareb, nos arredores de Aleppo e controla pela oposição, matando 42 civis em apenas 24 horas.
Depois de o único hospital da cidade ser bombardeado quatro vezes em apenas uma hora e meia, o centro cirúrgico não tinha mais condições de operar, algo preocupante sobretudo para os que necessitavam de cirurgias imediatas. Apesar de muitos terem sido encaminhados para a Turquia, somente os gravemente feridos têm permissão de cruzar a fronteira, e a viagem geralmente impõe uma série de perigos adicionais.
"Dependendo de onde um paciente está, transportá-lo para a Turquia pode exigir passar pelas Forças Democráticas Sírias, pelo 'Estado Islâmico' ou por áreas controladas pelo regime", afirma o médico Hassan, que coordena as remoções médicas com a Associação Internacional de Médicos. "Muitas vezes o risco não compensa."
A poucos quilômetros da devastada Al-Atareb, os feridos em Aleppo têm ainda menos opções. Desde o mês passado, quando o Exército sírio fechou a estrada Castello – a única via de ligação entre o lado oriental da cidade, controlado pela oposição, e o ocidental, controlado pelo regime –, um cerco total foi imposto a Aleppo.
"Tudo mudou com o cerco", conta Khaled, de 25 anos e que trabalha com a Defesa Civil Síria, um grupo de socorristas. "Estamos ficando sem comida. O preço de um quilo de arroz passou de 100 para 500 libras sírias (cerca de 1,50 para 7,50 reais). A maioria das lojas fechou suas portas."
Para os trabalhadores do setor da Saúde em Aleppo, que ficaram conhecidos por seguir atuando mesmo sob as circunstâncias mais terríveis, o cerco trouxe ainda mais desafios. Mesmo a estrada Castello sendo notoriamente perigosa, com ataques aéreos tendo como alvo tudo o que se move, ainda se tratava de uma via essencial de ligação com a cidade, sobretudo para a comunidade médica.
Agora, os 33 médicos ali remanescentes dependem de reservas emergenciais de suprimentos médicos para tratar os cada vez mais frequentes ferimentos de guerra e casos de subnutrição, enquanto hospitais são bombardeados e impedidos de funcionar.
"Os hospitais estão superlotados", diz Mohamed Katoub, diretor de estratégia da Associação Médica Sírio-Americana (SAMS). No leste de Aleppo, o número de pacientes por médico é de 9.090 para um, enquanto a média global é de 300 para um. "Eles têm que tratar muito mais gente do que estão acostumados", afirma Katoub.
Falta de suprimentos
De acordo com Katoub, trabalhadores médicos já previam o cerco e vinham estocando suprimentos nos últimos seis meses. No entanto, ataques como o que teve como alvo um banco de sangue, na última sexta-feira, mostraram aos médicos que mesmo tendo se preparado com antecedência, seus suprimentos não estão seguros nas circunstâncias atuais.
A impossibilidade de se mover livremente para ser atendido por um especialista fora da cidade ou ser encaminhado para a Turquia, se necessário, também está tornando ainda mais difícil prover assistência aos pacientes, num ambiente já bastante hostil.
"Há muitos serviços médicos de que não dispomos na cidade", diz Katoub. Enquanto isso não era um problema antes do cerco, a impossibilidade de sair da cidade reduziu o acesso ao tratamento especializado. "Só temos um neurocirurgião aqui. É impossível ele dar conta da quantidade de casos que temos recebido."
Katoub e outros médicos pressionam pelo acesso à estrada Castello para possibilitar o transporte médico emergencial, mas ainda não obtiveram resposta da ONU ou do governo. O regime sírio informou a população de que é possível receber tratamento em hospitais na porção da cidade controlada pelo regime, mas muitos pacientes que optaram por isso foram detidos ou interrogados ao ingressar nessas áreas. Agora, a maioria se recusa a aceitar essa como uma solução viável.
"O regime tem serviços médicos como alvo porque as pessoas não podem viver sem acesso a eles", afirma Katoub. Estima-se que 60% dos hospitais do país tenham sido completamente ou parcialmente destruídos.
"Não se pode viver num lugar em que não se tem acesso a vacinas para os filhos ou tratamento em caso de doença ou ferimento. Esse é o principal motivo por que as pessoas abandonam suas cidades", conclui.