Igreja Católica
24 de novembro de 2010O jornalista alemão Peter Seewald teve a chance de entrevistar diariamente o papa Bento 16, durante uma semana. O livro Licht der Welt. Der Papst, die Kirche und die Zeichen der Zeit (Luz do mundo. O papa, a Igreja e os sinais dos tempos, em tradução livre) foi apresentado por Seewald no Vaticano na terça-feira (23/11) diante de um grande número de jornalistas.
Antes do lançamento, trechos da obra causaram alarde com passagens em que o pontífice diz, em relação ao uso de preservativos, que o recurso "pode ser justificado, sob certas circunstâncias". O autor adiantou que há outros temas importantes no livro. Também ficou claro na apresentação que, apesar da passagem sobre o preservativo, não se pode afirmar que há uma nova visão sobre moralidade sexual na Santa Sé.
Controvérsia sobre preservativos desagrada autor
Foi o próprio Vaticano que se apressou em colocar sua máquina de propaganda para funcionar a todo o vapor. No sábado passado (20/11), o Osservatore Romano, jornal oficial do Vaticano, publicou em primeira mão a passagem mais explosiva do livro. A medida presenteou o jornalista Peter Seewald com um salão cheio de jornalistas, particularmente interessados sobretudo em um só tema: o papa e os preservativos. Tudo isso para sofrimento do próprio autor.
"Grande parte do livro fala sobre a crise na Igreja e também sobre a crise da sociedade, e a crise da sociedade, como todos nós sabemos, não é exatamente pequena. E metade do mundo jornalístico fica em polvorosa, discutindo a questão dos preservativos", lamenta o escritor.
Nem perguntas, nem respostas censuradas
No entanto, Peter Seewald carrega considerável parte da culpa. Pois ele é quem fez essa e outras perguntas ao papa. O autor teve um raro privilégio: seis horas de entrevistas com Bento 16. Tanto perguntas como respostas não foram censuradas.
"Não sou um escrivão do Vaticano. Eu tentei fazer as perguntas que interessam ao público de hoje e àqueles que querem ou precisam saber das respostas", garante Seewald.
Pela conversa de Seewald com Bento 16, podemos ficar sabendo quais são suas opiniões e, sobretudo, o que passa na cabeça do Sumo Pontífice durante ocasiões como, por exemplo, a grave crise na Igreja causada pelo escândalo de abusos sexuais. "O senhor chegou a pensar em renúncia?” quis saber Seewald. "Não", respondeu o papa. "Quando o rebanho está em perigo, o pastor jamais deixa as ovelhas sozinhas", acrescentou.
Mas, em geral, a opinião de Bento 16 é que "quando um papa não consegue mais cumprir fisicamente, mas também mental ou espiritualmente os encargos de sua missão, ele pode e deve renunciar”. Nem mesmo o especialista em Vaticano Sandro Magister conseguiu jamais ouvir da boca de um papa tal afirmação.
“Também aqui o papa quebra um tabu. Os papas dos últimos cem anos chegaram a pensar em renúncia, mas nunca falaram publicamente sobre o assunto", afirma Magister.
Joseph Ratzinger fala de forma relativamente franca sobre suas crises e decepções. Referindo-se à crítica dos alemães sobre o caso Williamson, o líder religioso afirma que na Alemanha católica existem pessoas que "esperam pela oportunidade para poder atacar o papa". No caso em questão, o papa revogou a excomunhão do bispo inglês que negara o Holocausto, causando um escândalo internacional.
O ser e o fazer
"Eu vejo há muitos anos uma enorme discrepância entre o que o papa é e aquilo que ele diz e faz, e como isso se reflete em várias mídias. Isso acontece especialmente na Alemanha", afirma Seewald.
E assim, Seewald e seu interlocutor, Bento 16, conseguem surpreender o leitor em diversos momentos. Acima de tudo, por afirmações como aquela em que o papa admite aprovar o uso de preservativos quando se trata de reduzir o risco de infecção pelo vírus HIV.
Para o arcebispo Rino Fisichella, presidente do Pontifício Conselho para a Promoção da Nova Evangelização (que objetiva o reavivamento da fé cristã em sociedades tradicionais), a afirmação é inicialmente apenas uma opinião do papa.
"Mesmo este livro não é um ato doutrinal", afirma, ressaltando que, segundo o catecismo católico, a sexualidade está ligada à proliferação da vida. "As várias formas de contracepção são em si um mal, porque impedem aquilo que é próprio da sexualidade, viver e desenvolver-se no amor da vida matrimonial."
Autor: Tilmann Kleinjung (md)
Revisão: Carlos Albuquerque