Livro
31 de outubro de 2009Foram poucos os livros que desencadearam em Israel controvérsias tão intensas quanto Derrotando Hitler, de Avraham Burg. Lançado no país há três anos, o volume gerou uma série de debates públicos, que culminaram até mesmo em ameaças de morte contra o autor.
"Parto do princípio de que isso aconteceu por duas razões. Primeiro, por causa da mensagem, que se distancia de todo padrão israelense, de todos os clichês que continuam girando em torno da existência do país, do Holocausto, da culpa etc. E em segundo lugar, pelo autor desta mensagem. As pessoas me perguntavam: O quê? Você? Essa mistura transformou o debate em algo muito pessoal e incisivo", diz Burg.
Pós-sionista
A "mensagem", no caso, é a tese do autor de que Israel é um país obcecado, que se comporta como uma pessoa gravemente traumatizada. O remetente desta mensagem, Avraham Burg, pertence à elite israelense, tendo sido deputado do Partido Trabalhista, presidente do Knesset e diretor da Agência Judaica. Ou seja, não se esperava que justamente ele tomasse, de súbito, uma posição crítica em relação ao país, à ideologia estatal reinante, ao sionismo.
"Se o sionismo for o que os colonos israelenses fazem nos territórios, o que Lieberman faz na política e o que os rabinos pregam nas sinagogas, com suas palavras de ordem religiosas, então sou antissionista", afirma Burg.
No entanto, o escritor se autodefiniria principalmente como um "pós-sionista". Considerando que o objetivo e a meta do sionismo tenham sido construir um Estado judeu, uma terra para o povo judeu, de onde este pudesse se proteger de perseguições, então isso já aconteceu com a criação de Israel, pondera o autor. "Por isso, me defino assim: sou um ser humano, este é meu sobrenome, sou judeu, este é meu prenome e sou israelense. De mais definições não preciso", avisa Burg.
Abuso da memória
Seu livro, lançado agora na Alemanha pela editora Campus-Verlag, acusa a sociedade israelense de ter transformado o Holocausto no cerne de sua existência, apontando que políticos israelenses teriam abusado da memória do extermínio cometido contra os judeus, para reivindicar direitos especiais para o país, bem como para ignorar as normas do Direito Internacional.
Ao mesmo tempo, afirma Burg, Israel seria um país obcecado pela ideia de que todo o mundo é anti-israelense ou até antissemita. "Um dos comentários mais burros que se ouve em Israel é o de que o mundo inteiro está contra nós. Essa é uma ideia completamente vazia, pois o mundo todo está do nosso lado. Permitem que façamos coisas que não seriam consentidas a nenhuma outra nação do mundo, inclusive uma ocupação de 40 anos. Isso é terrível, repugnante e horrendo. Nos permitem fazê-lo e nos aproveitamos bem disso", sentencia o autor.
Estrangeiro, mas familiar
O livro de Burg, contudo, não é apenas um embate com a política e a sociedade israelenses, mas também um enfrentamento com seu pai, Josef Burg, natural da Alemanha, ex-ministro e ex-deputado do Partido Nacional Religioso em Israel.
Suas raízes alemãs, diz o escritor, que é pai de seis filhos, são muito importantes, de forma que a tradução para o alemão sempre foi algo considerado de extrema importância por ele.
"Estive com muita frequência na Alemanha, muitas vezes em Berlim. Gostaria de passar um ano por aqui, para conhecer melhor. Tenho interesse, mas não planos concretos. Ainda falta um patrocinador", brinca Burg ao lembrar que, no ano passado, participou junto com sua filha e genro de uma maratona na cidade. "Me sinto num país estrangeiro, mas familiar", explica o escritor.
Autora: Bettina Marx (sv)
Revisão: Carlos Albuquerque