Equação difícil
1 de janeiro de 2010As dispendiosas medidas para salvar bancos da falência, os pacotes conjunturais bilionários e os altos custos acarretados pela redução de jornadas de trabalho praticamente multiplicaram por seis o déficit público alemão. E economistas preveem que o rombo orçamentário crescerá ainda mais em 2010.
Até 30 de setembro último, a União, os estados, os municípios e o sistema de previdência social haviam gastado 96,9 bilhões de euros além do que arrecadaram. Um ano antes, o valor estava em 17,2 bilhões de euros, segundo números divulgados esta semana pelo Departamento Federal de Estatísticas (Destatis) da Alemanha.
Limite constitucional
Em 2008 foi aprovada uma alteração constitucional – válida a partir de 2011 – que determina que o Estado alemão deve cobrir suas despesas exclusivamente com as receitas – ou seja, não pode contrair dívidas.
"Temos no atual orçamento um déficit estrutural de cerca de 70 bilhões de euros e, a partir de 2011, temos de reduzi-lo em taxas anuais iguais. É o que está na Lei Fundamental. São 10 bilhões de euros por ano. Isso será excepcionalmente difícil e não será possível apenas com as tradicionais medidas orçamentárias. Nenhum dos envolvidos tem a menor dúvida disso", afirmou o ministro das Finanças, Wolfgang Schäuble.
Ele pretende apresentar propostas concretas de contenção de despesas apenas em julho, depois da divulgação, em maio, da primeira previsão de arrecadação tributária. A data também leva em conta as eleições no estado da Renânia do Norte-Vestfália, um dos mais populosos e importantes do ponto de vista econômico. O objetivo é evitar que o tema domine a campanha eleitoral.
Corte de impostos afeta estados
Mas o debate sobre as possibilidades de contenção de despesas já começou, insuflado pela oposição. Ela critica o governo dos democrata-cristãos e liberais por implementar, a partir de janeiro, um pacote de medidas para cortar impostos apesar da crítica situação orçamentária.
As medidas também atingem os estados, que recentemente se comprometeram a elevar seus gastos com educação em 57 bilhões de euros, alcançando 282 bilhões de euros.
"Isso não é nem mesmo a quadratura do círculo, é simplesmente impossível alcançar estes resultados díspares: não elevar as dívidas, investir volumes financeiros enormes em educação e ao mesmo tempo reduzir dessa forma drástica e permanente o nível de arrecadação das instâncias estaduais e municipais", afirmou o governador da Renânia-Palatinado, Kurt Beck, do partido de oposição SPD (Partido Social-Democrata).
Temor de cortes no âmbito social
Uma arrecadação menor significa gastos menores, o que quer dizer que, a partir de 2011, as verbas públicas terão de ser reduzidas drasticamente. Resta saber onde.
Muito espaço para manobras não há. Três quartos do orçamento estão praticamente comprometidos com complementos aos aposentados, auxílios ao mercado de trabalho, juros, gastos com pessoal e repasses da União, por exemplo, aos estados.
Apenas a área de trabalho e assuntos sociais responde por 45% de todas as despesas, que em 2010 deverão chegar a 325,4 bilhões de euros. Em segundo lugar estão os custos da dívida pública, que soma cerca de 1 trilhão de euros e acarreta juros anuais de 40 bilhões de euros.
Os partidos SPD e A Esquerda temem que o governo faça cortes principalmente no âmbito social. Isso não deveria acontecer de forma alguma, reivindica o secretário-geral de A Esquerda, Dietmar Bartsch.
"Queremos um imposto para os milionários. Os que lucraram com a crise devem ser convocados a pagar. Queremos elevar a alíquota mais alta do imposto de renda para trazer mais dinheiro aos cofres públicos. Queremos uma reforma séria do imposto sobre herança e não medidas para favorecer grandes herdeiros, como acontece hoje. E o anúncio da senhora Merkel de criar um imposto sobre aplicações financeiras não deve ficar na promessa", afirmou Bartsch.
Liberais querem cada vez menos impostos
Já o Partido Liberal Democrático (FDP) defende o contrário. O parceiro de coalizão da União Democrata Cristã (CDU) e da União Social Cristã (CSU) planeja aliviar os contribuintes em mais 20 bilhões de euros a partir de 2011 e quer introduzir o sistema de alíquotas fixas por faixas de renda.
Os parceiros de coalizão veem a proposta com ceticismo, mas o liberal Otto Fricke, especialista em finanças, garante que as medidas impulsionarão a economia alemã.
"Não podemos apenas confiar no crescimento econômico, mas sem ele nada será possível. E nessa questão do crescimento priorizamos o cidadão, o empresário e, assim, o mercado, sem que o Estado determine como se dará o crescimento. Pois o passado já mostrou que isso não funciona", declarou Fricke.
Ou seja, 2010 trará principalmente um debate sobre dinheiro, sobre onde é possível economizar, sobre como o Estado pode elevar sua arrecadação. Um debate que depende de como a crise se comportará neste ano. Se ela continuar, os atuais planos orçamentários logo estarão ultrapassados.
Autora: Sabine Kinkartz (as)
Revisão: Simone Lopes