Etanol: prós e contras
22 de março de 2007O Brasil é o segundo maior produtor de etanol do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos, e pretende cobrir pelo menos 2% de sua demanda de combustíveis com biodiesel a partir de 2008. O boom dos biocombustíveis transforma os usineiros em "novos xeiques", mas implica também riscos, como explica o professor de Economia Política da América Latina na Universidade Livre de Berlim, Manfred Nitsch.
DW-WORLD: Quão sustentável é a produção do etanol no Brasil? Qual é o balanço ambiental desse processo?
Manfred Nitsch: O balanço energético do etanol de cana-de-açúcar é muito positivo. Graças ao sol, tira-se de quatro a oito vezes mais energia do que se injeta no processo de produção. O problema do etanol é que a energia na forma de açúcar sempre é mais cara e valiosa como alimento humano do que como intragável combustível. Somente com muitos subsídios é possível estimular os usineiros a produzir etanol em vez de açúcar. Em princípio, isso vale também para os óleos vegetais.
Desde que a União Européia decidiu não mais comprar açúcar por 600 euros a tonelada para revendê-lo no mercado mundial a 200 euros a tonelada, o preço do açúcar dobrou. Já o balanço sócio-econômico e ambiental do etanol, de um modo geral, não é bom, mas também não é catastrófico.
Como é esse balanço para os biocombustíveis produzidos na Europa?
No caso da colza, do milho e de outras biomassas plantadas no hemisfério norte, o balanço energético, na maioria das vezes, é de 1 por 1. Isto significa que se gasta na produção do biocombustível, desde a fabricação do adubo químico usado no campo até o processamento da biomassa, tanta energia quanto sai em forma aprimorada no final. Lembre-se que no caso do açúcar essa relação é de 4/1 até 8/1. Portanto, em termos de balanço energético, pode-se argumentar contra a colza, o milho, o trigo etc, mas não contra a cana-de-açúcar.
Fora a vantagem energética, quais os prós e contras do etanol brasileiro?
Os principais argumentos a favor do etanol são a promessa de criação de empregos, menos emissões de CO2 do que com gasolina, a economia de divisas, a liderança mundial brasileira nas tecnologias de biocombustíveis e o uso de menos de 2% da área cultivável do país para produzir 16 bilhões de litros em 2006.
Os contras são as condições precárias de trabalho e remuneração dos cortadores, as queimadas durante a colheita da cana, o uso maciço de adubos e pesticidas e os altos subsídios, créditos baratos e vantagens fiscais, que chegam a 1,5 bilhão de dólares por ano, além da aposta em commodities tradicionais e tecnologias pouco demandadas em outros países. Além disso, há o risco de acirramento dos conflitos de terra e de um cerco à agricultura alimentar e às reservas naturais.
Há freqüentes denúncias sobre trabalho escravo nos canaviais. As empresas realmente precisam explorar seus funcionários para serem competitivas?
Como se trata de um trabalho duro, puramente braçal, sempre existe a ameaça de sua substituição pela máquina. Nenhuma manifestação contra a demissão de funcionários vai mudar a antiga lei que leva o progresso técnico a substituir a mão-de-obra. Essa pressão da mecanização é um trunfo na mão das empresas, mas ela também abre a chance de financiar um grande número de desempregados.
Quais são as vantagens e as desvantagens que o senhor vê no programa brasileiro do biodiesel?
Entre as vantagens vejo, também aqui, a redução das emissões de CO2 e das importações de óleos, a facilidade de mistura com o diesel mineral, a geração de novos postos de trabalho e, como a matéria-prima é cultivável nas diferentes partes do país, não necessita de uma infra-estrutura especial de abastecimento.
Uma das desvantagens é, em regra, o maior consumo de energia no processamento do biodiesel do que no de diesel convencional – o balanço energético costuma ser apenas levemente positivo. Também aqui há a necessidade de subsídios, além de existir o risco da contaminação do solo e dos lençóis freáticos através de adubos e pesticidas.
Quais são os cenários que o senhor traça para o futuro dos biocombustíveis no Brasil?
O pior cenário seria a concessão maciça de subsídios à produção do etanol como combustível para as classes média e alta, que têm condições de andar de carro ou de avião; enormes subsídios ao biodiesel, dando a entender que é possível mover a atual civilização do automóvel e do avião com biocombustíveis; a destruição do Pantanal e da Amazônia; e as poucas chances de exportação devido ao protecionismo dos parceiros comerciais, como os EUA e a União Européia.
Um cenário favorável aos biocombustíveis teria os seguintes aspectos: alta taxação da gasolina, do diesel e do querosene, para que os biocombustíveis, com um pequeno alívio fiscal, sejam competitivos; forçar a pesquisa nacional e internacional sobre a mobilidade baseada no reaproveitamento do lixo, por exemplo, para produzir biogás; desenvolver tecnologias BTL (Biomass-to-Liquid) e baterias para motores elétricos; certificação nacional e internacional de biocombustíveis produzidos de forma sustentável; um lucrativo comércio internacional com esses produtos; e a proteção conseqüente da Amazônia e das áreas inundáveis do Pantanal.