Progresso ou democracia?
19 de fevereiro de 2008Segundo o Índice de Transformação da Fundação Bertelsmann de 2008, divulgado no último domingo (17/02) em Berlim, 4 bilhões de habitantes do planeta vivem em democracias. Autocracias e ditaduras englobam 2,5 bilhões de pessoas.
O índice pesquisou 125 países com mais de 2 milhões de habitantes que ainda não atingiram o completo status de democracias baseadas em economia de mercado. O Índice de Transformação (BTI) é divido em dois: um que aponta o desenvolvimento democrático destes países, outro que mede sua transformação gerencial.
Dos 49 países com maior crescimento econômico, nos últimos dois anos, somente 34 são considerados democracias. Pelo índice, Brasil e Argentina são consideradas democracias com defeitos; Colômbia e Venezuela, democracias com muitos defeitos; Chile e Uruguai, democracias.
O BTI de 2008 mostra que 14 países se consolidaram como democracias avançadas. Entre eles, três latino-americanos: Chile, Uruguai e Costa Rica. Por outro lado, o índice aponta Venezuela e Bolívia entre os países que mais desceram no ranking de transformação gerencial.
Democracia praticamente indestrutível
Segundo o estudo, uma série de países do mundo se desenvolve na direção de ditaduras e autocracias. Embora 75 dos 125 países em transformação pesquisados sejam considerados, oficialmente, democracias.
Destes, 52 são democracias defeituosas ou muito defeituosas. Entre estas nações, encontram-se Rússia e Venezuela. A China, por sua vez, é classificada como autocrática.
"Por que a democracia floresce em algumas nações, mas morre em outros?", pergunta o professor de História da Universidade de Harvard, Niall Ferguson, em artigo publicado no jornal Die Welt. As respostas mais fáceis, explica ele, se encontram na Economia.
Num país com renda per capita anual abaixo dos mil dólares, um governo democrático não permanece uma década, explica o professor em alusão às teorias do cientista político Adam Przeworki. Se a renda média anual atinge os 6 mil dólares, a democracia é praticamente indestrutível.
Rússia ultrapassou o Brasil
No entanto, o recente desenvolvimento econômico mundial tem posto esta teoria em questão. A democracia, segundo Ferguson, pouco lucrou do imenso boom que a economia mundial experimentou nos últimos sete anos. Enquanto a autocrática China aumentou em 2,5% sua participação no Produto Interno Bruto mundial, entre 2001 e 2007, a democrática Índia conseguiu elevá-la somente em 0,6%.
Na mesma proporção, a Rússia ultrapassou o Brasil, explica. Ferguson afirma que a discrepância econômica entre democracia e autocracia só tende a aumentar. Segundo o grupo de investimentos Goldman Sachs, até 2050, a participação da China no PIB mundial aumentará de 4% para 15%, enquanto a dos países do G7 diminuirá de 57% para 20%.
A era em que o capitalismo se aproveitava da democracia parece chegar ao fim. Em recente artigo no Los Angeles Times, Madeleine Albright, ex-secretária de Estado norte-americana, declarou: "Por certo tempo, a democracia parecia inevitável. Isto acabou. O mundo se encontra perante uma nova divisão ideológica, não entre comunismo e capitalismo, mas entre democracia e autocracia".
China, Rússia e Venezuela
Abordando o tema, o jornal econômico Financial Times Deutschland (FTD) publicou, na semana passada, editorial intitulado Os impérios contra-atracam. O jornal afirma que a crença de que o sucesso econômico sem liberdade política não é duradouro é colocada em questão não somente por Albright.
A China se gaba de seu crescimento econômico e, teimosa, continua com seu sistema de partido único. Nadando em divisas oriundas dos altos preços mundiais de petróleo e gás natural, a Rússia criou o princípio da "democracia dirigida", o que significaria "nenhuma democracia", explica o FTD.
O mesmo acontece com a Venezuela, que também nada em petrodólares. Segundo a avaliação da ONG americana Human Rights Wacht, o país ainda não é uma ditadura, ainda existiria uma acirrada disputa política, mas "há tendências negativas".
Nova ordem mundial
Os programas sociais de Chávez são apoiados pela petrolífera estatal PDVSA. Os 40 bilhões de dólares pagos pela empresa em impostos e taxas, em 2006, são responsáveis por metade de orçamento do Estado, comenta o FTD.
Isto implica, no entanto, que a empresa não disponha de meios para investir em novas prospecções. Segundo a Opep, há anos que as exportações da PDVSA são decrescentes. O aumento da receita proveio, somente, do acréscimo no preço mundial dos combustíveis.
Perante tais constatações, o mundo ocidental não escapará da pergunta de quanto tempo durará o sucesso econômico de países com tendências autocratas, como também qual será sua influência na nova ordem mundial. Citando o conselheiro presidencial russo Andrei Illarionov, o FTD afirma que "a estabilidade de um sistema se apresenta durante a crise. E, algum dia, ela virá ".