Crise financeira
19 de agosto de 2010O maior sucesso do pacote de salvação das economias europeias é que até agora ele não precisou ser acionado. A mera existência de uma garantia de ajuda para os Estados europeus com problemas parece ter tranquilizado os mercados financeiros. Exceto a Grécia, todos os países conseguiram refinanciar suas dívidas públicas.
O economista alemão Klaus Regling, diretor da Facilidade Europeia de Estabilidade Financeira (FESF), sociedade limitada de caráter temporário que administra o fundo de resgate europeu, mostrou-se otimista: "No momento, é improvável que seja usada qualquer quantia em dinheiro", disse.
Os ministros das Finanças, chefes dos bancos centrais e chefes de Estado e governo dos 16 países da zona do euro costuraram o pacote de crédito gigante em reuniões tensas no segundo fim de semana de maio, juntamente com o Fundo Monetário Internacional (FMI).
Ao todo, 750 bilhões de euros foram colocados à disposição para o salvamento de países da zona do euro em dificuldades financeiras. Cerca de 60 bilhões vêm dos atuais orçamentos da Comissão Europeia, 440 bilhões foram prometidos pelos Estados que adotam o euro e 250 bilhões são originados do FMI, que tem participação forte dos países europeus. Na ocasião, a chanceler alemã, Angela Merkel, classificou a medida de "o maior desafio para a União Europeia até agora"
A FESF não conseguiu pagar os 440 bilhões de euros dos países do euro, mas somente 366 bilhões. As grandes agências de rating exigem, entretanto, que os créditos sejam excessivamente cobertos em 120%, o que significa que para um pagamento de 100 euros seja apresentada uma garantia de 120 euros, a fim de amortecer o risco de perda.
Investidores tranquilos, por enquanto
"O cálculo dos governos europeus deu certo", afirmou o economista-chefe do Commerzbank, Jörg Krämer. Os investidores puderam ser tranquilizados com as somas gigantescas. Os Estados da zona do euro lançaram planos de austeridade. E o crescimento econômico retorna à região, com exceção da Grécia.
O euro pôde ser salvo, pelo menos até agora. Diplomatas do bloco próximos ao comissário europeu de Assuntos Econômicos e Monetários, Olli Rehn, alertam, entretanto, que o pacote de salvamento serviu somente para ganhar tempo. As promessas de crédito expiram em três anos e até lá a zona do euro terá que ser saneada e reformada radicalmente.
Decisões difíceis, como, por exemplo, sobre o controle e saneamento futuros do déficit e dos orçamentos dos países europeus, foram adiadas por alguns meses. Um grupo de trabalho de ministros das Finanças, sob liderança do presidente do Conselho da UE, Herman Van Rompuy, deverá preparar sugestões.
A Alemanha é a favor de um direito de insolvência para Estados, enquanto a França deseja um governo econômico central, que também possa controlar o Banco Central Europeu. Não existe ainda, contudo, um consenso sobre essas propostas.
"A crise ainda não foi superada", alerta o economista Rolf Schneider, especializado em conjuntura no grupo alemão de seguros Allianz. Ele afirma ter sido decisivo os países terem evitado novos endividamentos e diz que o ano de 2011 será especialmente crítico.
Com o plano de salvamento, a União Europeia abriu, mão no começo de maio último, de um de seus princípios básicos. A regra contida no Tratado da UE de que um país não pode se responsabilizar pelas dívidas de um outro foi suspensa. O Banco Central Europeu (BCE) está comprando bônus da dívida pública de Estados europeus, coisa que sempre recusara a fazer. O BCE seguiu instruções políticas dos chefes de Estado e governo e prejudicou sua reputação de instituição absolutamente independente.
Para administrar o plano de salvamento, os países do euro criaram a FESF, uma espécie de pequeno banco que, caso necessário, recolheria dinheiro dos países do bloco e encaminharia a quantia para os Estados endividados.
Cada país que pede ajuda deve se submeter a diretrizes severas e aceitar um controle político-orçamentário de fora. Em contrapartida, recebe créditos bilionários a juros mais baixos do que os do mercado financeiros. Cada injeção de capital tem que ser autorizada, caso a caso, pelos países da zona do euro e pelo FMI. Os países em dificuldades podem também pedir ajuda para salvar seus próprios bancos nacionais.
A crise foi somente adiada?
Apesar do crescimento econômico ter retornado à Europa, o presidente do Instituto de Pesquisa Econômica da Renânia-Vestfália, Christoph Schmidt, alerta contra um excesso de otimismo. "Não descarto reviravoltas", afirma. Segundo ele, os Estados estão sobrecarregados, devido a programas de ajuda à conjuntura e pacotes de salvamento para os bancos, e uma nova crise pode estar a caminho, mesmo que a Europa esteja agora passando por um período de calmaria. "As dívidas dos EUA, Japão e Reino Unido são hoje altas e preocupantes", diz Schmidt.
A Grécia é um caso especial na zona do euro. A União Europeia criou para o país, juntamente com o FMI, um pacote próprio de salvamento. Atenas recebeu até agora 20 bilhões dos 110 bilhões de euros em créditos disponíveis até 2013 para garantir sua solvência financeira.
O drástico programa de austeridade aplicado pelo governo grego faz com que o país permaneça em recessão, segundo analistas. O desemprego aumenta, a arrecadação de impostos diminui. Por outro lado, a Grécia e outros países em dificuldades, como Espanha e Portugal, conseguiram obter em julho uma nova injeção de capitais em seus mercados financeiros.
Um membro retira seu apoio
Na última semana, a Eslováquia revogou sua solidariedade com a Grécia, rejeitando uma participação na operação de salvamento do país mediterrâneo. Essa mesma Eslováquia, o mais novo membro da zona do euro, aceitou, entretanto, o pacote de salvamento para todos os países da zona do euro.
Se as coisas forem tomadas ao pé da letra, o fundo de salvamento do euro não existe somente há pouco mais de três meses, desde que acertado pelos chefes de Estado e governo em maio, e sim somente há 12 dias. Pois foi somente no útlimo 6 de agosto que os Estados do euro forneceram todas as assinaturas necessárias para a criação da FESF, em Luxemburgo. Agora, o diretor da sociedade, Klaus Regling, aguarda por seus primeiros "clientes", que, se tudo der certo, jamais chegarão.
Autor: Bernd Riegert (md)
Revisão: Soraia Vilela