Governo do Rio recua e decide restaurar prédio do antigo Museu do Índio
29 de janeiro de 2013O Governo do Estado do Rio de Janeiro decidiu voltar atrás e não vai mais demolir o prédio do antigo Museu do Índio, nos arredores do Estádio do Maracanã. Em meio à enorme polêmica e uma arrastada batalha judicial com um grupo de índios que ocupa o casarão abandonado, o governador Sérgio Cabral Filho anunciou o tombamento e a restauração do imóvel, construído em meados do século 19. A ideia original era destruir o edifício e transformar o terreno de 1.600 metros quadrados em uma área de circulação para facilitar a chegada e saída do público durante a Copa do Mundo do Brasil, em 2014.
Em nota oficial, Cabral afirma que "ouviu as considerações da sociedade a respeito do prédio histórico, analisou estudos de dispersão do estádio e concluiu que é possível manter o prédio no local". O documento afirma ainda que os índios da chamada Aldeia Maracanã – que ocupam o imóvel desde 2006 – serão despejados, e a destinação do prédio será discutida entre o Governo do Estado e a Prefeitura do Rio de Janeiro.
A restauração será financiada pelo consórcio vencedor da licitação do Complexo do Maracanã, cujo edital sairá no mês que vem. De acordo com a Secretaria do Estado de Assistência Social e Direitos Humanos, os índios terão a opção de retornar às suas aldeias com despesas pagas ou buscar abrigo em equipamentos estatais e receber uma ajuda de custo.
O anúncio foi classificado pelos índios como uma pequena vitória, mas a decisão de expulsá-los do prédio e a hesitação do governo em confirmar a transformação do endereço num centro cultural indígena gerou insatisfação entre os integrantes da Aldeia Maracanã, que reúne cerca de 50 índios de dez etnias diferentes. A Defensoria Pública da União quer ainda que o tombamento seja oficializado pelo Instituto do Patrimôno Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e não apenas pelo Governo do Estado. "Tem vários pontos que não estão claros. Queremos saber o que acontecerá com o prédio depois da reforma", afirmou Carlos Tukano, um dos líderes do grupo. "Vamos pedir uma audiência com o governador para discutir soluções".
Pressão de todos os lados
O recuo do governo foi anunciado após o projeto de demolição do antigo Museu do Índio receber críticas sucessivas nos últimos dias. Na quinta-feira, a Ministra da Cultura, Marta Suplicy, ligou para o governador em exercício, Luiz Fernando Pezão, para fazer um apelo pela preservação do edifício. "Espero que prevaleçam o interesse na preservação do patrimônio material e imaterial e a sensibilidade do Governo do Estado do Rio. O Brasil é um país que respeita e valoriza a diversidade", afirmou publicamente. No sábado, uma liminar do Tribunal de Justiça, expedida às vésperas do fim do prazo dado pela Procuradoria Geral do Estado para desocupar o casarão, voltou a impedir a demolição do prédio.
Desde o início do imbróglio judicial, em outubro passado, órgãos técnicos como o Iphan e o Inepac (Instituto Estadual do Patrimônio Cultural), além da própria Fifa, organizadora da Copa do Mundo, já haviam manifestado repúdio à decisão do governador do Rio, que à época minimizou a importância histórica do local.
Aglomeração popular
Com a controvérsia sobre o destino do prédio, a Aldeia Maracanã passou a ser ponto de peregrinação nos últimos meses para militantes e movimentos sociais. As visitas de índios de outras regiões do país, como Bahia e Maranhão, também aumentaram: estima-se que hoje o endereço abrigue cerca de 150 pessoas. No último dia 12 houve tensão em torno do local: cerca de 30 policiais militares do Batalhão de Choque rodearam o edifício à espera de uma ordem judicial para retirar os índios. Sem amparo legal, o cerco foi desmontado doze horas depois.
Construído em estilo eclético em 1862, o prédio foi a sede do Serviço de Proteção ao Índio – primeira instituição do tipo no país – no início do século 20 e abrigou o Museu do Índio entre 1953 e 1978. Abandonado desde então, o casarão foi invadido em outubro de 2006 por índigenas, que hoje se espalham em barracas de camping por todo o primeiro andar, cercados por poças d'água, acumuladas durante as chuvas de verão. No local, faltam janelas e há buracos no teto. Rebocos e ripas de madeira também ameaçam despencar. Em meio às dúvidas sobre seu destino, os integrantes da Aldeia Maracanã sobrevivem basicamente de doações, da venda de artesanato e do sonho de ver o local recuperado e transformado num centro cultural.