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Hong Kong: a busca do consenso mínimo

Karl Zawadzky (lk)11 de dezembro de 2005

Evitar o fracasso completo da rodada de Doha, que tem por meta a liberalização do comércio mundial, já seria um sucesso, opina o comentarista da Deutsche Welle Karl Zawadzky.

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As negociações nas conferências da Organização Mundial do Comércio (OMC) são sempre árduas. Afinal, o comércio internacional não é uma atividade caritativa, e sim organizado segundo o princípio do proveito próprio, na melhor da hipóteses do proveito para ambas as partes. Além disso, estão em jogo muito dinheiro, postos de trabalho e poderio econômico. Não é de se admirar que haja disputas.

Nunca, porém, as posições estiveram tão estanques antes de uma conferência de ministros como agora, antes do encontro que se realiza em Hong Kong de 13 a 18 de dezembro. O pior é que as linhas divisórias das frentes não transcorrem entre os grandes grupos – nações industrializadas aqui, países em desenvolvimento acolá. Dentro de cada um desses grupos, abriram-se fossos consideráveis.

Países mais pobres, os perdedores

Os países mais pobres, por exemplo, seriam os perdedores, se houvesse uma abertura do mercado agrário na Europa. É que os países mais pobres já têm acesso totalmente livre ao mercado europeu e lucram com os altos preços que lhes são garantidos pela União Européia. Quando venceu o acordo internacional sobre a indústria têxtil, eles já passaram pela experiência de ver a China abocanhar num curto expaço de tempo fatias consideráveis do mercado.

Se o mercado europeu do acúçar for aberto agora, quem mais vai lucrar com isso é o Brasil; os países mais pobres serão os perdedores, ao lado dos agricultores que cultivam na Europa a beterraba do açúcar.

No caso de outros produtos agrários, os Estados Unidos, a Austrália, o Canadá, a Argentina e a Nova Zelândia seriam muito mais favorecidos pelo fim das barreiras comerciais do que os países em desenvolvimento.

Não existe um consenso nem mesmo dentro da União Européia. A França e alguns dos países que ingressaram na União Européia em maio de 2004 resistem com todas as forças à redução dos subsídios europeus à agricultura, enquanto outros países do bloco aceitariam prejudicar em parte a agricultura, se pudessem em compensação exportar mais facilmente produtos industriais e serviços.

Alto preço do fracasso

BdT, Bauernprotest in Hong Kong, im Vorfeld des WTO-Treffens
Protestos antiglobalização organizados pela ONG Oxfam em Hong Kong antes do início da conferênciaFoto: AP

Diante desse pano de fundo de interesses divergentes, o fracasso da conferência da OMC é mais provável que seu sucesso. E o preço do fracasso é alto. Ele significa que as rendas mundiais deixarão de crescer 300 bilhões de dólares por ano, como calculou o Banco Mundial para o caso de o comércio mundial ser completamente liberalizado. Dessa quantia, cerca de 45% reverteria em benefício dos países em desenvolvimento.

O problema é que a distribuição das rendas é extremamente desigual e que isso não mudaria se as rendas se multiplicassem. Os perdedores não têm interesse nenhum em que os países ricos e os ricos nos países pobres enriqueçam mais ainda.

Só existe uma possibilidade de que a atual rodada seja bem-sucedida: que todos os participantes se lembrem da promessa feita em Doha de que esta rodada seria em prol do desenvolvimento. Isso significa não apenas que as vantagens revertam em maiores proporções em favor dos países em desenvolvimento. Mas, também, que os lucros sejam distribuídos nesses países da maneira mais justa possível.

Precondição para que isso aconteça é, de fato, que europeus e norte-amercianos abram mão de seu protecionismo. Há de se admitir que a Comissão Européia apresentou nesse ponto uma proposta negociável.

Em contrapartida, os países industrializados esperam uma redução das taxas de importação sobre os produtos de sua indústria, uma simplificação dos procedimentos alfandegários e uma abertura dos mercados internacionais para serviços.

O mínimo é alguma coisa

Neste ponto, a OMC é o pregão onde não se cambiam apenas mercadorias, como também se simplificam, na base do toma-lá-dá-cá, as condições básicas do comércio – de forma que todos lucrem tanto quanto possível.

Após o fracasso das conferências anteriores, em Seattle e Cancún, cresce a pressão para que a OMC tenha sucesso. É lógico que, em caso de um novo malogro, diminuiria o interesse dos pesos pesados do comércio mundial em soluções multilaterais, aumentando o número de acordos bilaterais de livre-comércio.

Uma característica dos acordos bilaterais é que geralmente o parceiro mais forte lucra mais, enquanto nos pactos multilaterais os interesses dos fracos também são levados em consideração.

Se as negociações em Hong Kong não forem bem-sucedidas, os maiores perdedores serão os países em desenvolvimento. Se os participantes conseguirem pelo menos evitar o malogro completo da rodada de Doha e agendar para o próximo ano a continuação das negociações, isso já seria um sucesso.