Imprensa europeia destaca crise entre poderes no Brasil
9 de dezembro de 2016A imprensa europeia deu destaque ao Brasil numa semana em que o país assistiu a mais um capítulo da guerra entre os poderes Judiciário e Legislativo no embate sobre a saída ou não de Renan Calheiros da presidência do Senado. A votação da chamada PEC do teto dos gastos e o projeto de lei anticorrupção, que pune casos de abuso de autoridade de juízes e membros do Ministério Público, também foram destacados.
O Le Monde, num artigo de opinião escrito por três autores e intitulado Brasil: o grande salto para trás, escreve que, depois da destituição da ex-presidente Dilma Rousseff, o governo do presidente Michel Temer conduz uma política que mistura conservadorismo, autoritarismo e corrupção. O periódico afirma que, enquanto os senadores votavam a chamada PEC do teto de gastos, uma manifestação de estudantes na Esplanada dos Ministérios era violentamente reprimida pela polícia militar.
Além disso, o periódico afirma que, no mesmo momento, os deputados federais aprovaram uma série de dez medidas anticorrupção "esvaziadas de sua substância" e vistas como uma maneira de se proteger dos inquéritos relacionados ao caso de corrupção na Petrobras e para contra-atacar um Judiciário "pronto a teatralizar sua ação, a ultrapassar suas prerrogativas e a abalar o equilíbrio entre os poderes".
Em matéria intitulada No pântano da corrupção, o jornal alemão Tageszeitung (TAZ) escreveu que um confronto entre Congresso e Justiça desafiou o governo brasileiro e que, com a permanência de Renan Calheiros na presidência do Senado, "o presidente Michel Temer pode respirar aliviado".
O periódico diz que, se Calheiros fosse retirado do poder, o senador petista Jorge Viana iria se tornar presidente da casa – o que seria "um cenário dos horrores para Temer", que era vice no governo de Dilma e que, "desde meados deste ano, participou de forma bem-sucedida de intrigas para forçar a destituição da política de seu cargo de presidente".
A publicação afirma, ainda, que em meio a um aumento do desemprego e uma crise econômica sem fim, aumentam os protestos contra a mudança de rumo político de viés liberal de direita adotada por Temer. "Mas nas ruas o tema corrupção domina: dezenas de milhares protestaram no último domingo contra políticos corruptos e a diluição de uma lei anticorrupção no Congresso".
O periódico britânico The Guardian afirma que, apesar da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) favorável a Calheiros, ele provavelmente terá em breve dificuldades com a mais alta corte do Brasil, já que aguarda o julgamento por acusações de corrupção em um dos 12 processos contra ele. A publicação lembra que perder Calheiros como presidente do Senado seria um duro golpe para Temer, que está tentando aprovar no Congresso uma série de medidas de austeridade neste mês.
O jornal britânico Financial Times (FT) diz que os congressistas brasileiros usaram a distração da população com a tragédia envolvendo a equipe da Chapecoense para aprovar "medidas draconianas" que permitiriam processar promotores e juízes por abuso de poder. O periódico afirma ainda que a ideia era, claramente, "encerrar uma vasta investigação sobre corrupção na Petrobras que afetou um grande número de congressistas".
O FT escreve também que Temer "está andando na corda bamba" porque não pode se opor abertamente ao Congresso e a suas "tentativas de se proteger de acusações no caso de corrupção" na Petrobras. "Ele precisa de seu apoio para permanecer no poder. Mas ele não pode apoiá-los abertamente. Se fizer isso, poderá provocar a ira popular e tornar o país ingovernável. Em causa está uma agenda de reformas fiscais críticas que Temer prometeu aos mercados para tentar tirar o Brasil de sua pior recessão em um século".
O jornal alemão Frankfurter Allgemeine Zeitung (FAZ), em artigo intitulado O solitário presidente do Brasil, afirma que Temer perde cada vez mais aliados e lembra que ele perdeu seis ministros em seis meses de mandato como presidente, após a destituição de Dilma. O artigo cita, ainda, a decisão do STF sobre a manutenção da presidência do Senado nas mãos de Calheiros – também aliado de Temer – e, também, que ele não poderá ficar na linha de sucessão da presidência da República enquanto houver processos pendentes contra ele.
O periódico espanhol El País afirmou que uma situação parecida com a de Calheiros foi vivida pelo ex-presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, depois de ser acusado no caso de corrupção da Petrobras. Em maio, o partido Rede pediu ao STF que suspendesse Cunha do cargo e, três dias depois, a petição foi submetida em plenário aos 11 magistrados do STF, que aceitaram uma medida provisória concedida por Teori Zavascki e suspenderam Cunha por unanimidade.