Lula e Alckmin pedem união entre diferentes contra Bolsonaro
7 de maio de 2022O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ex-governador Geraldo Alckmin lançaram neste sábado (07/05) a pré-candidatura de sua chapa ao Palácio do Planalto, em um evento em São Paulo que formalizou a união dos dois ex-adversários para enfrentar o presidente Jair Bolsonaro e deu o contorno do discurso político que será usado por ambos até outubro.
Além do PT e do PSB, a chapa conta com Solidariedade, PSOL, PCdo B, Rede e PV. Antigo adversário de Lula, o ex-governador paulista, de perfil conservador, começou uma aproximação com o petista no fim do primeiro semestre de 2021, um lance que inicialmente provocou incredulidade entre observadores políticos.
A jogada de agregar um vice de um espectro político diferente não é uma novidade para Lula, que em 2002 foi eleito tendo o empresário José Alencar como companheiro de chapa. Mas a formação de uma chapa com um antigo adversário político – Lula e Alckmin se enfrentaram nas eleições presidenciais de 2006 – é uma das escolhas mais ousadas que Lula fez em sua carreira política e enfrentou resistência dentro do PT.
O que Alckmin falou
O ex-governador paulista foi diagnosticado com covid-19 na sexta-feira e fez seu discurso por meio de vídeo, estruturado em três eixos. Um deles foi assegurar que será um vice leal a Lula, para tentar dirimir críticas ao seu nome entre os petistas, em parte ainda traumatizados pela experiência de Michel Temer ter participado das articulações pelo impeachment de Dilma Rousseff e céticos sobre o benefício eleitoral da aliança.
"Nenhuma divergência do passado, nenhuma diferença do presente, nem as disputas de ontem nem as eventuais discordâncias de hoje ou de amanhã, nada servirá de razão, desculpa ou pretexto para que eu deixe de apoiar e defender com toda a minha convicção a volta de Lula à presidência do Brasil", afirmou Alckmin. "Serei um parceiro leal, seriamente compromissado com o seu propósito de fazer do Brasil um país socialmente mais justo, economicamente mais forte, ambientalmente mais responsável e internacionalmente mais respeitado."
Ele também elaborou sobre os fundamentos de sua decisão de se unir ao petista. "As disputas fazem parte do processo democrático, mas acima das disputas algo mais urgente e relevante se impõe, a defesa da própria democracia (...) Quando o presidente Lula me estendeu a mão, vi nesse gesto muito mais que um sinal de reconciliação entre dois adversários históricos, vi um verdadeiro chamado à razão", afirmou o ex-governador, que comandou o Palácio dos Bandeirantes por três mandatos.
Alckmin foi um dos fundadores do PSDB e deixou o partido em 2021, em meio à tomada do controle do diretório paulista por João Doria e a uma crise de propósito e identidade entre os tucanos. Hoje filiado ao PSB, ele afirmou que o governo Bolsonaro é "o mais desastroso e cruel" da história do país e que as eleições de outubro serão um "grande teste" para a democracia. "O futuro do Brasil está em jogo, e nós não devemos vacilar."
Parte do discurso de Alckmin mirou no eleitor não petista, que simpatiza com propostas de justiça social mas busca um governo que também valorize a liberdade de iniciativa e a eficiência econômica. "Vamos mudar os termos do debate político, vamos provar que não há incompatibilidade entre prosperidade individual e uma sociedade solidária. Vamos provar que a eficiência econômica e a justiça social não são coisas opostas. Não permitir que essa falsa dicotomia restrinja a política a um eterno confronto entre liberdade e igualdade. A política pode e deve ser instrumento para a promoção da igualdade sem prejuízo da liberdade", afirmou.
Ele também brincou com o apelido popular de ser um chuchu, leguminosa sem muito sabor. "Lula é um prato que cai bem com chuchu, espero que esse prato se torne um hit de nossa culinária", disse.
O que Lula falou
Em um discurso lido, para evitar arroubos com impacto negativo na largada da pré-campanha, em frente a uma grande bandeira do Brasil, estratégia para disputar o símbolo nacional hoje apropriado pelos bolsonaristas, o petista estruturou sua fala na defesa da democracia e da soberania, no qual citou realizações dos governos do PT em diversos setores e indicou quais seriam suas prioridades em um terceiro mandato no Palácio do Planalto.
"Tudo o que fizemos e o povo brasileiro conquistou está sendo destruído pelo atual governo", afirmou o petista, mencionando como exemplo o retorno do Brasil ao Mapa da Fome, do qual tinha saído em 2014.
Falando à sua base tradicional, Lula criticou o desmembramento e venda de partes da Petrobras desde o governo Temer, se colocou contra a privatização de bancos públicos como o Banco do Brasil e a Caixa e da Eletrobras e questionou a política de preços da Petrobras, que também está sob críticas de Bolsonaro. "O resultado desse desmonte é que somos autossuficientes em petróleo e pagamos por uma gasolina cotada em dólar, quando os brasileiros ganham em real."
Na política externa, disse que iria recuperar a "política altiva que levou o Brasil à posição de protagonista, que falava de igual para igual [com países ricos], e ao mesmo tempo contribuía para o desenvolvimento dos países pobres". Ele disse que, se eleito, iria promover maior integração da América do Sul e fortaleceria a União das Nações Sul-Americanas (Unasul) e o Brics.
Citando dados sobre investimentos em educação em seu governo, o petista também disse que, se eleito, irá destinar mais verbas para universidades e instituições de ciência e tecnologia, que enfrentaram dificuldades no governo Bolsonaro. E afirmou que iria defender a Amazônia "da política de devastação posta em prática pelo atual governo" e proteger os povos indígenas, "que agora estão vendo seus territórios sendo invadidos".
O petista ainda disse que iria combater o "extermínio da população negra", aprovar uma legislação trabalhista que estimule a negociação entre patrão e empregado "em bases civilizadas" e agir para aumentar o poder de compra do salário mínimo. "Hoje vivemos uma situação desoladora. Um país cujo maior desejo de sua juventude é ir embora para o exterior em busca de oportunidades", afirmou.
Sobre a aliança com Alckmin, Lula afirmou que o momento do Brasil "nos obriga a superar divergências e a construir uma via alternativa", e citou uma frase que atribuiu ao educador Paulo Freire: "É preciso unir os divergentes para melhor enfrentar os antagônicos."
Ao final, o petista dialogou com a piada mencionada por Alckmin: "lula e chuchu vai ser o prato predileto de 2022 e vai ser o prato da moda no Palácio do Planalto a partir de 2023". "Tenham orgulho de contar com o companheiro Geraldo Alckmin. (...) Sei que a lealdade jamais faltará, nem a mim, e muito menos a vocês e ao Brasil", afirmou, defendendo ser necessário união para que "o fascismo seja devolvido ao esgoto da história, de onde nunca mais deveria ter saído".
A campanha eleitoral só começa, formalmente, no dia 16 de agosto, mas tanto Lula como Bolsonaro e outros pré-candidatos vêm mantendo agenda intensa de eventos. Segundo a lei eleitoral, é permitida a participação dos pré-candidatos em eventos coletivos e manifestações, sendo vedado apenas o pedido explícito de voto.
bl (ots)