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Maioria do STF aprova continuidade do inquérito de fake news

18 de junho de 2020

Oito dos 11 ministros votam pela legalidade da investigação que mira bolsonaristas e apura notícias falsas e ameaças. Incitar estupro não é liberdade de expressão, diz Moraes. Tribunal mantém Weintraub no inquérito.

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Estátua em frente ao prédio do STF em Brasília
O julgamento foi suspenso e deverá ser retomado nesta quinta-feira para que sejam ouvidos os três votos restantesFoto: Dorivan Marinho/SCO/STF

O Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria nesta quarta-feira (17/06) a favor da legalidade do inquérito das fake news, aberto pelo próprio tribunal para apurar a divulgação de notícias falsas, ofensas e ameaças contra integrantes da Corte e seus familiares.

Oito dos 11 ministros votaram a favor da continuidade das investigações, o que significa que continuam validadas as medidas de busca e apreensão e de quebra de sigilo realizadas contra empresários e suspeitos de financiar, difamar e ameaçar ministros pelas redes sociais.

Os votos vieram dos ministros Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Rosa Weber e Gilmar Mendes.

O julgamento foi suspenso e deverá ser retomado nesta quinta-feira para que sejam ouvidos os votos restantes, dos ministros Marco Aurélio Mello, Celso de Mello e Dias Toffoli.

Desde a semana passada, o Supremo julga uma ação do partido Rede Sustentabilidade protocolada no ano passado para contestar a forma de abertura da investigação – controversa antes mesmo de mirar aliados e apoiadores do presidente Jair Bolsonaro.

O inquérito foi instaurado em março de 2019 pelo presidente do STF, ministro Dias Toffoli, que designou Alexandre de Moraes como relator do caso. É incomum no direito brasileiro que um juiz tome a iniciativa de instaurar um inquérito, sem que o tribunal seja acionado pelo Ministério Público ou pela polícia.

Toffoli se baseou em um artigo antigo do regimento da Corte que busca proteger os ministros contra crimes ocorridos nas dependências do tribunal. À época, a medida gerou críticas da Procuradoria-Geral da República (PGR), ainda comandada por Raquel Dodge.

Bolsonaro tem se aproveitado da origem inusitada da investigação para atacar o Supremo. Nesta quarta-feira, ele afirmou que houve abusos em operações autorizadas pelo STF contra seus aliados e que "está chegando a hora de tudo ser colocado no devido lugar".

"Eu não vou ser o primeiro a chutar o pau da barraca. Eles estão abusando. Isso está a olhos vistos. O ocorrido no dia de ontem, no dia de hoje, quebrando sigilo parlamentar, não tem história nenhuma visto numa democracia, por mais frágil que ela seja. Então tá chegando a hora de tudo ser colocado no devido lugar", disse o presidente.

Já no final de maio, Bolsonaro havia dito que não iria mais admitir "atitudes de certas pessoas individuais", em referência implícita ao ministro Alexandre de Moraes, sinalizando que considera desobedecer a futuras decisões da Corte. "Acabou, porra!", afirmou.

Essa fala veio após a Polícia Federal (PF) cumprir uma série de mandados de busca e apreensão contra blogueiros, empresários e deputados aliados do presidente, sob ordem de Alexandre de Moraes no âmbito do inquérito das fake news.

Entre os alvos estavam o ex-deputado e presidente do PTB Roberto Jefferson; as deputadas federais Bia Kicis (PSL-DF) e Carla Zambelli (PSL-SP); o deputado estadual Douglas Garcia (PSL-SP); o empresário Luciano Hang, dono da rede Havan; o blogueiro Allan dos Santos, do site Terça Livre; e a ativista de extrema direita Sara Fernanda Giromini, conhecida como Sara Winter.

Nesta quarta-feira, Winter foi denunciada pelo Ministério Público Federal (MPF) por injúria e ameaça ao ministro Alexandre de Moraes, também no âmbito do inquérito das fake news. A denúncia pede multa de no mínimo 10 mil reais para ela, por danos morais. Ela está presa, mas por suspeita de realização de atos antidemocráticos, um outro inquérito que também é relatado por Moraes no STF.

Após a operação contra bolsonaristas, o partido Rede Sustentabilidade, que protocolou em 2019 a ação pedindo ao Supremo a extinção do inquérito, voltou atrás e afirmou que a investigação "se converteu em um dos principais instrumentos de defesa da democracia", embora no começo tenha apresentado "inquietantes indícios antidemocráticos".

Os votos dos ministros

O caso começou a ser julgado finalmente na semana passada, com o voto do relator, o ministro Edson Fachin, favorável à continuidade do inquérito.

Pelo entendimento de Fachin, houve omissão dos órgãos de controle, que não tomaram a iniciativa de investigar os ataques contra a independência do Poder Judiciário nas redes sociais, e, dessa forma, o regimento interno pode ser aplicado como instrumento de defesa institucional.

Fachin também estabeleceu parâmetros para a continuidade do inquérito. Pelas regras estabelecidas, a investigação deverá ser acompanhada pelo Ministério Público, os advogados dos investigados deverão ter acesso ao processo, e o objeto do inquérito devem ser ameaças aos ministros, a seus familiares, aos poderes constituídos, ao Estado de direito e à democracia.

O relator também definiu que não poderão ser alvo do inquérito reportagens jornalísticas e manifestações pessoais nas redes sociais, desde que não façam parte de "esquemas de financiamento e divulgação em massa nas redes sociais".

Alexandre de Moraes, relator do inquérito das fake news, também votou pela legalidade da investigação. Segundo ele, ameaças aos ministros pelas redes sociais não podem ser reconhecidas como liberdade de expressão.

Entre os casos de ameaças identificados, Moraes citou uma mensagem publicada em redes sociais por uma advogada do Rio Grande do Sul que dizia: "Que estuprem e matem as filhas dos ordinários ministros do STF." Em outra mensagem lida por ele, a mesma pessoa indaga "quanto custa atirar à queima-roupa nas costas de cada filho da puta ministro do STF que queira acabar com a prisão em segunda instância".

"Em nenhum lugar do mundo isso é liberdade de expressão. Isso é bandidagem, criminalidade", afirmou Moraes. "Liberdade de expressão não é liberdade de destruição da democracia, instituições e honra alheia", completou o ministro.

Na quarta-feira passada, primeiro dia do julgamento, o procurador-geral da República, Augusto Aras, defendeu o prosseguimento do inquérito, mas com balizas para garantir a participação do Ministério Público. O advogado-geral da União, José Levi do Amaral, também defendeu a continuidade, desde que seja garantida a não criminalização da liberdade de expressão.

Supremo mantém Weintraub no inquérito

Também nesta quarta-feira, o plenário do STF decidiu manter o ministro da Educação, Abraham Weintraub, no inquérito das fake news, rejeitando assim um pedido de habeas corpus apresentado pelo ministro da Justiça, André Mendonça, em favor do titular do MEC.

Por nove votos a um, os ministros entenderam que o habeas corpus não pode ser analisado por questões processuais. Seguindo voto do relator, Edson Fachin, a maioria concluiu que a ação não pode ser usada como recurso para questionar as decisões do ministro Alexandre de Moraes, que comanda o inquérito.

Votaram assim os ministros Dias Toffoli, Celso de Mello, Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia, Luiz Fux, Rosa Weber e Luís Roberto Barroso. O ministro Marco Aurélio foi o único a votar de forma contrária. Moraes não votou por se declarar impedido, já que é relator do inquérito.

Mendonça apresentou o habeas corpus no dia 28 de maio, pedindo ao STF que Weintraub fosse excluído da investigação e não precisasse depor à Polícia Federal.

O ministro da Educação foi incluído no processo após a gravação de uma reunião ministerial de 22 de abril ter sido tornada pública pelo Supremo. Durante o encontro com Bolsonaro, Weintraub afirmou que os ministros do STF eram "vagabundos" que deveriam ser colocados "na cadeia".

No habeas corpus, o ministro da Justiça argumentou que é direito de qualquer cidadão expressar opiniões sobre autoridades e que o ministro da Educação, dessa maneira, apenas exerceu sua liberdade de expressão.

EK/abr/ots/dw

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