Feminismo de véu
21 de dezembro de 2011Durante anos, ela lutou contra ele, e em novembro um sonho se tornou verdade: o presidente do Iêmen, Ali Abdullah Saleh, finalmente cedeu e, depois de numerosos protestos e ações violentas, concordou em sair do poder, abrindo o caminho para eleições democráticas no país após 33 anos.
Para Tawakkul Karman este é apenas um sucesso parcial. A militante iemenita, homenageada este ano com o Prêmio Nobel da Paz, critica que Saleh deverá ficar impune, segundo o acordo de paz obtido com a mediação do governo da Arábia Saudita. Ela quer que o autocrata iemenita seja processado por violações dos direitos humanos e busca, para isso, apoio do Tribunal Internacional de Haia.
Já em 2007, a jornalista e ativista de direitos humanos de 32 anos lutava por uma mudança política no Iêmen, país atormentado por problemas como miséria, rivalidades tribais, terrorismo e separatismo. Ela organizava protestos semanais diante de edifícios do governo na capital, Sanaa, tendo sido presa mais de uma vez por causa disso. "Não nos intimidaremos", afirmou a ativista no início de outubro, em uma entrevista ao jornal berlinense Der Tagesspiegel.
Guerreira de lenço na cabeça
Por esse engajamento, ela foi premiada com o Prêmio Nobel da Paz, embora Karman não corresponda, exteriormente, à imagem que os europeus têm de uma mulher emancipada, defensora da liberdade. Ela usa um véu islâmico na cabeça e cobre o corpo com uma longa túnica preta. É muçulmana e integrante do partido de oposição islâmico Islah, uma agremiação próxima da Irmandade Muçulmana.
Mesmo assim essa mulher, muitas vezes vista em fotografias com um megafone na mão, é uma das mais enérgicas e corajosas ativistas pela democracia e pelos direitos humanos no Iêmen. Não só as mulheres, mas também muitos homens estão entre seus seguidores. Alguns a admiram como uma "mãe da revolução", enquanto outros a consideram uma possível candidata ao cargo de presidente do país.
Mas não é uma coisa comum uma mulher como Karman ter conseguido chegar à liderança do movimento democrático do Iêmen. Mesmo em comparação com outros países árabes, o Iêmen é um país altamente conservador, onde as mulheres são tratadas frequentemente como cidadãos de segunda classe, devido à tradição ou a supostos códigos religiosos. Casamentos forçados de meninas menores de idade no país são regularmente tema de manchetes negativas.
Como blogueira e cofundadora da organização Jornalistas sem Correntes, Tawakkul Karman luta ferozmente contra tais casamentos demenores de idade, e se engaja em outros níveis a favor dos direitos das mulheres. Ela exige, há muito tempo que pelo menos um terço dos cargos do serviço público no seu país seja ocupado por uma mulher.
'O Iêmen será um país pacífico'
Já em sua primeira reação, falando à rede de TV Al Jazeera logo após a divulgação de seu nome como ganhadora do Prêmio Nobel da Paz, Tawakkul Karman classificou a homenagem que recebia como um reconhecimento ao movimento de liberdade árabe, como um sinal de que a era dos governantes autoritários está no fim. O comitê do Nobel homenageia através da concessão do prêmio, também o papel dela enquanto defensora de uma mudança pacífica.
Karman e seus colegas sempre se mantiveram longes de confrontos sangrentos entre Saleh e as tribos rivais ao ditador. Mesmo assim, ela recebeu repetidas ameaças de violência. Após a queda do presidente Saleh, Karman agora sonha com uma democracia islâmica nos moldes da Turquia. "Sempre alertam contra uma guerra civil no Iêmen", ela disse certa vez a um jornal suíço. "Mas você vai ver: o Iêmen será um país civilizado e pacífico, vamos surpreender o mundo."
Autor: Rainer Sollich (md)
Revisão: Augusto Valente