O Partido dos Trabalhadores (PT) é um dos partidos que moldaram o Brasil democrático pós-Constituição de 1988. São Paulo, o berço do PT, foi administrado durante muitos anos por prefeitos petistas: Luiza Erundina, Marta Suplicy e Fernando Haddad. Mas, ao que parece, acabaram-se os tempos em que o PT formava a vanguarda política.
O atual candidato do partido à prefeitura de São Paulo, Jilmar Tatto, vive um drama. A menos de um mês das eleições municipais, ele está estacionado nas pesquisas, com menos de 5% das intenções de voto. Enquanto isso, vejo, aqui no Rio, o PT lançar Benedita da Silva, de 78 anos de idade, como candidata à prefeitura. Atualmente, ela está com 7% das intenções de voto.
Que sinal fatal de falta de visão no sentido de de renovar este país! Onde estão os quadros novos do PT? Olhando para as outras capitais, o partido só parece ter uma real chance de ganhar uma prefeitura, em Fortaleza. No Sul, abriu mão de candidaturas próprias para apoiar o PCdoB e o PSOL.
Será difícil a renovação do PT. Observa-se que a classe de artistas e intelectuais, tradicionalmente ligada ao PT, está hoje com o PSOL. Isso fica bem claro em São Paulo, onde Guilherme Boulos, candidato do PSOL, está muito à frente de Jilmar Tatto. E o movimento ecológico e indigenista também está ligado ao PSOL, com a líder indígena Sônia Guajajara – uma ex-petista, aliás – sendo o grande destaque entre os políticos do partido.
Vale lembrar que o PSOL foi fundado, em 2004, por dissidentes petistas expulsos pelo PT. Um ano depois, ganhou uma segunda onda de apoio depois do escândalo do mensalão, que quase acabou com o governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O PSOL se aproveitou do êxodo dos petistas insatisfeitos, enquanto Lula partiu para fazer uma aliança com o PMDB, para garantir sua reeleição e a de sua sucessora, Dilma Rousseff.
O abismo entre o governo petista e a vanguarda intelectual ficou claro nas manifestações de junho de 2013 e, em seguida, com a longa queda de Dilma, entre 2014 e 2016. Só quando Lula correu o risco de ser preso e de ter sua candidatura ameaçada, em 2018, aconteceu uma reaproximação entre os partidos da esquerda.
Me lembro do ato de Lula no dia 15 de março de 2018, no Estádio de Pituaçu, durante o Fórum Social Mundial em Salvador. Estavam presentes Manuela d'Ávila, do PCdoB, e Guilherme Boulos. O evento, planejado como ato em defesa ao direito de Lula ser candidato, logo se transformou numa homenagem à Marielle Franco, que tinha sido assassinada apenas horas antes do evento. E me lembro que quase ninguém acertava o nome da Marielle, de tão desconhecida que a vereadora carioca pelo PSOL era entre os políticos da esquerda.
O PT conseguiu, naquele momento, juntar os martírios tão desiguais de Lula e Marielle para unir a esquerda. Mas, ao insistir na inviável candidatura de Lula para as eleições de 2018, e, depois, em não abrir mão da candidatura de Fernando Haddad em favor de uma chapa alternativa, o partido bloqueou a união da esquerda. E alçou Jair Bolsonaro à Presidência.
Desde sua soltura, no final de 2019, vemos um Lula raivoso e vingativo, que até agora pouco contribuiu para a solução de problemas atuais. A rixa pessoal com Sergio Moro e a Lava Jato bloqueia qualquer resposta do PT à corrupção, bandeira tradicional do partido nos anos 80 e 90. E como é que o PT pode imaginar ganhar uma eleição enquanto defende a ditadura venezuelana?
Além das bandeiras tradicionais do combate à corrupção e da luta pela democracia faltam também respostas sobre como fazer frente à desaceleração econômica em tempos de vacas magras. Se Bolsonaro conseguir aumentar os valores do Bolsa Família, ameaçará mais um pilar petista. Se continuar assim, não haverá um bom motivo para a esquerda se unir atrás de um candidato petista na disputa em 2022.
Aliás, seria o Lula este candidato? Acabei de ver a notícia de que o PT orienta seus candidatos a usar seus horários eleitorais para defender a anulação da condenação de Lula. Já que não vão ganhar nada mesmo nestas eleições atuais, pelo menos podem ajudar o Lula de se livrar da ficha suja. Enquanto o PT for apenas um projeto pessoal de Lula, não vejo um futuro promissor para o partido. Lamentável.
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Thomas Milz saiu da casa de seus pais protestantes há quase 20 anos e se mudou para o país mais católico do mundo. Tem mestrado em Ciências Políticas e História da América Latina e, há 15 anos, trabalha como jornalista e fotógrafo para veículos como o Bayerischer Rundfunk, a agência de notícias KNA e o jornal Neue Zürcher Zeitung. É pai de uma menina nascida em 2012 em Salvador. Depois de uma década em São Paulo, mora no Rio de Janeiro há quatro anos.