Opinião: Anuência de Assad ao plano de paz de Annan é calculismo
28 de março de 2012O cessar-fogo imediato, o fim do cerco militar aos centros de protestos, reformas políticas e a libertação de todos os prisioneiros detidos durante a revolta – esses são os principais pontos do plano de paz de Kofi Annan. Após longa hesitação, o plano teria sido aprovado pelo autocrata da Síria, Bashar al-Assad. Em breve saberemos se tal aprovação implica um compromisso robusto do ditador.
Caso Assad esteja falando sério desta vez, as armas do regime coagido teriam de silenciar em breve. A ajuda humanitária chegaria aos redutos dos rebeldes e as portas das prisões se abririam.
Assad iria então receber Kofi Annan, para negociar com ele as modalidades de uma missão de observadores, que entraria rapidamente em ação e cujos membros teriam acesso irrestrito a todas as instalações do país. Isso soa tão provável quanto um conto das Mil e uma noites.
Tática em vez de entendimento
No contexto das promessas anteriores de Assad, que quase sem exceção até agora se mostraram vazias, desta vez o ceticismo ainda é maior. Não houve reforma política que ele não teria anunciado nos últimos meses, que não tenha sido para acirrar a repressão de forma quase concomitante. A comunidade internacional já sinalizou a Assad, por diversas vezes, sua disposição de colaborar, sem ter recebido confiança.
Também agora, a aprovação ao plano de paz de Kofi Annan deve ser calculismo, já que a atual situação quase não deixa outra opção a Assad. Desde a primeira visita de Annan a Damasco há duas semanas algumas coisas mudaram. Moscou assumiu uma postura crítica em relação a Assad e apoiou o plano de paz da ONU. Na sequência, os russos aumentaram, de forma evidente, a pressão sobre seu antigo aliado.
Assad cada vez mais isolado
Também a China parece estar disposta a abandonar seu bloqueio no Conselho de Segurança e apoiar a missão de paz de Kofi Annan. A Turquia, país vizinho da Síria, cortou no início da semana as relações diplomáticas com Damasco. Assad está isolado em nível internacional. Seu espaço de manobra política encolheu. Além disso, a Arábia Saudita e alguns emirados do Golfo iniciaram o fornecimento de armas aos rebeldes. Também sob o aspecto militar o levante está mais próximo do centro de poder do regime. O derramamento de sangue atingiu a capital, Damasco. Após um ultimato de Moscou, Assad não tinha outra opção a não ser aceitar o plano de paz.
A sua efetiva implementação, todavia, não deu nenhum passo à frente. Principalmente entre os opositores sírios não deve haver ninguém acreditando que desta vez Assad irá manter a palavra. Até agora, os levantes já provocaram 9 mil mortes, e cada dia este número aumenta. Para os rebeldes, o fim das lutas sem o abandono do poder por parte de Assad deixou de ser, há muito, uma opção. Eles concordariam com uma trégua sem receber, antecipadamente, nada em troca do regime? Isso também é motivo de dúvidas.
Dúvidas sobre a oposição
Kofi Annan pretende enviar uma missão de observadores da ONU ao país para vigiar o seu plano de paz. Mesmo que Assad o aprove, não faz nem dois meses que a missão de observadores da Liga Árabe mostrou-se incapaz de pôr fim ao derramamento de sangue. Mesmo se a ONU recebesse um mandato abrangente e robusto e os observadores fossem mais bem treinados: sem uma verdadeira disposição por parte do regime e da oposição, não é possível pacificar o país afundado na guerra civil.
Assad, na realidade, quer continuar lutando. Ele precisa da guerra civil para congregar os leais ao regime em torno de si e para se manter no poder. Pois, segundo organizações humanitárias, também aumentam as atrocidades cometidas por críticos ao regime. Cristãos e membros da minoria alauita, à qual também pertence Assad, temem atos brutais de vingança pelos rebeldes. A guerra civil cravou marcas profundas na Síria, enquanto aumentam as dúvidas internacionais quanto ao caráter dos oposicionistas.
Com a sua virada, Assad ganhou, sobretudo, tempo. A missão de Kofi Annan, no entanto, continua sendo uma tarefa hercúlea. Ela não ficou nada mais fácil.
Autor: Daniel Scheschkewitz (ca)
Revisão: Roselaine Wandscheer