As relações da Alemanha com a Rússia atingiram um novo ponto crítico politicamente. Mas, apesar do assassinato de um cidadão georgiano em Berlim, o governo alemão e quase todos os partidos alemães continuam a agir como se nada tivesse acontecido. Tudo como sempre: ninguém quer melindrar Putin desnecessariamente. Pois ele seria necessário em outros campos importantes da política externa – por exemplo, no Oriente Médio, no leste da Ucrânia e no que diz respeito às armas nucleares.
Mas é precisamente aí que está o erro de cálculo fatal da política alemã para a Rússia: acreditar que minimizar diplomaticamente os ataques de Putin à ordem jurídica e à paz da Europa pode, talvez, levar a concessões de Moscou em outros assuntos. O que ocorre é justamente o oposto: o silêncio diplomático demonstra fraqueza para Putin. Essa fraqueza da Europa o torna forte – interna e internacionalmente. Pois hoje quem consegue ganhar a soberania da interpretação na percepção pública de eventos obscurecidos por notícias falsas é mais poderoso politicamente. É por isso que, na política externa, a linguagem pública no mundo moderno de hoje, da comunicação com internet e mídias sociais, se tornou uma medida decisiva do poder intergovernamental. Quem pode se dar ao luxo de dizer algo a alguém sem temer consequências?
Quando o presidente francês Macron – aborrecido por Trump e frustrado pela letargia de Berlim em avançar em uma cooperação armamentista franco-alemã – diagnostica a "morte cerebral" da Otan, a chanceler rapidamente se apressa ao microfone. E, nele, ela explica que ela e seu governo não compartilham da avaliação de Macron. Por outro lado, quando o georgiano Zelimkhan Khangoshvili é assassinado em Berlim, em plena luz do dia, no final de agosto, o silêncio impera por semanas nos círculos políticos em Berlim. Mesmo que os indícios logo levem a Vadim Sokolov e ao apoio óbvio das agências governamentais russas – indicando, portanto, se tratar de uma execução encomendada que dificilmente ocorreu sem a aprovação de Putin.
No final, no entanto, não restou outra opção a promotores federais a não ser assumirem o caso, pois a Rússia se recusou a cooperar. E quando as circunstâncias do crime não puderam mais ser ocultadas, o governo alemão foi forçado a expulsar dois funcionários da embaixada russa para não acabar ridicularizado frente a Putin – uma reação muito moderada diante do flagrante ataque à soberania e segurança alemãs.
No final da coletiva de imprensa da reunião em Paris na noite de 10 de dezembro, Putin, na presença de Merkel, disse que Khangoshvili era um "bandido" e que os pedidos russos para sua extradição não foram atendidos por Berlim. Obviamente, isso era uma mentira clara, uma tácita justificativa e confirmação da execução por órgãos do governo russo.
Obviamente, a chanceler também sabia que isso era uma mentira – e mesmo assim permaneceu em silêncio. No dia seguinte, o porta-voz do governo alemão declarou timidamente que tal pedido de extradição da Rússia nunca havia sido recebido.
Putin pode mentir para Berlim sem ser responsabilizado. Ao fazê-lo, Berlim deixa para Putin o poder de interpretar seus ataques à soberania alemã e sobre suas explicações usuais: a Rússia é sempre a vítima inocente da difamação de um Ocidente hostil. Os soldados russos nunca estiveram no leste da Ucrânia. O Boeing da Malaysian Airlines, que transportava 298 passageiros, foi abatido com um foguete russo BuK, que logicamente não veio da Rússia – tudo apenas difamações conspiratórias do Ocidente.
Essas interpretações são coisas que a política alemã para a Rússia não pode deixar passar. Qualquer um que conceda sem reservas esse poder de interpretação a Putin aprova oficialmente seu modo de agir e, assim, amplia sua área de ação para ataques óbvios à soberania alemã. Todos os representantes do governo e partidos alemães que pensam que, com silêncio míope e minimizações dessas violações flagrantes da lei, podem contar com Putin para cooperações ou troca de favores econômicos devem estar conscientes disso. O efeito é oposto. Quem quer que esteja seriamente interessado na cooperação indubitavelmente necessária com Putin não deve se furtar de usar uma linguagem clara publicamente.
Jörg Himmelreich é professor da École Supérieure de Commerce de Paris (ESCP), Campus Berlim.