Cap Anamur
9 de agosto de 2009Há 30 anos, em 9 de agosto de 1979, o navio Cap Anamur atracou no porto japonês de Kobe, a fim de salvar os fugitivos vietnamitas que navegavam no Mar da China Meridional. Mais de mil pessoas estiveram envolvidas nas operações da organização.
Tudo começou quando o jornalista alemão Rupert Neudeck viajou a Paris, há 30 anos, para fazer uma entrevista com o filósofo francês Jean-Paul Sartre. Ele retornou com uma ideia que mudaria não só a sua vida.
Por meio do filósofo André Glucksmann, com o qual ele preparara a entrevista, Neudeck ficou sabendo da calamidade dos vietnamitas que estavam fugindo de barco de seu país. Glucksmann fundara uma iniciativa na França, a fim de organizar um navio de frete para ir ao Mar da China Meridional e salvar os perseguidos políticos.
Na Alemanha, o casal Neudeck resolveu lançar uma iniciativa análoga. Por meio de uma coletiva de imprensa e de uma reportagem sobre os fugitivos, a opinião pública alemã foi informada da operação "Um barco para o Vietnã".
Três dias depois, o comitê havia angariado 1,2 milhão de marcos em doações e assim pôde fretar o navio Cap Anamur. A operação salvou a vida de mais de 9.500 pessoas.
Discurso governamental levado ao pé da letra
O fato de os fugitivos terem tido permissão de se refugiar na Alemanha se deve a uma frase temerária formulada pelo país na Conferência de Refugiados de Genebra. O fundador da Cap Anamur ainda se recorda bem dela: "Todo capitão de um navio com bandeira alemã é obrigado a resgatar as pessoas em perigo no Mar da China Meridional, e a República Federal de Alemanha irá recebê-las".
No entanto, na época, o governo alemão "não tinha noção de estava para surgir uma iniciativa que fretaria um navio, iria ao Mar da China Meridional para procurar essas pessoas e – ainda por cima – achá-las, para depois trazer centenas ou milhares" para a Alemanha.
Como o governo não poderia retirar o que dissera em Genebra, simplesmente fez um adendo à frase. A partir de então, o país só receberia refugiados que fossem encontrados por acaso, e não procurados de propósito. Isso significou, a princípio, o fim da iniciativa.
Riscos de uma operação fracassada
Entretanto, a Cap Anamur também já estava atuando em terra. Sobretudo na África, mas também na Ásia e no Oriente Médio, a organização se empenha até hoje pelo tratamento médico, abastecimento de água potável, educação e desenvolvimento.
O atual diretor da Cap Anamur, Bernd Göken, ressalta as vantagens da entidade: "Como temos uma estrutura pequena, uma diretoria de três membros que pode ser contatada a qualquer hora, podemos tomar decisões rápidas. Por outro lado, nossos projetos vivem de nossos colaboradores in loco. Eles participam da elaboração do projeto, o que torna a coisa pouco burocrática", descreve ele.
Mesmo assim, a Cap Anamur nem sempre é poupada de críticas. O exemplo mais conhecido é o de sua espetacular operação no Mediterrâneo em 2004. Na época, Elias Bierdel, membro da diretoria, e o capitão Stefan Schmidt salvaram quase 40 africanos no mar e os levaram para a Itália. Isso lhes custou a acusação de que estariam auxiliando a imigração ilegal: eles foram processados e os refugiados, extraditados.
Metas conquistadas por esforço próprio
A sentença desse processo deverá ser proclamada, no dia 7 de outubro próximo, pelo Tribunal Penal de Agrigento, na Sicília. É a contragosto que Neudeck critica seu sucessor nesse ponto: "Mesmo assim, sinceramente acho que essa operação não foi bem organizada e preparada. Acredito que isso provavelmente mais prejudicou do que viabilizou uma possível ajuda".
Göken aceita a crítica com descontração: "Sempre houve situações em que a Cap Anamur foi agredida por causa de seu trabalho. Ora se dizia que a central era pequena demais, pouco profissional, ora se relatava que faltava uma maior coordenação. Penso que o resultado nos países em que trabalhamos, onde sempre fomos muito estimados, mostra que estamos no caminho certo".
Apesar das críticas, Neudeck tem orgulho do que surgiu da sua iniciativa "Um navio para o Vietnã". "É uma história maravilhosa. Trata-se de uma organização que – por meio das próprias forças e não do orçamento governamental ou de subsídios da União Europeia– continua conseguindo mobilizar a sociedade, a ponto de poder realizar esse trabalho. Esse é um título de honra à livre sociedade alemã, algo que me deixa muito feliz", afirma o fundador.
Autora: Tamara Himmel
Revisão: Augusto Valente