Pesquisa em dez países europeus mostra alta no apoio a Kiev
17 de março de 2023Uma pesquisa de opinião realizada em dez países europeus indica um apoio generalizado à Ucrânia na guerra deflagrada pela invasão russa em 2022 e uma visão predominante de que a Rússia é um país adversário, mas há fatores que podem alterar essa unidade.
As conclusões estão em uma pesquisa do Conselho Europeu de Relações Internacionais (ECFR, na sigla em inglês), que identifica uma relativa "fusão" de opiniões sobre o tema entre nacionalistas e liberais e entre esquerda e direita.
Os autores do estudo, os cientistas políticos Ivan Krastev e Mark Leonard, afirmam ser generalizada a percepção de que União Europeia (UE) e os Estados Unidos "estão agora mais fortes do que há um ano". Além disso, 82% dos entrevistados veem a Rússia como um "adversário" ou "rival".
Eles advertem que "a pressão sobre o custo de vida e o potencial ressurgimento da migração poderão destruir a posição conjunta da Europa" sobre a Ucrânia e, nesse ponto, a unidade é especialmente vulnerável a mudanças de posição dos americanos.
Nos próximos meses, dizem os autores, a percepção dos europeus "será provavelmente moldada mais pela inflação e pelas questões do padrão de vida do que pelos acontecimentos na frente de batalha".
Apoio à recuperação do território ucraniano
Desde a invasão da Ucrânia pela Rússia, iniciada em 24 de fevereiro do ano passado, a Europa está demonstrando "uma unidade e determinação surpreendentes em fazer o que for preciso para apoiar a independência de Kiev", aponta o estudo.
O relatório Unidade frágil: Por que os europeus estão se unindo pela Ucrânia (e o que pode separá-los) foi realizado com base em uma pesquisa aplicada no início de janeiro de 2023 em dez países europeus – Dinamarca, Estônia, França, Alemanha, Reino Unido, Itália, Polônia, Portugal, Romênia e Espanha – e ouviu 14.439 pessoas.
O estudo aponta para a diminuição de divergências entre os aliados ocidentais e que, à esquerda ou à direita, os partidos estão mais próximos no apoio a Kiev.
"Esta posição mostra que a opinião pública na Europa já não pretende acabar com a guerra o mais depressa possível, preferindo esperar pela recuperação do território pelas tropas ucranianas", indica o documento.
Nos dez países pesquisados, em média 29% querem que a guerra termine o mais rápido possível, enquanto 38% querem que a Ucrânia recupere todo o seu território, "mesmo que isso seja sinônimo de um conflito mais prolongado".
Na pesquisa anterior, em maio de 2022, 35% responderam que o mais importante era parar a guerra o mais rápido possível, mesmo que isso resultasse na perda de territórios da Ucrânia para a Rússia.
Rússia cada vez mais vista como adversária
A percepção sobre a Rússia também endureceu: 66% veem agora Moscou como um "adversário" ou "rival" de seu país, 40% consideram que a Rússia está agora mais fraca do que antes do lançamento da sua "operação especial" e apenas 13% a veem como mais forte.
A UE é agora vista como "mais forte" do que há um ano em quase todos os países, com a exceção da Itália. Em Portugal, 58% dos inquiridos expressaram essa opinião, seguido por Dinamarca (55%), Polônia (54%), Romênia (51%), Estônia (48%), Espanha (47%), Alemanha (45%) e França (41%).
Segundo relatório, "a determinação do exército ucraniano, aliada ao sucesso em fazer recuar a ofensiva russa, conquistou apoiadores anteriormente pessimistas", quando a opinião prevalecente era de que a guerra deveria terminar o mais depressa possível.
A Rússia é vista como um "adversário" ou "rival" por todos os países europeus inquiridos. Esta posição foi mais acentuada na Dinamarca (82%), mas também é sólida e com uma maioria na Estônia (79%), que partilha uma fronteira terrestre com a Rússia, na Polônia (79%), no Reino Unido (77%), na Alemanha (69%), na Espanha (65%), na França (59%), em Portugal (57%) e na Itália (54%) e somente mais branda na Romênia (44%).
Ainda sobre a Rússia, ao contrário da percepção sobre a UE, 47% dos inquiridos, em média, veem-na mais fraca do que há um ano, contra 32% que a consideram forte ou mais forte.
Na ultradireita, menos apoio à retomada de territórios
Essa opinião, porém, dividiu-se na Itália (42% forte ou mais forte, contra 39% fraca ou mais fraca), posição que, segundo os autores, "é menos uniforme".
Quando lhes é dada escolha, "mais apoiadores do Irmãos de Itália, o partido governista [de ultradireita], preferiam parar a guerra o mais depressa possível, mesmo que isso signifique ceder território da Ucrânia, em vez de um longo cenário de guerra em que a Ucrânia venha a recuperar todo o seu território (42% contra 32%)".
Esta posição está alinhada com apoiadores de outros partidos de ultradireita europeus: na União Nacional, o partido francês de Marine Le Pen (39% contra 30%), no Vox na Espanha (35% contra 31%) e no Chega em Portugal (42% contra 28%).
Preocupação com custo de vida
As preocupações com o custo de vida estão aumentando, em comparação com a pesquisa anterior, em maio de 2022. "Estes receios de não conseguir fazer face às despesas foram mais acentuados na Itália, onde 34% dos pesquisados (contra 25% na pesquisa anterior) identificaram este fato como a principal preocupação relativa à guerra entre a Rússia e a Ucrânia". Houve altas acentuadas ainda na Espanha (28% contra 21%), França (31% contra 27%), Portugal (29% contra 25%) e Romênia (21% contra 17%).
As percepções sobre os EUA melhoraram, "com uma maioria em todos os países pesquisados a considerá-los agora mais fortes do que há um ano, ou pelo menos tão fortes como anteriormente", e vistos como um aliado ou um parceiro necessário pela maioria nos dez países europeus inquiridos.
Segundo os autores, o aumento do apoio dos europeus a Kiev deve-se a êxitos do Exército ucraniano no campo de batalha e, no sentido contrário, de a Rússia ser vista como uma potência global "mais fraca", e de uma menor preocupação com a perspetiva de uma escalada nuclear.
Os cientistas políticos avaliam, contudo, que esta unidade não deve ser dada como garantida e recomendam aos líderes europeus a utilizar este espaço para alcançar progressos na melhoria da resiliência do bloco.
"Em outras palavras, isso implica fazerem o que podem para equipar a Ucrânia, colocar em prática políticas sobre o custo de vida e a gestão de refugiados e, acima de tudo, aproveitar ao máximo os próximos 18 meses para se tornarem imunes a mudanças políticas do outro lado do Atlântico", aconselham. "Se conseguirem concretizar estes elementos, poderão constatar que a opinião pública se manterá forte, ao contrário das expectativas do Kremlin."
bl/fc (Lusa)