Portugal anseia pela recuperação econômica
2 de fevereiro de 2013Quando os sons melancólicos do fado ecoam, os portugueses costumam sonhar com dias melhores. Nos últimos anos, os acordes menores dessa música os têm ajudado a suportar a falta de perspectiva da crise financeira. Desde que Portugal retornou com sucesso ao mercado de capitais, no final de janeiro, há um pouco mais de motivos para esperança.
Pela primeira vez desde a perda de confiança por parte dos credores, o governo em Lisboa pôde emitir, novamente, títulos da dívida com resgate em até cinco anos. Somente com vencimentos bem mais prolongados pode-se testar se os mercados de capitais confiam no país. E é isso que parece estar ocorrendo. A demanda superou significativamente a soma desejada de 2,5 bilhões de euros.
Os lances vieram principalmente do exterior. Dessa forma, não só os maltratados cofres estatais foram um pouco aliviados, como, acima de tudo, os portugueses receberam um importante impulso psicológico no combate à crise financeira.
"A colocação bem-sucedida dos títulos públicos portugueses, na atual fase e com esse sucesso, superou as expectativas, isso está sendo visto aqui como um grande êxito da política de consolidação do governo português", disse Hans-Joachim Böhmer, da Câmara de Comércio e Indústria Luso-Alemã (AHK, na sigla em alemão), em Lisboa.
Em conversa com a Deutsche Welle, ele acrescentou que o objetivo original era voltar ao mercado somente em setembro deste ano. "A decisão foi antecipada em praticamente seis meses, e se constatou que os papéis tiveram boa colocação no mercado."
Alívio em Bruxelas
O fato valeu um elogio de Berlim. O 1° Fórum Portugal-Alemanha, realizado na última semana em Lisboa, procurou ampliar o intercâmbio entre os dois países. Na ocasião, o ministro alemão do Exterior, Guido Westerwelle, parabenizou o governo português, explicando que "as notícias do mercado financeiro para Portugal são bastante encorajadoras".
Também em Bruxelas essa nova dinâmica foi recebida com alívio. O comissário europeu de Assuntos Monetários, Olli Rehn, defendeu que Portugal e a Irlanda – o outro país-modelo da zona do euro em crise – paguem seus empréstimos de emergência após o prazo combinado. Depois que foram concedidas à Grécia condições mais favoráveis, os dois países também querem ser beneficiados.
Segundo Rehn, não seria apenas no interesse dos dois países, "mas também de toda a União Europeia que a Irlanda e Portugal possam se refinanciar novamente através do mercado de capitais." Essa questão, no entanto, só será decidida na cúpula da UE, em março próximo.
Ainda no fundo da crise
Em maio de 2011, Portugal recebeu um empréstimo de emergência da União Europeia (UE) e do Fundo Monetário Internacional (FMI) no valor de 78 bilhões de euros. Em contrapartida, Lisboa se comprometeu a implementar duras medidas de austeridade econômica e reformas para sanear o orçamento público e impulsionar sua economia.
Até o fim do ano, o país deverá reduzir seu deficit orçamentário para 4,5% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional. Hans-Joachim Böhmer, da AHK em Lisboa, disse esperar um aumento de impostos neste ano, "para que se mantenha a previsão de deficit orçamentário nos moldes acordados com a Troica". Deve-se, portanto, olhar para os dois aspectos da atual dinâmica, ressaltou Böhmer: "Por um lado, o fato positivo de Portugal poder voltar ao mercado de capitais; por outro, para os fardos das reformas e das medidas de austeridade financeira, que a população está sentindo fortemente".
As modestas previsões de crescimento econômico para este ano e o número crescente de pessoas emigrando do país mostram a fragilidade da economia portuguesa. Particularmente os jovens vislumbram um futuro sombrio. Devido a uma taxa global de desemprego de quase 16% – e quase 39% entre os jovens –, muitos procuram a sorte no exterior.
Hans-Joachim Böhmer confirma: aqueles que não veem em Portugal as chances de que necessitam, procuram oportunidades em outros países, "e não somente nos lusófonos como Angola". No ano passado, por volta de 6 mil trabalhadores portugueses foram para a Alemanha. "No ano anterior, esse número foi uns 15% menor", comenta Böhmer.
Entre os que querem deixar o país, está a jovem Helena Vieira, de 20 anos. "Eu já pensei muito em sair daqui, à procura de uma vida melhor." Ela trabalhava como cozinheira no Algarve, em meio expediente e a quatro euros por hora, chegando ao fim do mês com cerca de 500 euros. Há algumas semanas, mesmo isso chegou ao fim. Havia pouca clientela e o restaurante teve de fechar. Agora, Helena está se mudando para a antiga colônia portuguesa Angola. Se antes a força de trabalho vinha de lá, agora é o contrário.
Helena Vieira está convencida de que esse é o caminho certo. "Eu vejo que os jovens estão indo embora. E só fica aqui quem não tem nenhuma chance lá fora, por ser velho demais." Ela não é a única: há já algum tempo, longas filas se formam diante da embaixada angolana em Lisboa, toda terça e quinta-feira.
Formas criativas de arrecadar fundos
Visando melhorar a situação, o governo português vem tentando meios incomuns para reforçar os cofres públicos. Um deles é atrair imigrantes ricos, que tragam capital novo. Nesse sentido, em outubro passado foi aprovada uma lei que facilita a obtenção do passaporte português para os empresários estrangeiros dispostos a investir grandes somas no país.
Organizações portuguesas de direitos humanos criticam a nova lei. Segundo elas, enquanto se procura atrair investidores que pouco fazem pelo país, os imigrantes simples, que perderam seus empregos devido à crise, são deixados à própria sorte.
De qualquer forma, até agora tem sido modesta a demanda pelo assim chamado Visto Dourado. Realmente, é pouco provável que os empresários acorram a Portugal devido ao fado ou às chances de investimento: se há interesse, é antes pelo fato de um visto de residência permanente em Portugal proporcionar, automaticamente, o direito de permanência em todos os países da União Europeia.
Autor: Ralf Bosen (ca)
Revisão: Augusto Valente