Presidente egípcio arrisca perder apoio de liberais ao desafiar militares
11 de julho de 2012Alguns assentos permaneceram vazios durante a curta sessão do Parlamento do Egito realizada nesta terça-feira (10/07), a primeira desde a dissolução da casa pelo conselho militar, em junho.
Nem todos os parlamentares atenderam ao decreto presidencial do último fim de semana, o qual cancelou a dissolução do Parlamento e convocou os legisladores ao trabalho. Principalmente deputados liberais ignoraram o pedido do presidente Mohamed Morsi. Para eles, a decisão da Suprema Corte Constitucional da anular as eleições e dissolver o Parlamento, reiterada nesta terça-feira, pesa mais do que o decreto presidencial.
Do lado da Irmandade Muçulmana, porém, a reunião do Parlamento foi vista com bons olhos. Mohamed Khalifa, membro do grupo, queria ver com os próprios olhos os primeiros representantes eleitos pelo povo egípcio. "Sensacional", afirmou, diante do prédio do Parlamento, no Cairo.
"O conselho militar tirou o poder do povo, mas Morsi o devolveu ao povo", disse Khalifa. "Ele manteve a sua palavra." Morsi é oriundo da Irmandade Muçulmana, cujo Partido da Liberdade e Justiça é a principal força no Parlamento.
Uma pequena parte das forças liberais apoia o decreto presidencial, entre elas o Movimento Seis de Abril, composto por jovens que se opuseram ao regime de Hosni Mubarak. O grupo diz que Morsi está certo em confrontar publicamente os militares.
Risco de perder o apoio dos liberais
Mas uma grande parte das forças liberais critica o novo presidente e o acusa de desrespeitar os princípios democráticos. O ex-candidato à presidência Hamdeen Sabahi fala em "desperdício da autoridade legal". O Prêmio Nobel da Paz Mohamed el-Baradei publicou na sua conta no Twitter que o decreto presidencial leva o Egito de volta a uma época em que as decisões de uma pessoa têm mais valor que leis.
Há alguns dias, o presidente havia jurado respeito às instituições do Estado perante os juízes da Suprema Corte Constitucional. Com o decreto que invalida a dissolução do Parlamento, Morsi e a Irmandade Muçulmana ignoraram justamente uma decisão dessa corte.
Em junho, a Suprema Corte havia declarado inconstitucionais alguns artigos da lei que regulamentou as eleições legislativas realizadas no início do ano por permitirem que partidos políticos contestassem assentos reservados a independentes. Como consequência, o conselho militar dissolveu o Parlamento. A Irmandade Muçulmana considerou a decisão um golpe de Estado.
O fato de Morsi ter assinado um decreto que contratia as forças liberais deve ter consequências para ele. Morsi concorreu como o candidato da Irmandade Muçulmana, mas teve o apoio de muitos liberais, que viam nele uma maneira de quebrar o poder dos militares. A crescente distância entre o presidente e os liberais deverá enfraquecer politicamente o mandatário, principalmente no seu embate contra os militares.
Nesta quarta-feira, a presidência se manifestou em tom apaziguador, dizendo que vai "respeitar" a decisão. "Nós vamos consultar as instituições jurídicas para encontrar a melhor maneira de resolver esse impasse", disse um comunicado oficial citado pela televisão estatal.
Aliados poderosos no exterior
A queda de braço em torno do Parlamento ocorre num momento em que Morsi encontra apoio político no exterior. Nesta quarta-feira (11/07) ele visita a Arábia Saudita, na terça recebeu o ministro alemão do Exterior, Guido Westerwelle.
Entre os países ocidentais, Westerwelle foi o primeiro ministro do Exterior a visitar o Cairo depois da posse de Morsi e se mostrou confiante de que o conflito será resolvido. Segundo o ministro alemão, Morsi está comprometido com o Estado de direito, a pluralidade de opiniões e a tolerância, e os egípcios podem contar com a Alemanha no caminho para a consolidação da democracia.
Em setembro, o presidente do Egito vai se encontrar com o principal doador de recursos do país, o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama. O convite vindo de Washington foi tornado público pouco antes do anúncio do decreto que restabeleceu o Parlamento. Para analistas políticos, não se trata de uma mera coincidência. Morsi queria mostrar força diante do conselho militar e deixar claro que tem aliados importantes no exterior.
Autora: Viktoria Kleber, do Cairo (as)
Revisão: Francis França