Puxada de orelha
23 de janeiro de 2003Não se pode dizer que a Alemanha seja um paraíso de corruptos. No ranking da Transparência Internacional (TI), o país ocupa a 18ª colocação entre os menos afetados pelo problema, enquanto o Brasil surge apenas na 45ª, o México na 57ª e a Nigéria na 101ª.
O que preocupa a ONG fundada em 1993 e com sede em Berlim é o crescente número de escândalos financeiros nos governos, nos meios políticos e nas grandes empresas. E, para completar, a falta de ações para deter o que muitos analistas, exageradamente, identificam como a transformação da Alemanha numa "república de bananas".
Todos os cinco partidos representados no Parlamento alemão tornaram-se motivo de denúncias nos últimos anos, com dirigentes, deputados e governantes acusados de receber doações ilegais e inexplicadas, subornos e de usar de recursos públicos para fins particulares. No setor privado, acionistas foram ludibriados por balanços falsificados e empresas foram levadas à bancarrota aparentemente de propósito. Em 2001, os crimes econômicos teriam alcançado a soma de 6,6 bilhões de euros, 21% superior aos do ano anterior.
Promessas não cumpridas
O governo social-democrata e verde chegou a anunciar medidas moralizadoras. Mas as duas principais propostas ficaram pelo caminho. O projeto da Lei de Liberdade de Informação, anunciada em abril de 2002, "parou na burocracia", lembra Hansjörg Elshorst, presidente da seção alemã da Transparência Internacional. "O livre acesso a informações sobre a conduta administrativa reduz a predisposição da burocracia para a corrupção e aumenta o engajamento dos cidadãos no combate a irregularidades no exercício do poder", destaca o Informe Global da Corrupção 2003, divulgado pela TI em Berlim e Londres na quarta-feira (22).
O projeto visava não só o setor público, mas também a administração das empresas, notadamente as sociedades anônimas. Os empresários estão entre os principais opositores à iniciativa. Eles alegam que o projeto abre as portas das empresas para a espionagem dos concorrentes.
Outro projeto de lei instituía listas negras de empresas envolvidas em casos de corrupção ou de contratação ilegal de empregados, entre outras irregularidades. As que entrassem na lista negra não poderiam participar de licitações públicas. A iniciativa chegou a ser aprovada no Parlamento, no qual o governo tem maioria, mas foi rejeitada pelo Bundesrat, a segunda casa do Legislativo alemão, dominada pela oposição. E ficou nisso.
Para a Transparência Internacional, falta empenho do governo para viabilizar as duas promessas, colocadas preto no branco no acordo de coalizão. "A intensidade com que a corrupção está sendo combatida não nos convence", afirma Elshorst. Segundo o presidente da seção alemã da ONG, a Justiça também "não causa boa impressão". Muitas denúncias acabam arquivadas "por falta de provas".
México, Nigéria e Brasil
É por essas e outras que a TI prefere elogiar o México e a Nigéria. Embora em ambos países a corrupção faça parte do cotidiano, pelo menos lá a ONG verificou em 2002 determinação dos governos em combatê-la. No México, entrou em vigor uma nova lei que permite aos cidadãos o acesso a documentos do governo. Na Nigéria, a Justiça rejeitou recursos contra a criação de uma comissão nacional anticorrupção e o governo negociou ao preço de 100 milhões de dólares a restituição de 1,2 bilhão desviados dos cofres públicos pela família do ex-ditador Sani Abacha.
No Informe Global da Corrupção 2003, o Brasil aparece com a menção a dois casos: a descoberta de 1,3 milhão de reais nos cofres da ex-governadora do Maranhão Roseana Sarney e as conclusões da CPI da CBF, destacando a dívida de 10 milhões de dólares contraída na gestão de Ricardo Teixeira, inclusive através de "despesas inadmissíveis", como o aluguel de um carro em Nova York por 2 mil dólares ao dia.