1. Pular para o conteúdo
  2. Pular para o menu principal
  3. Ver mais sites da DW
ConflitosSíria

Queda do regime sírio expõe império de drogas de Assad

13 de dezembro de 2024

Fim do regime da família Assad na Síria revelou existência de enormes estoques de captagon, droga estimulante ilícita, e um esquema de exportação em escala industrial que ajudava a sustentar financeiramente a ditadura.

https://p.dw.com/p/4o89r
Saco rasgado cheio de pílulas de captagon, de cor creme
Estoques de captagon foram encontrados em armazéns e bases militares na Síria após queda de AssadFoto: Zollfahndung Essen/dpa/picture alliance

Os rebeldes que tomaram o poder de forma relâmpago na Síria acabaram descobrindo uma abundante – e ilícita – fonte de receita do regime deposto de Bashar al-Assad.

Bases militares e centros de distribuição estavam repletos de comprimidos de captagon, um tipo de estimulante que é vendido ilegalmente em todo o Oriente Médio, desde linhas de frente de guerras, canteiros de obras e festas.

Ela ficou conhecida como a "droga dos jihadistas" na Síria, por ter sido amplamente usada por combatentes que lutaram na guerra civil do país.

Na quarta-feira (11/12), os combatentes da Organização para a Libertação do Levante, também conhecida como HTS (Hayat Tahrir al-Sham), disseram ter encontrado uma grande quantidade da droga e prometeram destruí-la.

Jornalistas da agência de notícias AFP foram autorizados a entrar em um armazém, situado em uma pedreira nos arredores de Damasco. No subsolo, milhares de comprimidos de captagon estavam escondidos dentro de componentes elétricos para exportação.

"Depois que entramos e fizemos uma varredura, descobrimos que esta é uma fábrica para Maher al-Assad e seu parceiro Amer Khiti", disse o combatente Abu Malek al-Shami.

Maher al-Assad é irmão de Bashar al-Assad, e agora também está supostamente foragido em Moscou. Já o político sírio Khiti foi submetido a sanções em 2023 pelo governo britânico, que o acusou de controlar "vários negócios na Síria que facilitam a produção e o contrabando de drogas".

"Encontramos um grande número de dispositivos que estavam recheados com pacotes de comprimidos de captagon destinados a serem contrabandeados para fora do país. É uma quantidade enorme. É impossível dizer", disse Shami.

No armazém, caixas de papelão davam um ar de normalidade ao local, ao lado de sacos de soda cáustica, também chamada de hidróxido de sódio, um ingrediente fundamental na produção de metanfetamina, outro estimulante. De acordo com a etiqueta nos sacos, a soda cáustica foi fornecida pela Arábia Saudita.

Estoques menores de captagon – mas ainda impressionantes – foram encontradas em instalações militares associadas a unidades sob o comando de Maher Assad, segundo relato da AFP. Parte da droga queimava em uma fogueira na base aérea de Mazzeh, agora nas mãos dos combatentes do HTS.

Captagon sustentou o regime de Assad

A receita proveniente da venda do captagon sustentou o governo de Assad durante os 13 anos de guerra civil na Síria e transformou o país no maior Estado narcotraficante do mundo, segundo analistas.

As vendas eram tão expressivas que se tornaram, de longe, o maior produto de exportação sírio, superando todas as exportações legais do país reunidas, de acordo com dados oficiais analizados pela AFP.

Um relatório recente do Observatory of Political and Economic Networks sugere que o captagon gerou mais de 7,3 bilhões de dólares na Síria e no Líbano entre 2020 e 2022 (cerca de R$ 44,2 bilhões nesses três anos).

Analistas também apontam que Assad usava a ameaça dos distúrbios provocados pela droga para pressionar governos árabes. O captagon alimentou uma epidemia de abuso de drogas nos ricos estados do Golfo, mesmo quando o antigo líder buscava maneiras de acabar com seu isolamento diplomático entre seus pares, escreveu o pesquisador do Centro Carnegie para o Oriente Médio, Hesham Alghannam.

Segundo ele, Assad "alavancou o tráfico de captagon como um meio de exercer pressão sobre os estados do Golfo, principalmente a Arábia Saudita, para reintegrar a Síria ao mundo árabe", o que aconteceu em 2023, quando o país voltou a fazer parte do bloco da Liga Árabe.

Um laboratório de drogas em escala industrial ficava próximo a uma estrada principal no limite oeste de Damasco, cidade que era a sede do poder para a família Assad, que há muito tempo negava qualquer ligação com o comércio de narcóticos.

Agente da alfândega no Líbano confere carregamento de laranjas
Agente da alfândega no Líbano confere carregamento de laranjas com pílulas de captagon escondidas Foto: ANWAR AMRO/AFP

O que é o captagon?

O Captagon era um medicamento de prescrição médica, semelhante a alguns dos estimulantes disponíveis atualmente para doenças como o transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH). Foi proibido na década de 80 por ser altamente viciante.

A marca original era fabricada na Alemanha na década de 1960, mas a versão ilícita tem outra fórmula, que pode variar, e é geralmente chamada de captagon, com "c" minúsculo.

O captagon tem efeitos semelhantes aos das anfetaminas – aumenta a dopamina no cérebro, aumentando a sensações de bem-estar, prazer e euforia. Também tem efeito sobre o foco, a concentração e a resistência. Entre seus efeitos colaterais indesejados, estão psicose.

O estimulante sintético é também chamado de "coragem química", pelos relatos de ter sido usado por soldados em áreas devastadas pela guerra no Oriente Médio para ajudá-los a se concentrar e ter energia.

A droga teria sido encontrada, por exemplo, em corpos de soldados do Hamas durante o conflito com Israel.

Sua fabricação é relativamente simples e barata, o que facilita seu comércio ilegal.

sf (AFP, ots)