Começou! Foi oficialmente dada a largada para a corrida presidencial nesta terça-feira (16/08). Dizem que se trata da eleição mais importante desde a redemocratização. Minha única certeza é a de que estamos vendo o segundo tempo da campanha de 2018, daquela tão estranha e confusa disputa pelo Planalto que resultou na vitória de Jair Messias Bolsonaro. Havia um candidato preso, outro esfaqueado e um terceiro que todos chamaram de "poste".
Lembro-me daquele dia 15 de agosto de 2018, quando milhares de pessoas acompanharam o registro oficial da candidatura de Lula. O petista liderava as pesquisas com cerca de 40% das intenções de voto. Mas estava preso em Curitiba. Lembro-me de Fernando Haddad, o vice, passando pela multidão e entrando pelo portão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em Brasília. Todo mundo dizia que Haddad assumiria a chapa se o TSE rejeitasse a candidatura de Lula. E realmente, Haddad acabou assumindo "no lugar de Lula". Mas era tarde demais para superar Bolsonaro. Considero um erro histórico o PT não ter lançado Haddad à Presidência mais cedo.
Hoje, quatro anos depois, Lula lidera as pesquisas outra vez. Para o petista, seria um sucesso enorme vencer nas urnas. E o Brasil veria algo inédito nas últimas décadas: depois de Fernando Henrique Cardoso, Lula e Dilma Rousseff se reelegerem, Bolsonaro seria o primeiro presidente depois da redemocratização incapaz de aproveitar a caneta presidencial para garantir um segundo mandato.
Acontece que, como o governo Bolsonaro acaba de começar a pagar novos benefícios sociais – que incluem o Auxilio Brasil no valor de R$ 600, vale-gás e ajuda financeira para caminhoneiros e taxistas –, ainda é cedo para ver os efeitos disso. Mas me parece óbvio que a grande vantagem de Lula, de entre 12 e 20 pontos percentuais, dependendo da pesquisa, deve cair nas próximas semanas devido aos pagamentos feitos a milhões de famílias de baixa renda. Também deve beneficiar Bolsonaro a melhora de indicadores econômicos como prévia do PIB e desemprego, em meio a uma redução da inflação e – muito importante – do preço da gasolina.
Nesta terça, Bolsonaro lançará sua campanha oficial à reeleição (a não oficial já está em curso desde que ele assumiu a Presidência, em janeiro de 2019) em Juiz de Fora, no mesmo local onde foi esfaqueado em setembro de 2018. Faz parte da aposta "mística" do mito: no local onde Deus o salvou da morte, se dará inicio ao segundo milagre: o de vencer Lula. É o começo da tal "guerra do bem contra o mal" anunciada pelo presidente.
As bases para essa encenação já foram estabelecidas com os discursos religiosos da primeira-dama Michelle Bolsonaro nas últimas semanas. Ela ressuscitou uma antiga fala de Bolsonaro: ele não seria o mais capacitado para ser presidente, mas Deus capacita os escolhidos. Quer dizer, Jair Messias foi a escolha de Deus para liderar a nação brasileira, mesmo não sendo a melhor opção para tal tarefa.
As falas fraquinhas do presidente contrastam com os discursos poderosos de sua esposa. Por que Deus não escolheu logo de cara Michelle como presidente, só Ele deve saber.
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Thomas Milz saiu da casa de seus pais protestantes há quase 20 anos e se mudou para o país mais católico do mundo. Tem mestrado em Ciências Políticas e História da América Latina e, há 15 anos, trabalha como jornalista e fotógrafo para veículos como a agência de notícias KNA e o jornal Neue Zürcher Zeitung. É pai de uma menina nascida em 2012 em Salvador. Depois de uma década em São Paulo, mora no Rio de Janeiro há quatro anos.
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