O Magreb e a Europa
20 de janeiro de 2011O encontro de cúpula entre a UE e os Estados do Magreb, realizado em novembro de 2010, evidenciou o grau de disparidade existente entre os países do bloco europeu e aqueles do norte da África. Há discordância não apenas em relação à política econômica, mas também no que diz respeito aos direitos humanos e à democratização.
Simbólico foi o discurso de abertura, proferido pelo ditador líbio Muamar Kadafi, no qual explicou a seus convidados europeus que as relações comerciais entre as duas regiões haviam fracassado por não se darem de forma justa entre as partes. Segundo Kadafi, a Europa insistiu demais nos quesitos "boa liderança de governo e direitos humanos", enquanto a África precisa de "economia e não de política".
Integração deficiente no Magreb
No entanto, do ponto de vista econômico, o impasse maior não são as relações com a UE, mas sim entre os próprios Estados do Magreb. Em 2007, o comércio entre Marrocos, Argélia, Tunísia, Líbia e Egito perfez apenas 3% de todo o volume de mercadorias comercializadas na região. Isso mostra o quanto os Estados do Magreb são dependentes do comércio internacional, especialmente com a UE, e explica por que eles foram duramente atingidos pela crise financeira internacional.
A Argélia e a Líbia são sobretudo dependentes de suas produções de petróleo e gás natural, que juntas contabilizam quase todo o volume de exportações dos dois países. E a maior parte desses recursos naturais é exportada para a União Europeia.
Na Tunísia e no Marrocos, a situação é um pouco diferente, já que possuem apenas uma pequena indústria petrolífera. Em contrapartida, esses Estados possuem uma indústria melhor desenvolvida. Mesmo assim, seus principais parceiros comerciais são França, Itália, Alemanha, Espanha e Reino Unido – todos membros da UE. Juntos, eles importam mais de 65% de todas as mercadorias exportadas pela Tunísia e pelo Marrocos.
Embora o Egito seja menos dependente da UE que os outros países do Magreb, as exportações do país para a Europa contabilizam mais de 40% do volume total de mercadorias exportadas pelo país.
Ligação de longa data
As relações comerciais entre os países do Magreb e a Europa tiveram início há mais de 70 anos. Os primeiros acordos bilaterais, assinados por Marrocos, Argélia, Tunísia e, na época, a Comunidade Econômica Europeia (CEE), datam de 1969.
Esses países então receberam uma isenção de taxas alfandegárias para determinadas mercadorias, especialmente para o petróleo, também para o comércio de couro e produtos têxteis, embora para os dois últimos houvesse cotas. No entanto, para a maioria dos produtos agrícolas, exceto frutas cítricas, vigoravam altas taxas.
No fim dos anos 1970, esses acordos foram revisados: os Estados do Magreb passaram a receber ajuda econômica e financeira, com a qual deveriam modernizar suas produções agrícolas e industriais. Contudo, terminava a isenção alfandegária para produtos têxteis e petrolíferos.
Meta: zona de livre comércio
Desde meados dos anos 1990, a UE anseia um acordo de livre comércio com os países do Magreb, no âmbito do chamado Processo de Barcelona. O bloco europeu já assinou uma série de acordos bilaterais com Tunísia, Marrocos e Argélia. Ao mesmo tempo, a UE reinvindica desses países medidas concretas de proteção aos direitos humanos, bem como reformas políticas e sociais.
Tais reformas recebem o apoio da UE através de um programa bilionário chamado Meda, destinado para prover ajuda financeira e técnica aos países do Sul do Mediterrâneo. Além disso, a UE compromete-se a reduzir gradualmente as tarifas alfandegárias até a criação de uma zona livre de comércio em 2012, caso os Estados parceiros cumpram a sua parte.
Magreb deve solucionar problema dos refugiados
Uma parte decisiva dessa estratégia é evitar que refugiados da África cheguem em grande número à UE. Especialmente as relações entre a Líbia e o bloco europeu são marcadas por esse aspecto. As mesmas estiveram congeladas desde que terroristas líbios, sob os auspícios de Kadafi, provocaram a queda de um jumbo da Pan Am em 1988 e só foram retomadas em 2004.
Desde então, a Líbia concentra refugiados de outros Estados africanos e os impede de chegar à UE por via marítima. O apoio para essa tarefa o governo líbio recebe principalmente de Silvio Berlusconi, premiê italiano, que disponibiliza lanchas e assume, em parte, a vigilância na região.
Por outro lado, Kadafi também tira proveito da problemática dos refugiados para pressionar a UE. No último encontro de cúpula, ele exigiu um auxílio bilionário do bloco, ameaçando, caso não fosse ouvido, "não brincar mais de polícia para a UE".
Autor: Fabian Schmidt (sv)
Revisão: Rodrigo Rimon