Schröder e Chirac: harmonia sem igual
15 de junho de 2004Em encontro informal realizado na pequena Aachen, o premiê alemão Gerhard Schröder e o presidente francês, Jacques Chirac, puderam chorar juntos, na última segunda-feira (14), as mágoas dos catastróficos resultados das eleições ao Parlamento Europeu para seus respectivos partidos – a social-democracia de Schröder e a conservadora UMP (União por um Movimento Popular) de Chirac.
Mas secar as lágrimas não foi a tônica do encontro entre os dois chefes de governo, que se reúnem regularmente a cada seis semanas sem uma pauta fixa de assuntos a serem discutidos. Isso desde que, em janeiro de 2001, frente à mesa de chucrutes em Blaesheim, na francesa Alsácia, os dois países decidiram optar pelos encontros periódicos, destinados à definição de metas comuns. E, no momento, voltados para a "concordância unânime" entre Berlim e Paris.
Ciranda de nomes
Pouco antes do encontro de cúpula da UE, a ser realizado a partir da próxima quinta-feira (17), a escolha de um nome para suceder o comissário Romano Prodi na presidência da Comissão Européia pairou sobre o encontro.
Embora Schröder tenha afirmado que França e Alemanha aguardam uma solução consensual por parte do premiê irlandês Bertie Ahern, em cujas mãos está no momento a presidência rotativa da UE, a mídia nos dois países especula acerca do nome do primeiro-ministro belga, Guy Verhofstadt, para o cargo.
"No que diz respeito à questão pessoal, vamos apoiar a presidência da UE a fazer uma sugestão passível de conseguir o aval da maioria", declarou Schröder. A ciranda de nomes gira em torno de Verhofstadt, que esbarra no entanto na resistência do premiê britânico, Tony Blair, ainda azedo em função da postura anti-americana de Verhofstadt durante a guerra do Iraque.
O segundo nome é o do primeiro-ministro de Luxemburgo Jean-Claude Juncker, cogitado e relativamente bem aceito para o cargo, mas que insiste em recusar a oferta. "Meu partido ganhou as eleições e por isso fico em Luxemburgo", afirmou Juncker após a divulgação dos resultados das eleições ao Parlamento Europeu. Outra possibilidade seria o primeiro-ministro irlandês, Ahern, que já encabeça atualmente a presidência rotativa da UE. Não importando quem venha a ser o escolhido, França e Alemanha prometem apoiar o mesmo candidato.
Em defesa da "maioria dupla"
Outro ponto consensual entre os dois países está relacionado à Constituição européia, cujas negociações finais deverão ser concluídas na cúpula em Bruxelas. Também no debate que envolve as chamadas "maiorias duplas" nas decisões do Conselho, Berlim e Paris anunciam coesão.
"Posso assegurar que o princípio da maioria dupla não vai ser questionado. O que vai acontecer é que vamos encontrar regras capazes de contar com o apoio de todos", prometeu um Schröder aparentemente confiante. Berlim e Paris defendem a divisão de poder no Conselho de forma que países grandes em extensão – como Espanha e Polônia, por exemplo – disponham de menos votos que os populosos França e Alemanha.
No que diz respeito à política européia, França e Alemanha parecem mais unidas que nunca, indo à reunião do Conselho da UE "de mãos dadas", segundo Chirac. O mesmo não pode exatamente ser dito em relação à política industrial, pivô recente de atrito entre os dois governos. Schröder e Chirac anunciaram o plano de organizar encontros regulares entre representantes da indústria e do empresariado nos dois países, visando um diálogo mais intenso entre as duas partes e evitando assim "um ou outro mal-entendido".
O caso Siemens-Alstom
A alusão de Schröder é ao recente desentendimento entre os dois países, desencadeado pela possível participação da Siemens no grupo francês Alstom – fabricante do trem de alta velocidade TGV, turbinas de gás, porta-aviões e navios de cruzeiro. A intervenção do ministro francês da Economia e Finanças, Nicolas Sarkozy, contra a participação da Siemens na deficitária Alstom desencadeou fortes reações de protesto em Berlim em maio último. A postura de Sarkozy foi taxada de nacionalista e sua intervenção de "falta de sensibilidade política", nas palavras do próprio Schröder.
O objetivo de uma política industrial comum teuto-francesa é criar ou fortalecer grupos europeus líderes em diversos setores da indústria, como forma de se opor a concorrentes norte-americanos. Ou, como consta do discurso ameno dos chefes de governo: como maneira "de fortalecer o papel da Europa no mercado mundial".