'Sem valores a UE não tem futuro'
6 de janeiro de 2007DW-TV: A Alemanha assumiu a presidência rotativa da União Européia e com ela todos os assuntos correntes do bloco, pelos próximos seis meses. O que devemos esperar?
Hans-Gert Pöttering: Gostaria que presidência alemã achasse uma forma de seguirmos em frente. E gostaria de uma decisão no sentido de realizar a meta principal da Lei Fundamental européia.
Em termos concretos, o principal é definir algum tipo de cronograma para a Constituição européia. É este o mínimo que podemos esperar dos alemães nos próximos seis meses?
Espero que a presidência alemã seja mais ambiciosa do que isto – e estou certo que será. Espero que se discuta até aonde queremos que vá a ampliação da UE. Pretendemos aceitar todo país que deseje se afiliar à União, ou queremos estabelecer limites, geográficos também?
E há limites geográficos?
Em termos dos passos a serem dados, certamente há. Primeiro precisamos fortalecer as estruturas da UE – e por isso é preciso ver na prática a substância da Constituição proposta. Se não tivermos isso, então – com a possível exceção da Croácia – podemos esquecer qualquer expansão futura. Aí temos que ver o que acontece com a Ucrânia e as nações balcânicas, os países do Cáucaso, da África Setentrional. Eles passarão a ser vizinhos, e há muito nos ligando a eles. Mas há também coisas que não conectam. E necessitamos de parcerias estáveis, de políticas de vizinhança. Minha esperança é que o debate a este repeito ganhe intensidade durante a presidência alemã.
Aa nações dos Bálcãs já contam com uma perspectiva para suas aspirações em relação à União Européia, e um dia provavelmente se filiarão a ela. Neste caso, a comunidade compreenderá 33 ou 34 países. Independente do debate sobre a Lei Fundamental: isto já representaria uma massa crítica, significando que a UE deixaria de ser o que era, tornando-se, de fato, uma OSCE (Organização para a Segurança e Cooperação na Europa), com umas poucas diferenças de substância?
Sim, ela não pode simplesmente tornar-se uma OSCE, não pode ser apenas uma união informal, frouxa. O que desejamos é uma Europa forte, que possa agir. Apesar disso, devíamos estar satisfeitos de a Europa ser como é hoje. Do ponbto de vista pessoal: sou membro do Parlamento Europeu desde 1979, desde as primeiras eleições diretas. E se, naquela época, alguém dissesse que em 1º de maio de 2004 teríamos a Estônia, Letônia, Lituânia, Polônia, República Tcheca, Eslováquia, Hungria e Eslovênia ingressando na UE, eu teria dito "é maravilhoso, é visionário". E esta visão se tornou realidade ainda durante nossa vida.
As pessoas daqueles países optaram por nossos valores. O comunismo desapareceu, de esfacelou, e isso é um desenrolar maravilhoso. O status quo europeu dos anos 50, 60, 70 e 80, a divisão do continente, o Muro de Berlim, a Alemanha dividida, tudo isso se foi. Portanto podemos nos dar por bem felizes, pela forma como as coisas evolveram. Agora, é claro, temos que tentar estruturá-las de uma forma que faça sentido, que os cidadãos europeus compreendam. E esta é a principal tarefa a encararmos.
E esta é uma das tarefas a que a Lei Fundamental tentou abordar. Mas ela foi rejeitada pelos eleitores da França e da Holanda, e em outros países não está nem um pouco claro que ela passaria num plebiscito. No Reino Unido, provavelmente não, por exemplo. O que tem que ser resgatado dessa Constituição, para que a Europa esteja apta a agir?
Certamente precisamos manter o cerne da Constituição. E isso inclui voto por maioria no Conselho de Ministros. Não há mais como liderar esta União Européia, se gigantescas porções de legislação européia exigirem voto unânime. Temos voto por maioria na Parlamento Europeu, e é assim que tem que ser, também no Conselho de Ministros. Eu também insistiria que a segunda parte da Lei Fundamental – a que lida com valores, dignidade humana, democracia, o princípio da lei, da solidariedade, dos direitos humanos – esta parte deve ser transferida para a legislação européia. Sem valores, esta UE não tem futuro. Por isso, esses valores são tão importantes.
Senhor Pöttering, o senhor será bem provavelmente eleito o próximo presidente do Parlamento Europeu, em meados de janeiro. Se for eleito, quais são suas metas para os próximos dois anos e meio?
Gostaria de utilizar essa posição – e eu precisaria do apoio de todo o parlamento, claro – para aproximar a UE e o Parlamento Europeu do povo. E gostaria de dar alta prioridade a nossa relação com o mundo islâmico. Estes são os pontos em que me concentraria.
O senhor mesmo disse que os últimos 50 anos na Europa foram uma grande história de sucesso. E no entanto a UE está sofrendo de certa depressão. Qual seria sua resposta para essa sensação de melancolia?
Não sei se a União Européia está sofrendo de depressão. Às vezes, a situação é muito paradoxal. Na capital polonesa, Varsóvia, temos um governo que certamente poderia ser mais comprometido com a Europa do que é, e no entanto as sondagens de opinião mostram que 80% da população apóia a Constituição. A situação é muito variada.
Claro que há ceticismo. Este tem sempre sido o caso. E por isso é importante levarmos avante os projetos europeus, como diz o presidente da Comissão da UE, José Manuel Barroso. É importante termos sucessos, e de fato os temos, e precisamos falar deles. Acima de tudo, precisamos deixar claro para as pessoas que o copo está meio cheio, não meio vazio. Se abordarmos a política européia com otimismo e esperança e confiança, então penso que teremos a Europa seguirá de novo em frente, e o povo da Europa se moverá conosco.