Talibãs perdem apoio popular no Afeganistão
20 de abril de 2014Yahved Rahimi ainda frequentava o colégio quando os fundamentalistas islâmicos do Talibã governavam o Afeganistão. "Fui espancado três ou quatro vezes por militantes de grupos talibãs", lembra-se o morador da província de Ghor, hoje com 32 anos. "Eles me batiam por o meu cabelo estar comprido demais ou por eu ter aparado a barba."
Apesar dessas experiências, Yahved está convencido de que os talibãs deveriam receber mais uma oportunidade de se integrar à sociedade. "Mas eles têm que renunciar à violência, reconhecer a Constituição afegã e os direitos das mulheres, e se transformarem num grupo islâmico moderado."
Durante seu domínio, entre 1996 e 2001, o Talibã impôs a interpretação estrita da lei tradicional islâmica, a sharia, punindo com rigor os que violavam as regras. Eles proibiam as meninas de frequentar a escola, realizavam execuções públicas e ofereciam refúgio para membros da organização terrorista Al Qaeda , entre eles, o então líder Osama bin Laden.
Os talibãs controlaram cerca de 90% do país até serem derrubados pelos Estados Unidos e pela Aliança do Norte afegã, depois dos ataques de 11 de setembro de 2001, por se recusarem a extraditar Bin Laden.
Aceitação por necessidade
"Desde então, os jihadistas militantes, em muitos aspectos, se comportam pior do que durante o seu domínio", avalia a especialista em Afeganistão Kate Clark, do instituto de pesquisa Afghanistan Analyst Network, sediado em Cabul.
"Quando estavam no governo, eles eram uma força organizada e, em grande parte, disciplinada que, no entanto, também foi responsável por graves crimes de guerra. Mas desde que estão na oposição, atacam diariamente civis, matando muitos deles e acreditando que têm o direito de fazê-lo." Clark acrescenta ser esta uma das razões por que hoje muitos afegãos rejeitam os talibãs.
Isso nem sempre foi assim. Após o final do regime comunista apoiado pela União Soviética, o Afeganistão passou por uma guerra civil em 1992. Nessa época, grupos guerrilheiros mujahidin que haviam lutado contra as forças de ocupação soviéticas, teriam cometido várias atrocidades, matando por pretextos étnicos, estuprando mulheres, saqueando casas e forçando milhões de pessoas a fugir.
Por isso, muitos afegãos comemoraram quando o grupo político-religioso do Talibã assumiu o poder em 1996, sob a liderança do mulá Mohammad Omar: eles prometiam segurança e uma situação política mais calma.
Rejeição crescente
"Porém os talibãs não conseguiram corresponder às expectativas da população, nem como governo nem como rebeldes na oposição", diz a professora universitária e ativista dos direitos humanos Humara Haqmal, em entrevista à Deutsche Welle.
Ela observa que isso foi comprovado pela grande participação nas eleições presidenciais de 5 de abril deste ano. "Apesar dos ataques que antecederam as votações e das ameaças explícitas dos talibãs, compareceram significativamente mais eleitores às urnas do que o esperado. Isso mostra como é grande o ódio aos islamistas", opina a cientista política.
As ameaças também não impediram representantes de outros movimentos insurgentes de participarem do processo democrático. Um dos candidatos presidenciais é Qutbuddin Helal, ex-partidário do grupo Hezb-e-Islami, segunda maior força insurgente no Afeganistão, depois do Talibã. As primeiras projeções da comissão eleitoral afegã apontaram que Helal recebeu cerca de 2,6% dos votos apurados. Especialistas acreditam que até hoje alguns afegãos continuam a apoiar os talibãs.
"Essas pessoas criticam há anos a política do governo de Hamid Karzai e rejeitam a presença de tropas estrangeiras no país", destaca a especialista Kate Clark. Mas ela está convencida de que a maioria dos afegãos não está interessada em que os talibãs cheguem ao poder novamente. "O Afeganistão está mudando a cada ano que passa, e essas mudanças tornam improvável uma nova tomada de poder."
Tempo de negociações de paz
Desde o fim do regime talibã, o governo de Karzai tem repetidamente apelado para que os islamistas deponham as armas e participem de um processo de paz. Mas o presidente em final de mandato vem sendo criticado devido à sua atitude flexível em relação aos talibãs − que chega a chamar de "irmãos".
Wakil Ahmad Muttawakil, ex-ministro do Exterior durante o regime talibã, diz que falta a Karzai a disposição de implementar um processo de paz. "Se houver vontade de negociar, então haverá negociações. Mas sempre só há promessas. O governo afegão não fez o suficiente", acusa. Ele também critica as eleições presidenciais como "anormais e prematuras". Em sua opinião, o governo deveria primeiro "iniciar negociações de paz, adaptar a Constituição e se livrar das forças estrangeiras".
Para os talibãs, o momento é propício para negociações, alerta Kate Clark. Ao contrário de Muttawakil, ela acredita que os insurgentes é que devem agir, deixando clara sua disposição para negociar a paz. Os talibãs "poderiam dizer, de cabeça erguida: 'As tropas estrangeiras deixam o Afeganistão neste ano. Nós as derrotamos'", propõe.
Segundo a especialista, enquanto não há resultados no processo de paz, o Estado afegão deve se fortalecer, para minimizar o risco de que grupos insurgentes obtenham popularidade. Pois a história tem mostrado que esses grupos só conseguem ganhar espaço quando o Estado está fraco, corrupto e internamente dividido.