Dívidas ocultas: Moçambique não fez o TPC em Londres?
18 de outubro de 2023O julgamento das dívidas ocultas em Londres começou na terça-feira (17.10), depois de um adiamento que poder ter sido motivado por um desentendimento entre o Governo moçambicano e o banco Credit Suisse. O julgamento no Tribunal Comercial de Londres vai prolongar-se pelas próximas nove semanas, até ao final de dezembro.
A Privinvest é acusada de subornar funcionários públicos, em particular o antigo ministro das Finanças, Manuel Chang, para a aprovação de contratos e o financiamento de empréstimos de três empresas estatais (Proindicus, EMATUM e MAM) para a compra de barcos de pesca e equipamento de segurança marítima à Privinvest.
Um vez que Moçambique acusa a Privinvest, o Credit Suisse será potencialmente visado neste processo, o que representaria uma violação dos termos do acordo entre Maputo e o banco suíço.
Recentemente, Moçambique deixou cair por terra todas as acusações contra o Credit Suisse e, em troca, este renunciou à dívida de 426 milhões de euros. A DW entrevistou Benilde Nhalivilo, diretora executiva do Fórum de Monitoria do Orçamento (FMO), sobre os entraves iniciais do julgamento.
DW África: O desentendimento entre o Governo moçambicano e o banco Credit Suisse foi o que motivou o atraso no início do julgamento?
Benilde Nhalivilo (BN): Nós acreditamos que pode ser uma das razões, não sabemos se há outros motivos. Já tínhamos dito que gostaríamos de ter acesso a esse acordo que foi assinado com o Governo de Moçambique, porque já suspeitávamos que algumas coisas talvez pudessem não correr muito bem, porque não envolve só uma instituição, envolve mais. São vários interesses. Então, o que constatamos é que há esse desentendimento entre eles, o que pode ser uma das principais razões.
DW África: Podemos dizer que Moçambique não fez o seu trabalho de casa como deveria fazer ao não ter revisto as acusações contra a Prinvinvest neste processo?
BN: Moçambique vai pronunciar-se esta quarta-feira (18.10). Depois desse pronunciamento vamos poder talvez tirar ilações se Moçambique não terá feito bem o trabalho de casa. O grande impedimento que nós temos é que não tivemos acesso aos termos desse acordo com o Credit Suisse. Então, fica difícil saber se é Moçambique que não fez bem a sua parte.
DW África: Este secretismo que carateriza o acordo entre as duas partes traz alguns riscos?
BN: Preocupa-nos, porque não diz respeito apenas a essas partes, mas diz respeito também ao povo moçambicano. E da maneira como estas dívidas foram contraídas - que foi de forma um pouco complexa, pois não se cumpriu com os procedimentos, as leis vigentes locais - também nos faz ter essa preocupação de queremos saber, de facto, o que estará a acontecer por detrás dos termos do acordo, porque trata-se da vida dos moçambicanos.
Não posso dizer que é um risco, mas posso dizer que é uma grande preocupação do Fórum de Monitoria do Orçamento (FMO) que não tenhamos tido acesso aos termos desse acordo.
DW África: A Privinvest viu o seu pedido de suspensão do julgamento recusado. Assumiu antes que subornou gente ligada ao poder político em Moçambique, mas agora volta atrás. Estes são aspetos que podem denunciar a fragilidade do grupo de Iskandar Safa no julgamento?
BN: De facto, a Privinvest vem mostrando alguns sinais de fragilidade, tendo em conta também algumas alegações que dão conta que pode estar a jogar estrategicamente para atrasar o calendário do julgamento.
Contudo, também se deve considerar que o acordo extrajudicial entre Moçambique e Credit Suisse adiciona uma camada de complexidade para o Governo de Moçambique. Isto porque, enquanto o Governo busca o seu caso contra a Privinvest, deve agir com cautela para não violar clausulas específicas do acordo e não abrir espaço para que a Privinvest formule o seu pedido contra o Credit Suisse, por responsabilidade contributiva.