Desentendimentos entre atores políticos guineenses aumentam
10 de maio de 2017Se a implementação do Acordo de Conacri era motivo de divisão no seio da classe política guineense, a presente campanha de comercialização da castanha de caju veio animar ainda mais o debate nacional após as declarações polémicas do Presidente da Guiné-Bissau, José Mário Vaz.
O Governo aprovou um despacho em Conselho de Ministros que mandou proibir a participação de estrangeiros na compra do caju ao produtor, mas o Presidente da Republica, José Mário Vaz, considerou a medida "um absurdo" e deu ordens em sentido contrário. José Mário Vaz autorizou a entrada de compradores estrangeiros na campanha e insta os agricultores guineenses a não venderem a sua castanha por 500 francos CFA (76 cêntimos de euro) até ser determinado um novo preço nos próximos dias.Nesta quarta-feira (10.05.), o presidente da Camara de Comércio Industria, Agricultura e Artesanato, conselheiro especial do Presidente guineense, Braima Camará, reuniu-se com os operadores económicos para os convidar a prosseguirem com a campanha contra a decisão do Presidente, alegando que a imprensa adulterou as declarações do Chefe de Estado.
Braima Camará, que é também líder do grupo dos 15 deputados dissidentes do PAIGC, disse aos microfones da DW que o "mercado é livre e portanto o Presidente não pode fixar os preços. O Presidente disse para debatermos e discutirmos o assunto, com vista a melhorar o preço junto do produtor".
Desde o início da campanha de comercialização da castanha de caju, em finais de março, que já se ouviam vozes contrárias à pretensão do Governo em limitar a participação de comerciantes estrangeiros na compra direta do caju ao produtor.
Na verdade José Mário Vaz mandou os operadores económicos interromperem a campanha até à conclusão de um acordo sobre os preços a serem praticados no mercado e quando o Governo autorizar os estrangeiros a comprar a castanha de caju.
"Deixemo-nos de malvadez na Guiné-Bissau. Não é possível que os guineenses explorem os seus irmãos guineenses. Portanto, temos de solucionar este problema para que nenhum produtor de castanha de caju venha a vender a sua produção nos próximos dias e esperar até que seja encontrada uma solução para o problema", disse o Presidente José Mário Vaz.
Diferença de preço do caju na Guiné-Bissau e no Senegal
José Mário Vaz entende também que o caju da Guiné-Bissau não pode ser comprado por 500 francos CFA/kg, quando no Senegal o mesmo produto é adquirido até 1500 francos CFA. Para o Presidente guineense, o agricultor e o próprio Estado estão a perder muito dinheiro. Mas, o ministro do Comércio Victor Mandinga entende que a Guiné-Bissau não pode praticar os mesmos preços que o Senegal. "No Senegal não se paga nenhum imposto, nem para a comercialização nem para a exportação do caju. Nestas condições o preço praticado no Senegal nunca poderá ser comparado ao que é praticado aqui em Bissau", sublinha.
Entretanto, sobre a crise política vigente no país, o representante da União Europeia em Bissau, Vítor Madeira dos Santos, disse que a única solução passa necessariamente pelo cumprimento na íntegra do Acordo de Conacri pelos seus signatários:
"Apelamos às autoridades para cumprirem todo o espírito do Acordo de Conacri, visando ultrapassar a prolongada crise política".No entendimento do presidente do PAIGC, Domingos Simões Pereira, cabe ao Presidente da Guiné-Bissau nomear Augusto Olivais, para o cargo de primeiro-ministro, cumprir o acordo de Conacri e acabar definitivamente com a crise política que já dura há quase dois anos.
Entretanto, num comunicado enviado à DW-Africa, o grupo dos 15 deputados dissidentes do PAIGC acusa o PAIGC de agir de má fé e de falta de vontade política no processo de reintegração. O PAIGC, por sua vez, afirma que o grupo terá afirmado, perante a Presidente da Libéria, Ellen Johnson, também mediadora da crise guineense, que não podem regressar ao partido devido ao pacto que mantêm em vigor com o Partido da Renovação Social (PRS), força política que sustenta o atual Governo liderado por Umaro Sissoco.
Saída da ECOMIB
A retirada da força militar da CEDEAO estacionada em Bissau (ECOMIB) é ainda uma incógnita. As autoridades guineenses dizem que desconhecem a data oficial para o início da retirada, enquanto a CEDEAO diz que não comenta o assunto na imprensa.
Governo pede "seriedade" a funcionários envolvidos na campanha do caju
O ministro do Comércio guineense, Victor Mandinga, pediu na terça-feira (09.05.) "patriotismo" e "seriedade" aos funcionários do Guichet Único, balcão para pagamentos fiscais, aduaneiros e resolução de assuntos burocráticos relacionados com a comercialização da castanha de caju.
"Contamos com o bom trabalho e com a competência da equipa do Guichet Único. Contamos com a vossa seriedade e patriotismo, porque a perda de receita significa menos hospitais, menos luz, menos escolas e menos capacidade para pagar salários", afirmou o ministro na sessão de apresentação daquele balcão.
Sublinhando que a campanha de caju é uma das principais fontes de receita do Estado da Guiné-Bissau, Victor Mandinga recordou que entre 2014 e 2015, mesmo com controlo montado, saíram do país 20 mil toneladas de caju, sem qualquer pagamento ao Estado. "O que equivale a 1.200 contentores de caju", disse.O ministro afirmou que a situação melhorou em 2016, mas pediu para 2017 "tolerância zero". "Não pode, em 2017, nenhum contentor, nem um saco a granel, sair sem que o exportador pague todos os direitos aduaneiros, fiscais e portuários", afirmou.
Mais fiscais nas fronteiras
Para melhorar o controlo fiscal e aduaneiro, o Ministério do Comércio destacou há mais de duas semanas 156 fiscais fixos em todos os principais pontos das fronteiras.
Os fiscais estão a ser apoiados pela Guarda Nacional, onde está incluída a Brigada de Ação Fiscal, para "melhorar a apreensão do movimento de caju da Guiné-Bissau em direção ao Senegal".