Descentralização até junho não é viável, diz analista
7 de março de 2017O líder do maior partido da oposição, a RENAMO, Afonso Dhlakama, manifestou na última semana o desejo de ver as propostas de lei sobre a descentralização submetidas e aprovadas pelo Parlamento até finais do primeiro semestre deste ano. Relativamente à esta ambição de Afonso Dhlakama a DW África entrevistou o especialista moçambicano em boa governação Silvestre Baessa para saber da sua viabilidade.
DW África: A meta da RENAMO de se concluir a descentralização até finais do primeiro semestre deste ano é realista, se considerarmos a complexidade do sistema governativo?
Silvestre Baessa (SB): Sob o ponto de vista de prazo creio que não, é um prazo muito apertado sobretudo pela profundidade e complexidade que isso exige. Creio que há duas situações que devem ser consideradas: uma é a possibilidade de termos um acordo político que permite que a RENAMO possa indicar governadores para as províncias onde ganhou e a segunda é a descentralização no sentido mais profundo do conceito, que vai exigir muito mais do que o trabalho que foi feito até ao preciso momento. Por outro lado, não creio que por parte da FRELIMO uma decisão dessa natureza possa ser tomada antes do Congresso (26.10 a 01.11), que vai ser o momento mais alto do partido este ano, e portanto, decisões difíceis como a negociação com a RENAMO e o próprio pacote de descentralização e todas as outras reformas, que têm implicações muito grandes não apenas no Estado, mas na relação entre a FRELIMO e o Estado moçambicano não serão tomadas antes desta reunião magna do partido. Não estou muito certo sobre a viabilidade do prazo que a RENAMO coloca.
DW África: Então, o mais provável é que esse pacote seja concluído antes das eleições autárquicas do próximo ano?
SB: Próximo ano temos eleições autárquicas e há um conjunto de reformas que estão a ser exigidas pelos municípios, nomeadamente de maior autonomia, maior independência, maior espaço de manobra política, etc, e que faria todo o sentido que para esse novo mandato municipal que inicia depois das eleições de 2018, acho que deve sair um novo pacote. Então, creio que há uma oportunidade importante de ir testando todo esse pacote de descentralização, com novos órgãos municipais eleitos, em virtude das eleições de 2018. Mas creio que há oportunidade de até finais do próximo ano, as eleições realizam-se em outubro, haja espaço suficiente para se avançar com algumas reformas que podem não só acautelar os problemas da RENAMO, mas também do MDM e da sociedade em geral que clamam por maior capacidade de gestão e de liderança dos governos locais, sobretudo nas questões centrais de desenvolvimento como provisão dos serviços básicos.
DW África: O Presidente Filipe Nyusi anunciou recentemente uma nova equipa de contacto para as negociações de paz. Até dezembro participaram neste processo grupos de mediadores internacionais. O que terá ditado a criação de um novo grupo?
SB: Penso que este movimento do Presidente em convidar embaixadores de países que estão ligados ao processo de apoio direto ao Orçamento de Estado é uma tentativa de resolver através de uma situação dois ou três problemas de uma vez em simultâneo. Nós tivemos toda essa situação das dívidas [ocultas] que foram surgindo, e esse modelo pode ser muito mais eficaz que o modelo dos mediadores, porque aqui não se trata apenas de uma questão política, mas também de conteúdo. Alguns desses países estiveram desde o primeiro momento na vanguarda da discussão de um conjunto de reformas, desde a reforma do setor público, o processo de descentralização, etc. Têm um conjunto de conhecimentos e experiências que podem ser úteis para termos um pacote de descentralização que responda melhor aos anseios do povo e da RENAMO. Então, este deve ter sido dos passos mais inteligentes que o Presidente já deu na sua relação com os parceiros de cooperação.