Críticas às regras da política comercial
14 de abril de 2005Nesta quarta-feira (13/04), começou em Genebra uma nova rodada nas negociações agrárias − setor em que a política de subsídios e impostos alfandegários das nações mais ricas é mais absurda. Quem mais tem a perder são os países pobres. Diversas ONGs alertam para a insensatez e as discrepâncias das regras do jogo.
Taxas mais altas que ajuda ao desenvolvimento
A campanha Make Trade Fair, da organização não-governamental (ONG) Oxfam International, por exemplo, critica que as taxas dos países ricos para a importação produtos de nações pobres são quatro vezes mais altas que vice-versa. A cada ano, nações em desenvolvimento gastam 100 bilhões de dólares em taxas de importação – uma quantia duas vezes maior que a recebida em ajuda ao desenvolvimento.
Os países em desenvolvimento concentram mais de 40% da população mundial, mas participam com menos de 3% do comércio mundial. Enquanto as nações industrializadas exportam bens e serviços no valor de 6 mil dólares per capita, em nações em desenvolvimento esse valor é de 330 dólares e em países de mão-de-obra barata, de apenas 100 dólares.
Um bilhão de dólares em subsídios por dia
Em países como Alemanha, França, Grã-Bretanha e Estados Unidos, a agricultura nacional recebe subsídios da ordem de um bilhão de dólares por dia, de acordo com estatísticas feitas por organizações não-governamentais.
Além disso, a superprodução é subvencionada e revendida para países fora da União Européia e dos Estados Unidos. Segundo a Oxfam, neste caso, os preços são 30% mais baixos que o custo de produção, impossibilitando os pobres de concorrerem.
O Serviço de Desenvolvimento da Igreja Evangélica Alemã (EED) critica os chamados TRIPs, acordos sobre aspectos de propriedade intelectual relacionados ao comércio, nos quais a OMC determina que todos os países-membros devem cumprir padrões mínimos do direito de patente e de propriedade intelectual. Um exemplo: Burkina Faso, um dos países mais pobres da organização, é obrigada a introduzir um sistema de direito de patentes, mesmo que nenhum habitante do país possua patente registrada.
Democracia não abre mercados
A EED reclama também que o acordo de comércio de produtos agrícolas da OMC obriga nações industrializadas a baixar suas taxas de importação em 36% e países em desenvolvimento, em 24%. Para compensar isso, os países ricos subvencionam seus produtos, mas os pobres não têm meios para isso.
Para as ONGs, a democracia da OMC existe apenas no papel. Cada país tem direito a voto e as decisões são tomadas em consenso. Na realidade, no entanto, acontecem muitas sessões paralelas na sede da OMC em Genebra, impossibilitando as nações menores de estar representadas em todos os debates. Alguns países pobres nem têm representação em Genebra, complementa o Serviço de Desenvolvimento da Igreja Evangélica Alemã.
Segundo a Oxfam, cada vaca européia é subvencionada com dois dólares ao dia, levando a uma superprodução de leite. O excesso de produção da França, Irlanda do Norte ou Lituânia, por exemplo, acaba sendo exportado para o oeste africano, na forma de leite em pó. A República do Mali importa nove mil toneladas do produto ao ano, apesar de ter 6,5 milhões de cabeças de gado.
Arroz dos EUA para Cuba e Haiti
Washington subvenciona os rizicultores norte-americanos com 232 dólares por hectare, muito mais do que um produtor de arroz de Gana fatura em um ano. No início da década de 80, o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial forçaram os países em desenvolvimento a liberalizar seu mercado agrícola para que recebessem créditos.
Em 1995, o FMI obrigou o Haiti a reduzir, de 35% para 3%, suas taxas de importação de arroz. Isto levou a que duplicassem as importações do produto até 2003. Hoje em dia, 75% do arroz consumido no Haiti vêm dos Estados Unidos, enquanto os arrozeiros haitianos vivem na miséria.
Falta estabilidade a preços do cacau, camarões e café
Um agricultor de Gana recebe pelo cacau que produz apenas 1,2% do que custa uma barra de chocolate nas nações industrializadas. Entre os anos de 1995 e 2000, o país aumentou em 30% sua produção de cacau, enquanto que o preço do produto diminuiu também em 30%.
O café é outro exemplo apresentado pelas ONGs: desde 1997, seu preço diminuiu 70%. Isto causou prejuízos de oito bilhões de dólares aos exportadores dos países em desenvolvimento.
Em relação aos camarões, a OMC exigiu que as nações em desenvolvimento baixassem ou até mesmo eliminassem suas taxas de importação. Enquanto isso, em 2002, a União Européia aumentou de 4,5% para 10,9% essas taxas, que produtores vietnamitas, por exemplo, têm de pagar para venderem seu camarão no mercado europeu.
Superprodução de açúcar
Embora os acordos da OMC permitam à União Européia exportar apenas um milhão de toneladas de açúcar ao ano, o bloco vende, na realidade, cinco milhões de toneladas do produto. Conforme acusa o relatório Dumping on the World, publicado pela Oxfam em agosto de 2004, e excesso de produção é vendido a preços baixíssimos ao outro lado do Oceano, através de subvenções diretas e indiretas à exportação. Esta tática prejudica os mercados locais, que por sua vez produzem de forma muito mais eficiente e a preços baixos.
Por outro lado, altas barreiras alfandegárias européias impedem a entrada de açúcar nos países do bloco. No ano passado, a União Européia gastou três vezes mais subvencionando a exportação de açúcar do que o valor real do produto.
Com o algodão acontece o mesmo. Conforme apurou uma corte arbitral da OMC em setembro de 2004, os EUA gastam 3,2 bilhões de dólares ao ano em subsídios para o algodão, o que contraria as regras da Organização Mundial do Comércio. A Oxfam calcula que, entre 2001 e 2003, esta prática norte-americana tenha causado um prejuízo de 400 milhões de dólares aos produtores africanos de algodão.
Uma colheita de algodão rende menos de 400 dólares a um produtor de médio porte no oeste africano. Os EUA têm prazo até 1º de julho de 2006 para atender às determinações da OMC sobre o algodão. Caso contrário, estão ameaçados de sanções. Os vitoriosos nesta briga seriam o Brasil, Benin e o Tchad.