Moçambique: que futuro?
24 de março de 2017Na conferência, que decorre entre os dias 22 e 24 de março, estão a ser discutidos assuntos que tocam economia e desenvolvimento, proteção social e cidadania e boa governação. O objetivo é ponderar reformas nas áreas em debate e apresentar o resultado final ao Governo, para que este possa melhorar a sua atuação. Também se pretende apresentar propostas ao Executivo e ao maior partido da oposição, a Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO), para apoiar as negociações de paz. Um tema central neste contexto é a descentralização.
O encontro foi organizado pelo Instituto de Estudos Sociais e Económicos (IESE), a Universidade Católica de Moçambique (UCM) e o Mecanismo de Apoio à Sociedade Civil (MASC). Segundo os organizadores, os objetivos secundários são produzir resultados concretos que possam contribuir para a construção de uma paz sustentável, tendo em vista uma agenda de reformas das políticas públicas e da Constituição.
Mas não é tudo. Segundo João Pereira, do MASC, "vai-se discutir o sistema eleitoral, se o atual sistema permite a inclusão ou exclusão dos atores e cidadãos. E a existir exclusão, que alternativas podem existir para permitir uma sociedade mais inclusiva no processo de criação de uma paz duradoira."
Destaque para a descentralização
A descentralização merecerá um especial destaque. Afinal é um dos temas que desencadeou a tensão política que Moçambique vive. Pereira considera que os debates desse e outros temas são feitos na perspetiva das elites da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO, no poder) e da RENAMO, e defende uma mudança.
"A sociedade não pode ficar indiferente a esses problemas de descentralização. Achamos que é oportuno que as organizações da sociedade civil, em parceria com grandes centros de academias regionais e internacionais, reflitam sobre isso." Na opinião de João Pereira, encontrar a melhor maneira de descentralizar o país é uma tarefa que cabe a todos os cidadãos moçambicanos e "não apenas aos partidos".
A descentralização governativa é um dos cavalos de batalha da RENAMO. Depois das eleições gerais de 2014, que perdeu, começou a exigir governar as seis províncias onde afirma ter ganho o sufrágio. Mas só a retoma do conflito armado levou o Governo da FRELIMO a aceitar rever a descentralização.
Possível referendo
Representantes dos lados em conflito participam também na conferência da cidade da Beira. Um deles é o ex-deputado e ex-ministro da administração estatal Alfredo Gamito, segundo o qual as discussões já estão em fase avançada:
"Neste momento parece que todos estamos de acordo que os governadores das províncias devem ser eleitos. Agora, como devem ser eleitos? Levanta-se uma primeira voz a dizer que devem ser os partidos que ganharam nas províncias que o devem indicar. Outros dizem que deve ser uma eleição direta e universal. E ainda outros vão para outros extremos. Eu defendo que devia ser por eleições diretas e universais. Aliás, é esse o modelo que estamos a usar nas autarquias".
A descentralização é um assunto praticamente monopolizado pelas duas maiores forças políticas do país, que excluíram do diálogo a sociedade civil. Mas esta reivindica o seu espaço. Será que os resultados da conferência da Beira, principalmente no que diz respeito à descentralização, serão bem aceites pelo Governo e pela RENAMO?
Alfredo Gamito diz-se confiante: "Penso que sim e sem nenhum problema. Eu penso que esse encontro vai trazer pelo menos os elementos de base que podem conduzir a um debate público muito alargado, do tipo referendo, sobre como as coisas devem ser feitas".